Nonato Guedes
O senador Veneziano Vital do Rêgo assumiu, ontem, a pré-candidatura ao governo do Estado depois que ganhou o aval de um grupo restrito que compõe a Executiva do MDB. Na prática, o vice-presidente do Senado selou o rompimento com o governador João Azevêdo, candidato à reeleição, e pavimentou o terreno para se aliar ao ex-governador Ricardo Coutinho e a outros expoentes do PT. A definição se deu em meio a “rachas” tanto no MDB, onde o grupo do ex-governador Roberto Paulino apoia a candidatura de João Azevêdo, como no PT, onde uma corrente expressiva, liderada pelo deputado estadual Anísio Maia, defende a manutenção do pacto com o governador. Veneziano, ontem mesmo, começou a atirar contra Azevêdo, afirmando que esperava mais da sua administração.
Para analistas políticos, as chances de êxito de uma candidatura de Veneziano são imprevisíveis na conjuntura eleitoral paraibana e o senador emedebista corre o risco de protagonizar uma aventura no cenário local. O MDB, partido que ele passou a presidir com a morte do senador José Maranhão, não vence eleições ao governo há mais de uma década, nem possui estrutura forte em redutos onde predominou, como a própria Capital. A realidade de poder na Paraíba, nos últimos anos, foi polarizada entre Cássio Cunha Lima, do PSDB, e o ex-governador Ricardo Coutinho, que foi do PT, reinou no PSB e ultimamente voltou às hostes petistas, prestigiado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A confiança de Veneziano reside no apoio direto do ex-presidente Lula, que é favorito em pesquisas de intenção de voto para o Palácio do Planalto. Mas o fenômeno da transferência de votos é sempre complicado e Lula, apesar de todo o carisma, principalmente no Nordeste, não acumula histórico de cabo eleitoral vitorioso de candidatos a governador na Paraíba. João Azevêdo, que teve o apoio dele em 2018, foi uma exceção.
A tendência é Veneziano formar dobradinha na eleição majoritária com Ricardo Coutinho, que tenta obter aval da Justiça Eleitoral para se tornar elegível. Atualmente, o ex-governador está “sub judice” e desgastado, respondendo a processos da chamada Operação Calvário que tratam do desvio de recursos da Saúde e da Educação do Estado no período em que ocupou a chefia do Poder Executivo. Ricardo tem se defendido com o argumento de que é alvo de perseguição judicial e de setores da mídia – em termos concretos, tem sofrido punições incluindo o uso de tornozoleira eletrônica e a retenção de valores do patrimônio que acumulou. Mesmo assim, ganhou poder de fala graças à linha direta que tem com o ex-presidente Lula, que é grato por manifestações de solidariedade de Coutinho quando da sua prisão na Polícia Federal em Curitiba.
Nas eleições de 2020 a prefeito de João Pessoa, Lula passou por cima da candidatura própria do deputado Anísio Maia, aprovada no PT, e gravou mensagem de apoio à candidatura de Ricardo Coutinho, então no PSB. Além de confundir eleitores do segmento de esquerda, o pronunciamento de Lula não bastou para alavancar a pretensão de Ricardo, que não foi sequer para o segundo turno. Quanto a Veneziano, sua aproximação com o ex-presidente da República se intensificou bastante do ano passado para cá, e há registro de pelo menos três encontros entre ambos. O senador foi readmitido no círculo petista mesmo tendo votado, como deputado federal, em 2016, favorável ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, que Lula e o PT sempre qualificaram como “golpe”. O pragmatismo de Lula, no projeto de voltar ao Planalto nas eleições deste ano, o tem levado, porém, a fazer concessões em inúmeros Estados e se reconciliar com antigos algozes do Partido dos Trabalhadores, sob alegação da urgência estratégica de derrotar o presidente Jair Bolsonaro e o bolsonarismo.
A trajetória de Veneziano dentro do MDB é sinuosa. Quando o partido ainda se denominava PMDB ele tentou, seguidas vezes, ser adotado como candidato ao governo do Estado, mas, invariavelmente, esbarrava na onipresente pretensão do ex-senador José Maranhão, que ainda em 2018 postulou o retorno, ficando em terceiro lugar no pleito que foi vencido em primeiro turno por João Azevêdo, na época no PSB e apoiado decisivamente por Ricardo Coutinho e por Veneziano Vital. Em 2014, um irmão de Veneziano, o atual ministro do Tribunal de Contas da União Vital do Rêgo, foi lançado candidato pelo PMDB mas o duelo ficou entre Ricardo Coutinho (vitorioso na reeleição) e Cássio Cunha Lima. O MDB-PMDB elegeu governadores como Tarcísio Burity, Ronaldo Cunha Lima, Antônio Mariz e José Maranhão, mas não se renovou, devido à própria centralização férrea exercida por Maranhão, enfrentou defecções e passou a perder espaços na conjuntura. Veneziano é herdeiro de um espólio de massa falida em termos de votos e de representação política-parlamentar. O nome mais vistoso, hoje, na constelação emedebista, é o do sapateiro “Gobira”, da cidade de Cajazeiras, que foi fenômeno em eleição passada e que tenta repetir-se, duvidosamente, como candidato a deputado federal.
Veneziano, em todo caso, mesmo que não venha a empolgar o eleitorado e liderar a corrida pelo governo do Estado, não perderá o que já tem. Em 2022 ele está na metade do mandato de oito anos que conquistou ao Senado, e voltará tranquilamente ao Congresso e à sua poltrona se obtiver insucesso nas urnas. No momento, a sua prioridade é conseguir “exclusividade” do apoio do ex-presidente Lula à sua pré-candidatura ao Palácio da Redenção. João Azevêdo ainda se movimenta, em termos partidários, pelo campo da esquerda, admitindo refiliação ao PSB, sobretudo agora que a cúpula nacional do Cidadania aprovou a formação de federação com o PSDB do deputado federal Pedro Cunha Lima. O interesse do senador emedebista, além de conciliar inúmeros desafios ou resolver pendências inerentes à logística de uma campanha, é o de polarizar contra João Azevêdo, triunfando na queda de braço que resolveu sustentar com o governante a quem apoiou quatro anos atrás.