Nonato Guedes
O primeiro confronto direto entre seis candidatos à Presidência da República nas eleições deste ano acontecerá hoje, às 21h, na TV Band, em parceria com UOL, Folha de S. Paulo e TV Cultura. Três deles já participaram de eventos similares em disputas anteriores ao cargo: Ciro Gomes (PDT), Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ficando a estreia por conta de Luiz Felipe D’Avila (Novo), Simone Tebet (MDB) e Soraya Thronicke (União Brasil), que também disputam pela primeira vez uma vaga no Palácio do Planalto. Uma reportagem do UOL registra que os confrontos, importantes para definir votos e ouvir propostas dos postulantes, já proporcionaram momentos históricos no Brasil, com situações bastante tensas e xingamentos entre adversários. De falas homofóbicas a xingamentos, os debates produziram impacto nas conjunturas políticas brasileiras.
Em 1982, Franco Montoro se elegeu governador de São Paulo e protagonizou com o ex-presidente Jânio Quadros um dos grandes instantes de um debate no Brasil. Para provocar Jânio, Montoro usou a citação de um livro de Carlos Lacerda, desafeto do ex-presidente e ex-governador, que teria feito uma denúncia de tentativa de golpe por parte de Jânio Quadros quando era mandatário. Montoro começou a falar sobre a renúncia de Jânio à Presidência e, ao citar o livro de Lacerda como fonte de uma informação, arrancou risadas da plateia. “O senhor acaba de querer citar as Escrituras valendo-se de Asmodeu ou de Satanás”, rebateu Jânio, que deixou sem resposta a pergunta de Montoro. Em 89, na primeira eleição presidencial ocorrida no Brasil após a promulgação da Constituição-Cidadã, Leonel Brizola e Paulo Maluf sustentaram discussão acalorada em debate comandado pela jornalista Marília Gabriela no primeiro turno.
Com irritação e sem medir palavras, Maluf chamou Brizola de “desequilibrado” e afirmou que um candidato à Presidência da República precisava ter estabilidade emocional, fazendo a plateia rir. Em resposta, Brizola o interrompeu e o chamou de “filhote da ditadura”. Maluf ainda provocou: “Desequilibrado! Passou 15 anos no estrangeiro e não aprendeu nada”. Houve gritaria e a mediadora teve que chamar intervalos comerciais. No segundo turno de 1989, foi a vez de Fernando Collor de Mello e Luiz Inácio Lula da Silva protagonizarem embates. Entre diversas trocas de acusações, Collor chamou o petista de “cambalacheiro”, insinuando que Lula agia com má-fé em negociações para alianças políticas. A discussão começou com Collor questionando o apoio de José Sarney a Lula. O petista respondeu que até Collor poderia votar nele se assim quisesse e negou qualquer relação com Sarney, dizendo que ele estava tão em cima do muro que poderia até errar o voto. “Isso, para mim, tem um nome: cambalacho. Quem faz cambalacho é cambalacheiro. Por que ele não vai à televisão e diz que não quer o apoio do Sarney? Porque ele quer tirar dividendos eleitoreiros e isso tem um nome: é cambalacho”, respondeu Collor.
No último debate antes da votação em 1989, Collor tentou pregar o rótulo de mentiroso em Lula e fez insinuações de que ele não saberia ler. A reportagem do UOL lembra que Lula e Geraldo Alckmin, agora aliados, como candidatos a presidente da República e a vice-presidente, já foram grandes adversários e se enfrentaram em debates de repercussão. Mais precisamente durante o segundo turno de 2006, quando Lula buscava a reeleição, ele chamou o então tucano de leviano numa discussão. Em 2014, Aécio Neves, candidato pelo PSDB, também usaria essa expressão com Dilma Rousseff e teria uma repercussão bastante negativa para o ex-governador tucano. Em 2006, o contexto era de corrupção e, na troca de acusações, Alckmin afirmou que Lula tinha pessoas condenadas em seu governo, enquanto o petista acusou o PSDB de compra de votos. “Quanta mentira, como o Lula mudou”, disse Alckmin. “Não seja leviano, não seja leviano. Eu vou dizer: não seja leviano”, rebateu o petista.
Os tempos, evidentemente, mudaram, de que é exemplo a chapa Lula-Alckmin em 2022. O debate programado para hoje, além de mobilizar torcidas e eleitores, poderá influenciar até decisivamente intenções de voto para o pleito que está marcado em primeiro turno para outubro. Entre os participantes, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é, de longe, o mais experiente em debates e, de tanto participar deles, desenvolveu técnica apurada que o faz, em regra, sobressair perante contendores, mesmo quando tentam colocá-lo em saia justa, como se deu num dos dramáticos confrontos com Fernando Collor de Mello na primeira eleição presidencial pós-redemocratização. A expectativa é de que, no debate de hoje, o presidente Jair Bolsonaro seja o mais contundente acusador de Lula, mas Ciro Gomes também é polêmico e está avido por confrontar Lula para tentar crescer em pesquisas de opinião pública. No dizer do colunista Josias de Souza, se não servir para esclarecer muito, o debate deve servir, pelo menos, para educar candidatos perante o eleitorado a quem eles se dirigirão.