Nonato Guedes
A Paraíba, inegavelmente, vem contribuindo para o folclore político nacional com a “guerra” entre as facções do governador João Azevêdo (PSB) e do senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB) pela primazia de ter o apoio oficial do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na corrida eleitoral deste ano. A situação é consequência do favoritismo que Lula ostenta no atual cenário, sobretudo em relação ao presidente Jair Bolsonaro (PL), já que o candidato da “terceira via” não prosperou até agora. Também contribui para a emulação a posição de liderança que Lula exibe nos Estados do Nordeste, região onde estão suas origens, o que enseja o tropismo de postulantes ao governo para “surfar” na onda do “preferido”. Tudo isso a despeito de não haver grandes antecedente de bem-sucedida transferência de votos de Lula para candidatos a governador em disputas paraibanas.
Esta semana, mal o governador João Azevêdo comemorou a aproximação que teve com Lula, por um bom espaço de tempo, no congresso nacional do PSB realizado em Brasília, com direito a fotografias e a cochichos ao pé do ouvido, Veneziano tornou público, ontem, um vídeo de Lula aos aliados na Paraíba, prometendo vir ao Estado para uma “grande festa”. O ex-presidente também fala da perspectiva de aliança entre o PT e o MDB na chapa majoritária, tendo Veneziano como candidato a governador e o ex-governador Ricardo Coutinho como candidato ao Senado. Nesse ínterim, o diretório nacional do PT, presidido pela deputada Gleisi Hoffmann, determinou a recomposição do diretório estadual e da executiva petistas na Paraíba, conferindo poder de decisão ao grupo liderado pelo ex-governador Ricardo Coutinho, que já conseguiu expulsar da legenda remanescentes petistas favoráveis ao apoio a João Azevêdo.
Nos meios políticos paraibanos, a sensação é de que está se tornando cômica essa novela em torno da participação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na campanha eleitoral de outubro a nível local. Os capítulos se alternam, de forma monótona, ora com Lula abraçado a Veneziano, ora com ele abraçado a Ricardo Coutinho, ora, ultimamente, abraçado ao governador João Azevêdo. Como pano de fundo de toda a orquestração, palavras ao vento dirigidas pelo líder petista, do tipo “quero o apoio de todo mundo na Paraíba” – e, em paralelo, a movimentação dos respectivos comitês pré-eleitorais para fazer uso das imagens e das palavras de Da Silva. Também têm muita força ou impacto na mídia local declarações formuladas por Lula em entrevistas a órgãos de comunicação, quando responde a questões pontuais envolvendo o nosso Estado. Ressalte-se que, no passado recente das disputas locais essa “guerra” não foi tão ostensiva. Ela já envolvia Ricardo Coutinho, de um lado, e o falecido ex-governador José Maranhão (MDB) de outro.
Da parte do ex-presidente Lula não há muito o que fazer para conciliar interesses que, na essência, são visceralmente antagônicos. O quadro se acirrou na Paraíba, particularmente, devido ao rompimento entre dois aliados que estiveram juntos, no mesmo palanque, em 2018, apoiando o candidato do PT a presidente da República Fernando Haddad. Ricardo sentiu-se desprestigiado por João no governo, enquanto João se sentiu apunhalado por Ricardo dentro do PSB, onde houve uma operação “manu militari” para destituir o comando que era então presidido pelos aliados do governante eleito em 2018. Mais tarde, enquanto João sobrevivia no “Cidadania”, Coutinho enfastiava-se do PSB, o que o levou a movimentos rápidos para voltar ao seio do PT, que, lá atrás, renegara. A briga entre ex-aliados surpreendeu a Lula quando este deixou a prisão na Polícia Federal em Curitiba e de lá para cá o ex-presidente tem se movido no fio da navalha na realidade tabajarina, fazendo acenos a gregos e troianos, o que inclui o senador Veneziano Vital do Rêgo e a atual vice-governadora Lígia Feliciano (PDT), rompidos com João Azevêdo.
A contra-ofensiva da direção nacional do PT para ofuscar o encontro mantido em Brasília entre o governador João Azevêdo e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi desfechada pela presidente Gleisi Hoffmann, mas tem as digitais de Ricardo Coutinho, articulado com o senador Veneziano, para minimizar a qualquer custo a aproximação de João com o líder das pesquisas de intenção de voto. No vídeo divulgado pelos adversários de João, Lula tenta colocar os pontos nos is enfatizando que o PT na Paraíba tem uma aliança com o MDB – o que, em tese, favorece a pretensão do senador Veneziano de ser apoiado. Mas Azevêdo é considerado da “base lulista”, o que lhe garante o direito de uso de imagens ao lado do ex-presidente da República no seu Guia Eleitoral depois de vencida a etapa das convenções e homologação de chapas.
A Paraíba não é um caso único da situação atípica que está se desenrolando nesta fase pré-eleitoral, que antecede a formação dos palanques – há registros de disputas pelo apoio de Lula em outros Estados. Em Pernambuco, por exemplo, foi fácil para Lula harmonizar conflitos: ele declarou apoio a Danilo Cabral, pré-candidato a governador pelo PSB, e, nos bastidores, atuou para a retirada do páreo do senador Humberto Costa, que concorreria pelo PT e chegou a figurar como favorito em pesquisas de intenção de voto. De quebra, descartou qualquer apoio a Marília Arraes, do Solidariedade, sem proibi-la, porém, de também usar imagens suas no Guia Eleitoral. É um equilibrismo arriscado mas que, pelo menos para Lula, é confortável, se for mantido o cenário de apoios múltiplos à sua pré-candidatura a presidente da República. Foi ele mesmo, aliás, quem tentou resumir as coisas declarando: “Eu não recuso votos”. Vai tentar, assim, sair incólume do fogo cruzado que o coloca no centro do furacão em diversos Estados e regiões do país.