Nonato Guedes
Criado em março de 2019 para ser o instrumento jurídico, político e econômico de integração dos nove Estados da região do Nordeste, o Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável do Nordeste deverá ter, da parte do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), caso eleito presidente da República, mais do que canais de diálogo, valorização concreta das ações que empreende como autarquia autônoma promotora de soluções para os desafios do chamado semiárido. Atualmente presidido pelo governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), que sucedeu a Wellington Dias (PT), do Piauí, o Consórcio evoluiu para uma fase de profissionalização na defesa unificada dos interesses regionais. No dizer do governador paraibano João Azevêdo, também do PSB, o Consórcio “deu uma voz única ao Nordeste”.
O Consórcio opera com vistas a atrair investimentos e alavancar projetos de forma integrada, constituindo-se, ao mesmo tempo, como uma ferramenta de gestão criada e à disposição dos seus entes consorciados, e como um articulador de pactos de governança, figurando, entre as possibilidades abertas com a sua criação, a realização de compras conjuntas, a implementação integrada de políticas públicas e a busca por cooperação, também em nível internacional. Ganhou projeção, sobretudo, por causa dos embates sustentados pelo governo do presidente Jair Bolsonaro, que se recusou a receber gestores nordestinos ou a urgenciar demandas a que a região tem direito. Praticamente composto por administradores de esquerda e de oposição ao governo Bolsonaro, o Consórcio procurou exercitar ao máximo a solidariedade em momentos difíceis ou tormentosos como o enfrentamento à calamidade de covid-19 na região, em que houve ameaça de escassez ou de retenção de vacinas, bem bloqueio de insumos para manter sob controle o funcionamento da rede hospitalar pública.
Não é exagero afirmar que o governo do presidente Bolsonaro irritou-se profundamente, por várias vezes, com a articulação livre dos governos de Estados do Nordeste para contornar dificuldades burocráticas impostas pela área federal tanto no que diz respeito a investimentos e projetos de desenvolvimento econômico e social como nas medidas que foram exigidas para o combate à calamidade do novo coronavírus. Numa reunião ministerial, em que trechos de sua fala vazaram, o presidente Jair Bolsonaro chegou a se referir pejorativamente aos governadores nordestinos, chamando-os de “governadores de Paraíba”, e desabafando que, entre eles, o “pior de todos” seria o “ex” do Maranhão, Flávio Dino, pela contundência de declarações contra o mandatário. Houve, entre os gestores da região, a suspeita de orquestração para boicotar projetos e investimentos no Nordeste, e essa suspeita ganhou corpo com entraves que Brasília opôs a encaminhamentos originários do semiárido. Foi aí que recrudesceu a unidade do bloco nordestino.
No rol dos “principais objetivos” do Consórcio Nordeste destacam-se: promover a integração regional, articular e implementar políticas públicas integradas, ampliar e modernizar a infraestrutura de exploração dos recursos naturais da região, atrair investimentos internos e externos para o Nordeste, realizar compras compartilhadas, promover o desenvolvimento sustentável, respeitando o meio ambiente e a democracia, fortalecer a participação de micro e pequenas empresas na economia regional e gerar o bem-estar social na região. O marco legal que viabilizou a criação do Consórcio foi a Lei Federal 11.107/2005, que autoriza os Consórcios Públicos, bem como o Decreto 6.017/2007, que estabelece as suas normas de funcionamento. Ao longo da sua existência, o Consórcio vem desenvolvendo e aprimorando alguns instrumentos de gestão, todos eles validados por leis e resoluções.
Assim é que, entre as possibilidades de ação propiciadas pelos instrumentos legais, destacam-se: realizar estudos técnicos e pesquisas, elaborar e monitorar planos, projetos e programas, inclusive para a obtenção de recursos federais ou estaduais, prestar serviços por meio de contrato de programa, assessorar e prestar assessoria técnica aos Estados consorciados, capacitar cidadãos e lideranças dos Estados-membros, servidores do Consórcio ou dos entes federados que o integram, promover campanhas educativas e mobilizar a sociedade civil para a gestão participativa, formular, implantar, operar e manter sistemas de informações articulados com os sistemas nacional e estadual correspondentes, prestar apoio financeiro e/ou operacional para o funcionamento de fundos e conselhos. O Consórcio orgulha-se de ser um articulador de pactos em torno de políticas públicas que contribuam para a superação de preconceitos e desigualdades e para a consolidação de valores de respeito a todas as pessoas e à biodiversidade do Nordeste e do Brasil.
O governo do presidente Jair Bolsonaro atritou-se com o Consórcio Nordeste porque nele enxergou um concorrente, dentro da visão egoística de monopólio de ações e políticas públicas pelo poder central. Mas os próprios integrantes do Consórcio Nordeste têm deixado claro que a concepção do organismo é colaborativa, distribuída em várias frentes para estruturar mecanismos de financiamento inovadores e de fácil acesso e, também, para identificar e viabilizar, junto com Estados e sociedade civil, projetos integradores para a região. O governo Bolsonaro, por extremismo político e ideológico, tem perdido excelentes oportunidades de compartilhamento de experiências administrativas que poderiam ser exitosas. No contraponto a essa visão tacanha, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva já demonstrou sensibilidade para com o empreendimento, sinalizando a garantia de que, se eleito, será parceiro de um modelo que substitui com eficácia comprovada a atuação da Sudene, que durante muitos anos foi a referência da região Nordeste para o próprio desenvolvimento.