Nonato Guedes
No próximo dia oito de fevereiro, a Assembleia Legislativa da Paraíba fará Sessão Especial proposta pelo deputado estadual Raniery Paulino (MDB) para homenagear o ex-senador e ex-governador José Targino Maranhão no transcurso do primeiro ano de sua morte, e serão enaltecidos os feitos de uma biografia respeitável construída ao longo de setenta anos de carreira na vida pública do Estado e no cenário nacional. Raniery ressalta que o legado deixado por Maranhão é “vastíssimo”, referindo-se a obras de infraestrutura a que ele deu partida como gestor e aos investimentos maciços que procurou implementar através do Plano de Águas, sintonizado com demandas que deslanchariam no projeto de transposição do rio São Francisco, que avançou na Era Lula e ainda no governo de Dilma Rousseff (PT).
Natural de Araruna, tendo sido eleito na década de 50 o deputado estadual mais jovem da história política brasileira, José Targino Maranhão descendia de família tradicional e conhecida, que conciliava atividades agropecuárias no interior paraibano com as batalhas derivadas da militância política. Seu berço partidário foi o PTB mas, com a eclosão do golpe militar de 64 e a imposição do bipartidarismo, Maranhão filiou-se ao MDB, que era tido como “oposição consentida”, duelando com a Arena, a legenda oficial de sustentação do regime, que chegou a ser qualificada por um dos seus dirigentes nacionais, Francelino Pereira, como “o maior partido do Ocidente”. Reeleito à Assembleia Legislativa e, depois, alçado à Câmara Federal, foi como membro desta última Casa que Maranhão teve o mandato cassado por Ato Institucional, como punição por integrar uma Frente Parlamentar Nacionalista que defendia a preservação de patrimônios estatais e criticava a entrega das riquezas brasileiras ao capital estrangeiro.
Maranhão, igualmente, era companheiro de políticos de esquerda listados no “índex” da ditadura militar como supostos inimigos perigosos e tomou posições firmes com caráter de contestação que pioraram seu conceito junto a escalões militares da “linha dura”, na época empenhados em “caçar” e “cassar”, na definição antológica do jornalista Hélio Zenaide, aludindo a uma fase tenebrosa da conjuntura política-institucional brasileira, que também ficou estigmatizada como “a longa noite das trevas”, por ter promovido cassações em massa, torturas, prisões ilegais de líderes e ativistas políticos, estudantis, docentes, religiosos, integrantes da advocacia, sem falar no massacre imposto à organização e funcionamento de entidades de defesa dos interesses dos camponeses, dos bancários, dos próprios jornalistas.
Despojado de direitos políticos e do exercício de mandatos, José Maranhão esperou a oportunidade ideal para voltar à militância, o que se deu com sinais de redemocratização, deflagrados em 1982, na restauração das eleições diretas para governadores. Recuperou o mandato de deputado federal, a esta altura integrando o PMDB, e voltou a se engajar nas grandes bandeiras populares que ainda não haviam sido conquistadas, perfilando, nesse caso, na defesa da anistia ampla, da convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte e da volta das eleições diretas para presidente da República. Em 1994, Maranhão foi chamado para ser candidato a vice-governador na chapa encabeçada por Antônio Mariz, que foi vitoriosa em embate contra Lúcia Braga. Em pouco tempo, em setembro de 1995, ascendeu à titularidade do Executivo com a morte de Mariz, vítima de câncer de cólon. Em 98, foi implantado o instituto da reeleição e ele decidiu concorrer para permanecer no governo. Enfrentou disputas internas com o grupo Cunha Lima, saiu vitorioso e derrotou, nas urnas, o candidato Gilvan Freire, do PSB, com a maior vantagem proporcional do país.
Os Cunha Lima retiraram-se do PMDB, que passou a ser controlado por Maranhão e seus discípulos. Em 2002, Maranhão vitoriou ao disputar o primeiro mandato ao Senado. Mas em pelo menos outras três vezes foi candidato a governador – em 2006, 2010, 2018, perdendo para Cássio Cunha Lima (PSDB) e para Ricardo Coutinho (PSB). Ascendeu à titularidade em situação excepcional – em 2009, quando Cássio teve o mandato cassado e ele foi chamado a completar a gestão. Em 2014, Maranhão foi eleito, novamente, candidato ao Senado, tendo como principal adversário Lucélio Cartaxo, irmão do então prefeito de João Pessoa, Luciano Cartaxo. No primeiro governo, que exerceu no vácuo da morte de Antônio Mariz, adotou o slogan “Austeridade é Desenvolvimento” e firmou a imagem de “Mestre de Obras”, favorecido por uma conjuntura que lhe possibilitou levar realizações aos mais longínquos municípios da Paraíba.
José Maranhão, como parlamentar, chegou a ser presidente da Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional e exerceu, também, a coordenação da bancada federal paraibana em Brasília, lutando por obras e recursos em benefício do Estado. Faleceu aos 87 anos de idade, vítima de complicações de Covid-19, quando estava internado no hospital Vila Nova Star, em São Paulo. Contraíra sintomas da doença após conduzir uma maratona nas eleições municipais de 2020, principalmente em João Pessoa, quando levou o MDB ao segundo turno com o candidato Nilvan Ferreira, em confronto com Cícero Lucena (PP), vitorioso. Hoje, o MDB está sob o comando do senador Veneziano Vital do Rêgo, ex-PSB, que sofre pressão para disputar o governo, enquanto outra ala defende seu apoio à candidatura de João Azevêdo a um novo mandato. Apesar do clima de divisão interna no partido, será inevitável a trégua nos meios políticos para a justa homenagem a um político benfeitor da Paraíba.