Nonato Guedes
O economista paraibano Maílson da Nóbrega, ex-ministro da Fazenda, entrou na polêmica sobre a possibilidade, ou não, de ocorrência de um golpe de Estado no Brasil como reação suposta do presidente Jair Bolsonaro a eventual derrota na eleição de outubro próximo. “Seu habitual questionamento sobre a segurança das urnas eletrônicas é visto como preparação para a ruptura e o aparente apoio do ministro da Defesa e de grupos militares às teses de Bolsonaro sinalizaria o engajamento das Forças Armadas no golpe”, comenta Maílson, para acrescentar: “É pouco provável que isso aconteça”.
O ex-ministro justifica que o Brasil e o mundo mudaram e lembra que no próprio governo do presidente José Sarney, a que serviu, as escolas militares reformularam os cursos de formação de oficiais para aumentar a profissionalização das Forças Armadas e nelas acentuar o caráter de organizações do Estado. Desde então, oficiais legalistas passaram a constituir o grosso do generalato. Por outro lado, analisa Nóbrega, o sistema político, por sua maioria, se oporia ao golpe, pois perceberia o risco de fechamento do Congresso. A seu turno, o Poder Judiciário tem-se constituído poderoso obstáculo às investidas autoritárias do presidente. As opiniões de Nóbrega constam do artigo veiculado em seu blog na revista “Veja”, em que é enfático: “Se houvesse um golpe, seria um desastre político, social e econômico”.
Em paralelo, Maílson pondera: “Além disso, não existe o apoio de que gozou, em seus primórdios, o movimento militar de 1964. Naquela época, golpes constituíam reação à ameaça comunista. O novo governo era reconhecido rapidamente pelos Estados Unidos e por outros países ricos. Havia a aprovação da imprensa e da classe média. Agora, com o fim da Guerra Fria e o colapso do comunismo soviético, o golpe seria condenado por líderes mundiais, particularmente nos países ricos. Isolado, o Brasil poderia sofrer sanções danosas ao potencial de crescimento da economia, da renda e do emprego”. A comunidade internacional, a seu ver, reagiria com duras medidas.
De acordo com o prognóstico do ex-ministro, ao lado de sanções comerciais e financeiras, o país seria excluído da lista de candidatos a membro da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e dos grupos de que já participa nessa entidade. O Mercosul acionaria a cláusula democrática de seus estatutos, a qual não admite que regimes autoritários dele participem. Essa expulsão, por via de consequência, afastaria o Brasil da tarifa externa comum, o que aumentaria o ônus aduaneiro e nos prejudicaria no principal mercado de nossas exportações para o bloco, que é a Argentina.
Maílson da Nóbrega, por fim, avalia que na hipótese de golpe de Estado no Brasil o interesse dos investidores estrangeiros se esvairia, sejas pelas incertezas que o golpe imporia, seja pela observância das regras da Escola Superior de Guerra (ESG) – meio ambiente, social e governança, hoje adotadas pela grande maioria das empresas multinacionais. Com a correspondente perda de confiança no futuro, investidores estrangeiros deixariam o país. A consequente e forte desvalorização cambial acarretaria elevadas pressões inflacionárias e o drama do baixo crescimento, que tem atormentado os brasileiros nos últimos anos, seria agravado. “O golpe provocaria, portanto, efeitos negativos de grandes proporções, impondo severas perdas à economia e à sociedade, particularmente aos segmentos menos favorecidos”, continua Maílson, finalizando: “De forma competente, as Forças Armadas reconstruíram sua imagem depois das perdas no regime militar. Custa crer que se aventurariam a destruir esse admirável legado”.
Sócio de uma empresa de consultoria que atua no mercado a partir de São Paulo, Maílson da Nóbrega é uma voz respeitada nos círculos políticos, sociais e econômicos do país e tem se posicionado, em palestras, debates e artigos, na defesa das instituições democráticas contra os ensaios de radicalização política extrema que cercam a disputa presidencial deste ano, em meio à polarização que se observa entre o presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Detentor de fontes privilegiadas nos escalões de poder federal, Maílson não somente abomina o que chama de aventuras autoritárias como faz a leitura de que na sociedade brasileira contemporânea não há espaços para esses experimentos. A esses argumentos ele adiciona um ingrediente de peso: o risco de isolamento internacional do Brasil, com o inevitável desastre social e econômico do país. É um preço muito alto o bastante para desencorajar recaídas ou tentações autoritárias, partam de onde partirem.