Nonato Guedes
Questões de estratégia política e afinidade pessoal estão por trás da cruzada obstinada empreendida pelo governador da Paraíba, João Azevêdo (PSB), para seguir com a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Palácio do Planalto nas eleições deste ano. Azevêdo, como se sabe, enfrentou uma verdadeira “via crúcis” para ser admitido na base lulista, diante dos movimentos deflagrados pelo ex-governador Ricardo Coutinho e pelo senador Veneziano Vital do Rêgo para isolá-lo no contexto da esquerda. O governador deu a volta por cima em alto estilo ao retornar ao PSB depois da passagem pelo Cidadania e deu um tiro certeiro porque Lula escolheu como vice o ex-tucano Geraldo Alckmin, após este consumar sua filiação à legenda socialista.
Veneziano, que é candidato a governador pelo MDB, se apresenta como “o candidato de Lula” na Paraíba valendo-se da aliança que fez e que lançou Ricardo Coutinho (PT) como pré-candidato ao Senado, apesar da situação de inelegibilidade que, no momento, o ex-governador exibe. Em paralelo, o senador emedebista tem tido interlocução frequente com Lula para o debate de questões de interesse nacional, dada a sua condição de primeiro vice-presidente do Senado, e, colateralmente, para discussão de demandas que dizem respeito à Paraíba. Mas, apesar de toda a mobilização feita para impedir que João Azevêdo se aproximasse do ex-presidente, isto já ocorreu em eventos nacionais conjuntos que passaram a se realizar entre petistas e socialistas. Afinal, o companheiro de chapa de Lula está plenamente integrado à campanha, inclusive, recebendo delegação de missões especiais a cumprir no sentido de atrair apoios do empresariado e de líderes representativos do centro, amortecendo eventuais resistências ou restrições ao apoio à postulação de Lula.
De resto, o ex-presidente e líder petista, atento à paroquialidade de conflitos políticos entre grupos ou facções nos Estados, já deixou claro que seu projeto constitui concertação de uma “frente ampla” para derrotar o bolsonarismo, com isso comportando apoios distintos de quem estiver interessado no desideratum. Pragmático, Lula sabe que não pode se dar ao luxo de recusar apoios, muito menos de líderes influentes como o governador da Paraíba, que é favorito, a dados de hoje, para se reeleger ao cargo. Em alguns Estados de maior densidade política, o próprio Lula teve a pachorra de costurar soluções de consenso dentro da sua base de apoio, a exemplo do que ocorreu em Pernambuco, onde persuadiu o PT a retirar a pré-candidatura do senador Humberto Costa ao governo e apoiar um postulante do PSB, Danilo Cabral. Esse movimento não impediu que a “frente lulista” em Pernambuco se alargasse com a pré-candidatura de Marília Arraes, agora no Solidariedade, liberada para usar imagens de Lula no seu Guia Eleitoral.
Azevêdo optou por Lula, no quesito da estratégia política, por reconhecer a importância e a qualificação do apoio dele à sua pré-candidatura a mais um mandato de governador na Paraíba, tendo em vista o prestígio de que Lula desfruta junto a parcelas significativas do eleitorado no Estado. No quesito da afinidade pessoal, Azevêdo confessa-se um admirador da trajetória do ex-presidente e tem empatia com ele pelas bandeiras democráticas que abraça. Além do mais, aposta na sensibilidade do ex-mandatário para com as reivindicações de Estados do Nordeste, por ações jde impacto já executadas como a deflagração do projeto de transposição das águas do rio São Francisco. O governador da Paraíba, tal como outros gestores de mais Estados da região, tem sido hostilizado pelo presidente Jair Bolsonaro e está prestes a concluir seu primeiro mandato sem ter tido audiência pessoal com ele. O próprio Bolsonaro, quando pisa na Paraíba, não cumpre agenda conjunta com o chefe do Executivo local, preferindo juntar-se a apoiadores que são caçadores de votos e de vantagens pessoais que eventualmente possam ser oferecidas. Por sorte a Paraíba não tem sido discriminada nas suas pautas e conta com um ministro da Saúde, que, embora da tropa de choque bolsonarista, coloca compromissos com o Estado acima das querelas políticas-partidárias.
Ter um presidente da República aliado nem sempre é garantia de apoio para governadores. Aqui mesmo, na Paraíba, houve um governador, Tarcísio Burity, que foi o primeiro a declarar apoio à candidatura de Fernando Collor de Mello em 1989, dividindo palanque, inclusive, com um senador que rompera com seu governo, o empresário Raimundo Lira. Collor ganhou a disputa com a fama de “caçador de marajás” derrotando Lula em segundo turno, numa das mais dramáticas eleições da história política do país. Já sentado na cadeira do Palácio do Planalto, “puniu” Burity e a Paraíba avalizando o fechamento do Paraiban, o banco estadual de fomento, alvo de liquidação extrajudicial comandada por interventores do Banco Central em operação “manu militari”. A Paraíba ficou perplexa e Burity sentiu-se apunhalado. Os defensores de Azevêdo, quando lembrados do episódio, alegam que Lula é diferente e que ele seria incapaz de prejudicar um Estado ainda em vias de desenvolvimento como a Paraíba. Seja como for, há a expectativa de Azevêdo de que, reeleito, seja bem tratado por Lula, caso este retorne à presidência da República, daí o engajamento pleno que o governador assume na pré-campanha, engolindo sapos e passando por cima de picuinhas de campanário.