Nonato Guedes
Na seara política paraibana, nesta conjuntura eleitoral, há quem identifique semelhança na situação de inelegibilidade da candidatura do ex-governador Ricardo Coutinho (PT) ao Senado com o impedimento que privou o também ex-governador Cássio Cunha Lima (PSDB) de se investir no mandato de senador por quase um ano, em 2011. O próprio Ricardo, numa entrevista, insinuou analogia entre os dois casos. Mas fontes jurídicas consultadas pelo colunista negam a semelhança e apontam casos distintos na polêmica que está sendo agitada às vésperas da eleição de 2022 em primeiro turno. Cássio não estava mais inelegível quando disputou a eleição de 2010 – na época, a pena de inelegibilidade era de três anos. Cunha Lima foi cassado por alegadas irregularidades na eleição de 2006; portanto, a pena de três anos fora concluída em 2009. Com relação a Coutinho, a pena de inelegibilidade é de oito anos, estendendo-se das eleições de 2014 às eleições de 2022.
Por outro lado, o Tribunal Superior Eleitoral já se posicionou pela validade da pena de oito anos no caso atinente a Ricardo, o que torna ocioso ou inútil qualquer recurso àquele colegiado para rever jurisprudência em pleno ano eleitoral apenas a pretexto de atender a uma situação pontual. Ricardo e sua defesa sinalizam com a possibilidade de um recurso extraordinário junto ao Supremo Tribunal Federal, mas as chances de reversão, com indicativo de vitória, são consideradas remotas em círculos jurídicos abalizados. Nesses círculos admite-se como legítima a estratégia utilizada por Coutinho, mas também se adverte que isto não significa necessariamente “causa ganha”. Faz-se a ressalva, inclusive, de que há outros elementos de inelegibilidade cercando a trajetória política do líder petista, o que torna inconfiável a premissa do êxito que é alardeada tanto pelo candidato quanto por seguidores e simpatizantes da sua postulação.
Acusado de ter praticado abuso de poder na campanha e se utilizado da máquina para conquistar a reeleição, Cássio teve o mandato cassado pelo Tribunal Regional Eleitoral, atendendo a representação feita pelo PCB, e recorreu imediatamente a Brasília, logrando obter liminares para permanecer à frente do cargo até o trânsito em julgado dos processos interpostos. Chegou a desabafar sobre a situação surrealista que dizia enfrentar: “Estou ameaçado de perder um mandato conquistado com legitimidade porque magistrados honrados recusam-se a fazer uma leitura aprofundada do processo, ou por estarem assoberbados ou pressionados pelo noticiário”. Na sessão do TSE realizada em 20 de novembro de 2008, foi reiterada a cassação de Cunha Lima por seis votos a zero. Em fevereiro de 2009, Cássio e o vice, José Lacerda Neto, foram cassados de forma terminativa, determinando-se a investidura do segundo colocado no pleito de 2006, o senador José Maranhão (MDB) que tinha como vice Luciano Cartaxo. Cássio buscou a revanche nas urnas em 2010 e alcançou a maior votação entre os postulantes, mas foi enquadrado no rigor da nascente Lei da Ficha Limpa, derivada de uma mobilização social sem precedentes no país e alvo de controvérsias imprevisíveis no STF, que acabou decretando a sua validade somente a partir de 2012.
Enquanto Cássio mergulhava numa pletora de recursos, agravos regimentais e embargos declaratórios na Corte Eleitoral em Brasília, tomava posse em seu lugar o peemedebista Wilson Santiago, segundo mais votado no pleito e que chegou a ser contemplado com um cargo estratégico na Mesa do Senado Federal. A luz no fim do túnel raiou para Cássio Cunha Lima no início de novembro de 2011, quando a Mesa presidida pelo senador José Sarney acatou parecer do relator Ciro Nogueira e, em meio a uma comunicação oriunda do Supremo Tribunal Federal, decretou que Cássio era o legítimo dono da cadeira. Durante todo o período em que durou o calvário a que foi submetido, Cássio verberou insistentemente contra o que chamou de “maior erro judiciário dos últimos tempos”. Já na posse, emocionado, fez um discurso de improviso saudando a decisão da Justiça e prometendo lutar em favor dos interesses e das carências da Paraíba, além de tecer críticas pontuais ao governo da então presidente Dilma Rousseff, do PT.
No que diz respeito ao ex-governador Ricardo Coutinho, a semelhança do seu caso com o de Cássio pode estar apenas no objeto da denúncia formulada – a de abuso de poder político durante o período em que exerceu o segundo mandato, a partir de 2014. Fora daí, outros argumentos invocados, referentes a “filigranas jurídicas”, não parecem ter força para reverter a inelegibilidade. Isto tornaria a situação de Ricardo, sob todos os títulos, um “caso perdido”. Mas, como ele não se dá por vencido e ainda tem brechas a explorar, segue a controvérsia, que confunde notoriamente a opinião pública e que tumultua o processo em andamento, afetando outras candidaturas que estão postas ao Senado para julgamento do eleitorado.