Nonato Guedes
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pré-candidato à Presidência da República pelo PT, segue adotando a linha de evitar se aprofundar em temas polêmicos que dividem a sociedade brasileira como alegada estratégia para não perder posição de favoritismo em pesquisas de intenção de voto, sobretudo no confronto com o presidente Jair Bolsonaro (PL), com quem teoricamente polariza a corrida eleitoral. A estratégia é considerada arriscada, e até mesmo interlocutores próximos ao ex-mandatário admitem que deve haver uma relação maior de transparência na comunicação com o eleitorado, até porque alguns dos mais recentes levantamentos de institutos apontam perdas pontuais enfrentadas pelo líder petista no quesito da preferência dos eleitores.
Numa reportagem sobre a postura que é adotada por Lula e que, naturalmente, é controversa, o portal “Poder360” cita que o cenário político atual o estimula a detalhar pouco suas propostas para a eventual nova gestão, se se levar em conta o favoritismo até então demonstrado e que parecia inabalável. Desse ponto de vista, quanto menos ruído em torno de sua candidatura, maiores seriam as chances de manter o favoritismo até a eleição. Essa reportagem acrescenta que o programa de governo do petista deve ser genérico em sua parte econômica. Isso reduziria a chance de, ao menos, três possíveis encrencas: críticas dos adversários, conflitos no próprio entorno e divergências com empresários. Os petistas temem que as propostas de Lula para a economia sejam bombardeadas, enquanto o interesse deles é focar a campanha na comparação do atual governo, de Jair Bolsonaro, com os anos de Lula à frente do Planalto.
A respeito dos conflitos no próprio entorno, observa-se que em face da aliança múltipla, que vai de Geraldo Alckmin (PSB) ao PSOL, passando por apoios informais no PSD e no MDB, é próximo do impossível encontrar um programa econômico detalhado que agrade a todos os envolvidos. Por fim, o discurso tradicional do ex-presidente da República para a economia desagrada a iniciativa privada, enquanto o petista tem tentado atrair alguns dos principais atores ou expoentes dessa área. Na prática, informam os jornalistas Caio Spechoto e Mariana Haubert, Lula adia esses conflitos para depois da eventual vitória na eleição, já abancado no governo. Para ele, então, o ideal seria evitar turbulências nos próximos dois meses. O primeiro turno, como se sabe, está marcado para dois de outubro, e a campanha começa oficialmente no dia 16 de agosto.
Outro fator que estaria favorecendo um não detalhamento de propostas econômicas por Lula seria a rejeição atribuída a Jair Bolsonaro. Pesquisa PoderData do início de julho mostrou que 50% do eleitorado diz que não votaria no atual presidente da República de jeito nenhum. São 37% os que dizem não cogitar votar no petista. Fornecer detalhes das propostas econômicas daria ao atual presidente a oportunidade de criticar Lula e, talvez, aumentar a rejeição ao nome do petista. Isso deixaria mais difícil a disputa para o ex-presidente, que, reconhecidamente, tenta levar vantagem já no primeiro turno. A reportagem adverte que a omissão de detalhes de propostas para a área econômica, porém, não deixa um candidato 100% blindado. Alguns críticos afirmam, mesmo, que Lula busca obter um “cheque em branco” na eleição deste ano, ou seja, ganhar sem ter se comprometido com propostas claras e poder governar mais livremente. O efeito bumerangue disso pode ser a sensação de estelionato eleitoral por parte de grande parcela da opinião pública.
Aliados do petista utilizam ao menos dois argumentos para rebater a tese: falta de informações e possível piora fiscal. No primeiro caso, dizem que a política econômica se faz ao longo do governo e que é preciso ter domínio sobre a máquina para obter os dados necessários a esse planejamento (apesar de haver sistemas abertos com informações sobre as contas públicas alimentadas pelo próprio governo). No segundo caso, alega-se que Bolsonaro pode agravar a situação do país nos próximos meses e inviabilizar eventuais promessas de campanha. Os argumentos que estão sendo forjados para justificar o injustificável parecem falaciosos. Não há caixa preta que impeça Lula de apresentar suas próprias propostas e, se eleito, adaptá-las à conjuntura. O que pode estar por trás da orquestração ora ensaiada é mesmo a falta de novidades por parte de Lula e dos petistas para um hipotético terceiro governo de Lula, com o receio de que não se repitam êxitos pontuais das gestões anteriores. Em qualquer circunstância, Lula, que tanto diz defender a democracia, deve satisfações à sociedade brasileira.