Nonato Guedes
Desta vez o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi mais explícito e afirmativo ao comentar, em entrevista, os apoios políticos na Paraíba ao seu projeto como candidato ao Planalto pela terceira vez, incluindo o governador João Azevêdo (PSB) entre os seus apoiadores, com quem pretende, inclusive, dialogar, quando vier ao nosso Estado – assunto que ainda constitui “segredo de Estado” na agenda nacional do líder das pesquisas. De certo modo, a fala de Lula foi uma ducha de água fria para apoiadores locais que vinham insistindo em “exclusividade”, o principal deles o senador Veneziano Vital do Rêgo, do MDB, pré-candidato ao governo, que aliciou o PT para compor sua chapa, através da indicação do nome do ex-governador Ricardo Coutinho, ainda pendente de definição quanto à elegibilidade.
A pregação de Veneziano vinha encontrando eco na própria cúpula petista paraibana, junto ao presidente Jackson Macêdo, um burocrata que orientou ações na perspectiva de isolamento do governador, ignorando que Azevêdo quebrou lanças para se manter na base de apoio à pré-candidatura de Lula, tendo deixado o “Cidadania”, que lhe deu cobertura quando foi retaliado no PSB pelo ex-governador Ricardo Coutinho, justamente para poder se compor com Lula. Por último, o governador, que é favorito à reeleição, avançou nos movimentos políticos pró-Lula, viabilizando seu retorno às hostes do PSB e desprezando a aliança com o União Brasil, diante do gesto do deputado federal Efraim Filho, pré-candidato ao Senado, de não votar em Lula. Essa mobilização do governante não passou desapercebida aos olhos de Lula, mas foi certamente o retorno ao PSB, com a permanência no campo da esquerda, o fator decisivo para o “aceite” de Azevêdo no palanque múltiplo.
Observava, ontem, o deputado estadual Anísio Maia, que foi praticamente expulso do PT paraibano e encontrou abrigo no PSB, em condições de disputar a reeleição à Assembleia, que o dirigente petista estadual Jackson Macêdo adotou uma postura “incrível” ao tentar impedir Lula de se reunir com um governador favorito à reeleição. “Para ele, é mais importante deixar Lula em um cercado do que ampliar sua votação no Estado”, externou Anísio em rede social. A insistência de Macêdo e de expoentes de maior destaque do PT da Paraíba em serem mais realistas que o rei esbarrou, finalmente, na escolha, por Lula, do ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSB), como seu vice na chapa às eleições de outubro. Como “proibir” o governador João Azevêdo, correligionário de Alckmin, de entrar no palanque? Seria presunção rematada, além de gesto de reconhecida inabilidade política.
O ex-presidente Lula, que é sabidamente pragmático, intuiu o ridículo da situação que vinha se gestando na Paraíba, com possibilidade de desdobramento por outros Estados, e verbalizou recados em mais uma entrevista a órgãos de comunicação, insinuando que na Paraíba deseja conversar “com todo mundo” e, agora, incluindo João Azevêdo no rol dos interlocutores. Se não foi enfático na manifestação de afetividade para com o governador, por estar “pisando em ovos” e não querer desagradar outros apoiadores de quem está mais próximo, como Ricardo Coutinho e Veneziano Vital do Rêgo, Lula foi, pelo menos, categórico, ao avalizar o palanque múltiplo. Por assim dizer, chamou o feito à ordem, desautorizando o falatório dos que vinham falando por ele sem ter, necessariamente, credenciais para tanto. “Roma locuta, locuta est” – é o que está implícito na bula papal de Lula, se é que figuras como Jackson Macêdo entendem a analogia.
De resto, vale ressaltar que o governador João Azevêdo, em nenhum momento, pugnou ou reclamou exclusividade do palanque de apoio ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na campanha de 2022, mesmo sendo ele, Azevêdo, o líder de pesquisas para a disputa ao Executivo estadual. Pelo contrário, chegou a ironizar que não era concessionário de automóveis para exigir exclusividade e que não se importa que outras forças políticas assumam o compromisso de apoiar a candidatura de Lula, dentro do objetivo comum de derrotar o presidente Jair Bolsonaro na cruzada deste pela própria reeleição. Mas, seguramente, foi o próprio Lula que escancarou, na entrevista de ontem, todo o pragmatismo com que age em política ao dizer, mencionando apoios diversos: “Eu não recuso votos”.
Ninguém recusa votos – que, na essência, são secretos e, no resultado, exprimem soma, podendo contribuir para vitórias, sobretudo em momentos cruciais. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem consciência absoluta de que esta é uma batalha crucial na sua trajetória política. A campanha trará à tona episódios que desgastaram o Partido dos Trabalhadores e, eventualmente, a própria imagem de Lula, como os do mensalão e petrolão, passando pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff. Jair Bolsonaro (PL) aparece atrás de Lula na maioria das pesquisas de opinião pública mas não está morto, e pode promover uma convergência de extrema-direita que empurre o páreo presidencial até para o temido segundo turno. Recusar votos, para Lula, nessa conjuntura tumultuada, seria uma temeridade, além de constituir erro político palmar do ponto de vista estratégico. Lula sabe muito bem dessas coisas. Quem não sabe é Jackson Macêdo.