Nonato Guedes
Houve muita exploração em torno de declarações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a uma emissora de rádio da cidade de Patos, na Paraíba, em que abordou aspectos da conjuntura política-eleitoral no Estado. Um fato natural diante do protagonismo que o pré-candidato do PT à presidência da República vem exercendo nas projeções para a corrida às urnas em outubro e, mais ainda, por causa do favoritismo que o líder tem demonstrado, em reiteradas pesquisas de intenção de voto auditadas por institutos especializados e de credibilidade indiscutível. Mas uma leitura isenta e desapaixonada das palavras à rádio Espinharas permite colocar os pontos nos is: não há definição de Lula quanto a apoios e alianças no território paraibano. A fase, ainda, é de conversas, que envolvem setores do MDB, do PSB, do PSOL, do Solidariedade e outras forças políticas interessadas em dialogar com o PT ou, diretamente, com o próprio Lula.
A manifestação de Lula provocou, da parte de apoiadores do senador Veneziano Vital do Rêgo, pré-candidato a governador pelo MDB em aliança com o ex-governador Ricardo Coutinho (PT) ao Senado, a impressão de que será restrita àquele partido a composição avalizada pelo ex-mandatário. Tudo por causa de um trecho editado da fala de Lula em que ele salienta: “Na Paraíba eu estou altamente convencido da necessidade de fazer uma aliança com o MDB, com Veneziano”. Mas, em seguida, o ex-presidente ressalta: “Nós queremos juntar mais gente que quer ajudar a gente aí no Estado. Estamos num processo de conversação”. É quando ele se refere a entendimentos com o próprio PSB, onde o governador João Azevêdo, candidato à reeleição, ainda que não mencionado explicitamente por Lula, está comprometido com Lula desde quando ainda militava no “Cidadania”.
Tomado ao pé da letra o contexto das declarações do ex-presidente, ele fez menções superficialmente sobre a Paraíba porque a pergunta original de um entrevistador referia-se à hipótese de escolha do ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, como vice. Alckmin, que foi do PSDB durante longo tempo, continua empenhado em viabilizar seu ingresso no PSB e, desta forma, enquadrar-se mais à vontade na chamada base de apoio político-eleitoral à chapa encabeçada por Lula. O líder petista adiantou que sobre a própria “questão Alckmin” há indefinições, primeiro porque ele, Lula, ainda não definiu sua candidatura; segundo porque Alckmin não definiu o partido a que vai se filiar. “Então, nós temos que ter um pouco de paciência para saber como é que isso vai ficar (…) Tem gente que é favorável, tem gente que é contra, tem gente que gosta do Alckmin, tem gente que não gosta. Mas política é assim mesmo, a gente vai conversando, vai discutindo, vai tirando a diferença”. Ou seja, Lula não está açodado nem sinaliza com intenção de precipitar definições.
Ele sabe que a construção de sua candidatura ao Palácio do Planalto em 2022 é o mais difícil desafio que já enfrentou em toda a sua trajetória, desde que saiu do metro quadrado do sindicalismo no ABC paulista para enveredar pela política-partidária, fundar um Partido que se tornou modelo para outros países e fazer esse partido ascender ao poder, duas vezes com ele, duas vezes com Dilma Rousseff (esta, interrompida no segundo mandato em face do processo de impeachment que foi conduzido pelo Congresso Nacional). Mais do que uma construção de candidatura, Lula tem investido na elaboração do que chama de uma “concertação política-institucional” que visa o reestabelecimento da democracia plena no país e a derrota do bolsonarismo, um estilo de poder que se mostrou contraditório, polêmico e tóxico no período em que tem manejado os cordéis na estrutura do país. A tal “concertação” busca juntar gregos e troianos, anistiar até mesmo adversários históricos do petismo, para que o objetivo principal seja alcançado.
– Chega uma hora em que você tem que bater o pênalti e, aí, você tem que bater com muita força para o goleiro não pegar – frisou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na entrevista, recorrendo a uma comparação futebolística, que ele gosta de usar e abusar. Dentro desse contexto, é que será definido o time que vai entrar em campo, ainda para mencionar-se a metáfora lulista, adaptando lances do futebol ao jogo político. Por fim, como deixou claro o ex-presidente, “até o final de abril a gente vai ter uma definição de quem são os partidos aliados”. Ou seja, Lula não está sendo excludente em relação a forças políticas paraibanas que já demonstraram interesse em apoiá-lo na caminhada para voltar ao centro do poder federal. A “equação” dos apoios e alianças políticas na Paraíba ainda não está, portanto, fechada. Não há prego batido, nem ponta virada, o que faz com que o arco de composição em torno do líder petista possa ser ampliado.
É claro que tudo seria mais simples se o ex-presidente da República fosse “direto ao ponto” e explicasse, sem subterfúgio ou meias-palavras, qual o cenário com que deseja contar em Estados como a Paraíba para lastrear sua campanha. Acontece que a dinâmica da política é muito complexa e quem é candidato a um cargo da dimensão do que Lula volta a pleitear precisa ter a percepção dos detalhes, das peculiaridades das conjunturas ou dos quadros que estão se formando em diferentes lugares do imenso território brasileiro. Lula, também, demonstra estar com o radar ligado nos passos dos adversários, especialmente do esquema político que ainda resiste no apoio a Jair Bolsonaro. Daí a posição cautelosa. Mas houve uma outra ilação palpável na entrevista de Lula: ninguém fala por ele. Bastaria esse ponto para jogar por terra toda e qualquer especulação, “alimento” de que se nutre o jogo político em vésperas de embates eleitorais.