Nonato Guedes
Está em marcha, por parte de expoentes petistas e de figuras alinhadas com as chamadas forças democráticas ou progressistas do cenário político brasileiro, uma orquestração para tentar viabilizar o chamado ‘voto útil’ na candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já em primeiro turno, com isto somando apoios para tentar liquidar a fatura da disputa presidencial no começo de outubro, com a consequente derrota do presidente Jair Bolsonaro (PL) que postula a reeleição. A articulação procura sensibilizar lideranças influentes que até então pareciam equidistantes do processo, como a ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, que esteve com Lula no fim de semana e declarou apoio alegando ser ele o que agrega mais condições para preservar conquistas democráticas que estariam ameaçadas pelo estilo do governo de Bolsonaro. Nas últimas horas, ganhou força com a pesquisa Ipec, indicando que Lula oscilou 2 pontos para cima, indo para 46% nas intenções de voto, enquanto Bolsonaro se manteve estacionado em 31%. Esse resultado sinalizaria a perspectiva de vitória do petista no primeiro turno.
Em que pese o PT nunca ter abraçado com simpatia teses como a do ‘voto útil’, resistindo em ocasiões dramáticas da conjuntura nacional a elas aderir, o movimento de agora, naturalmente, é bem acolhido pelo lulopetismo diante da estagnação de percentuais de intenções de voto que vinha ocorrendo tanto entre eleitores do ex-presidente como entre eleitores do atual presidente. O cientista político Jonas Medeiros, em entrevista à mídia sulista, avaliou que os dois principais candidatos ao Palácio do Planalto ainda não conseguiram furar a bolha do seu eleitorado para conquistar novos apoios e, por isso, permaneciam estancados nas pesquisas, pelo menos nas anteriores que foram feitas. Medeiros acredita que Bolsonaro repete a fórmula que o elegeu em 2018, enquanto Lula baseia sua campanha no legado de suas gestões. Ambos, porém, não podem ignorar que a realidade brasileira mudou bastante, exigindo novas narrativas, mais consistentes e atraentes.
Jonas Medeiros salienta que a receita de quatro anos atrás que Bolsonaro tenta reproduzir agora não está surtindo efeito nem apontando num sentido de ampliação, enquanto Lula dá a impressão de estar jogando parado, pelos acenos em repetir o passado sem o aporte de novas propostas concretas e motivadoras. No caso de Bolsonaro, ressalte-se que há indícios de que ele começou a perder apoios dentro do seu próprio círculo, pelas atitudes agressivas que tem tomado e que revelam inadequação à liturgia do cargo de Chefe de Governo. Na largada da campanha isto funcionou como combustível para agitar, particularmente, os chamados bolsões radicais ou extremistas que erigiram uma aura de fanatismo em torno da personalidade de Bolsonaro, a ponto de compará-lo, equivocadamente, a um “mito”. Entretanto, a reiteração de apelos autoritários, com celebração do culto ao “machismo” e outras posturas politicamente incorretas, tem afastado o atual presidente do sentimento de admiração por parte de figuras representativas da opinião pública brasileira, sem falar que, no exterior, sua imagem é profundamente negativa.
Em relação ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, se não há propriamente uma glorificação da sua imagem por segmentos que já admitem votar nele, embora de forma crítica, há a mobilização pelo voto útil que atropela candidaturas como as de Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB), ainda encaradas como supostos representantes da chamada terceira via no cenário de polarização. Essa mobilização ganhou força nas redes sociais, onde conta com a atuação de muitos influenciadores. Uma reportagem da “Revista Forum” cita depoimentos de eleitores que se dizem “convertidos” na reta final por não aceitarem participar do que seria um erro – apostar na “terceira via”. Há pressões veladas ou ostensivas para que candidatos como Ciro desistam da parada, usando o argumento de que ele perde para o Lula até no Ceará, onde foi governador e fez carreira política.
Esta semana já está sendo considerada como termômetro decisivo para aferir se há, realmente, um ambiente de receptividade à proposta do ‘voto útil’ no sentido de votar-se no ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para evitar as incertezas de um novo mandato do presidente Jair Bolsonaro. Analistas políticos experientes consideram que não são apenas motivações ideológicas que estão por trás da orquestração rumo ao ‘voto útil’, mas razões psicológicas ligadas a um certo estado de exaustão com a conjuntura nacional, misturado com o receio de falta de perspectivas promissoras para o futuro do Brasil, diante do agravamento da crise econômica, que se reflete cotidianamente, e, também, diante da gravidade da crise social, traduzida nas estatísticas alarmantes sobre quantidade de brasileiros que estão passando fome, diante da incúria do atual governo e da sua inação para resolver essas demandas.