Nonato Guedes
Embora na entrevista, ontem, à rádio Clube do Recife, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tenha sido cauteloso ao comentar sua posição e a do PT sobre a eleição ao governo da Paraíba, que envolve apoiadores seus que são adversários no plano local, aliados do governador João Azevêdo (Cidadania), que postula a reeleição, consideram que ele continua no “radar” do líder petista, diante do compromisso reiterado de apoiá-lo na corrida ao Planalto. Falando ao programa mediado pelo vibrante jornalista Raldhney Santos, de grande repercussão em Pernambuco e além-fronteiras, Lula colocou a situação da Paraíba no estágio de “discussão”, acentuando que não iria dar detalhes da estratégia para não ser descortês com a imprensa tabajara.
Na verdade, Lula está debruçado sobre outros quebra-cabeças mais urgentes e mais importantes, como a definição do candidato a vice na chapa que encabeçará e que a dados de hoje é plenamente favorita nas pesquisas de intenção de voto. A definição da sua chapa passa pela solução de demandas em São Paulo, onde o ex-governador tucano Geraldo Alckmin enfrenta uma “via crúcis” para ser aceito e oficializado como vice de Lula. Trata-se de um parto – ou, no dizer do próprio Lula, de uma “grande concertação” nacional que ele tenta empreender ou viabilizar. Escolado nos exemplos de eleições anteriores que disputou, Lula busca um vice que lhe permita conquistar espaços no centro democrático e seja, ao mesmo tempo, de sua confiança para os novos desafios. Da confirmação do nome de Alckmin depende a confirmação do nome do petista Fernando Haddad como candidato ao governo paulista, apoiado por variados segmentos políticos, da mesma forma como em Pernambuco o senador petista Humberto Costa, mesmo liderando pesquisas, abriu mão da candidatura ao governo para um nome do PSB.
No que diz respeito à Paraíba, Lula se mantém atento e bem-informado sobre os fatos novos que estão se sucedendo na sua própria base de apoio, ficando na expectativa de que finalmente se configurem para que ele possa dar o seu tão esperado “placet”. Um desses fatos novos, certamente, foi o rompimento entre o senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB) e o governador João Azevêdo (Cidadania), com a perspectiva de candidatura do emedebista ao governo, conforme pedido de apoio que ele transmitiu a líderes de expressão do PT no Estado. Até então, não se trabalhava com essa hipótese, apesar dos sinais de estremecimento nas relações entre os dois líderes paraibanos. O jogo, entretanto, avançou de forma significativa na conjuntura local, criando condições para demarcação de limites nas alianças entre atores relevantes.
Lula ainda aposta fichas, pelo que deixou claro na entrevista, na construção de uma chapa “duradoura e vencedora” de aliados seus ao governo da Paraíba, mas por não ter citado nomes nem adiantado prognósticos e por expressar vontade de “conversar com muita gente” no Estado, alimentou a expectativa de que o governador João Azevêdo continua no seu radar. Pelo menos que seja do conhecimento da imprensa, o governador é o único líder que não foi fotografado em conversa com Lula – salvo no “flash” de um abraço em Natal, lá atrás, numa reunião do Consórcio Nordeste, quando o ex-presidente manifestou desejo de vir à Paraíba e passar pelo Palácio da Redenção. O roteiro nunca se concretizou, mas também é fato que adversários de Azevêdo como o ex Ricardo Coutinho retornaram ao PT e não é improvável que de lá estejam dirigindo petardos na direção do atual chefe do Executivo.
O problema no meio do caminho são as pesquisas de opinião pública. Elas indicam, em fase preliminar, um persistente favoritismo do governador João Azevêdo, em meio a todo o desgaste provocado por questões locais como as demandas de policiais militares e outros fatores decorrentes da má relação do governo de Jair Bolsonaro com governos estaduais e prefeitos. O nome de Veneziano, que ainda não se lançou publicamente, aparece nas últimas colocações na corrida pelo governo do Estado, sendo o segundo lugar ocupado, a uma boa distância, pelo deputado federal tucano Pedro Cunha Lima. Lula não é de desprezar ou subestimar candidatos favoritos, até porque sente na pele, hoje, essa condição, que já experimentou no passado. A romaria que se faz ao redor dele se dá pelo seu favoritismo – e seria até primário, por via de consequência, ignorar o favoritismo de João Azevêdo na Paraíba.
Os adversários do governador João Azevêdo têm dito – e procuram se convencer da assertiva – que a Paraíba não tem “essa importância toda” para Lula. Sabem que estão se iludindo a si próprios. Lula, que é nordestino da gema, e que se vale dessa condição para firmar o contraponto ao presidente Jair Bolsonaro, que tenta se apropriar de obras como a transposição das águas do rio São Francisco, quer somar, não subtrair votos na região onde nasceu. Por isso é que a vontade de “conversar com muita gente” não deve excluir o governador João Azevêdo, que, aliás, apoiou Fernando Haddad (PT) na campanha presidencial de 2018, enquanto Lula cumpria pena na Polícia Federal em Curitiba. Há algo concreto: ninguém, em qualquer parte do país, pode dizer que está falando por Lula. Ele é o dono da voz, como tem sido obrigado pela enésima vez a pontuar de forma bastante nítida.