Nonato Guedes
Em declarações ao colunista, o ex-senador Marcondes Gadelha, que está se despedindo da política, em que passou a militar a partir dos anos 60/70, admitiu que é extremamente atípica a conjuntura atual que opõe o presidente Jair Bolsonaro (PL) ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), referindo-se ao ambiente de acirrada polarização entre partidários dos dois postulantes ao Planalto. “Só vi algo igual em 1989, na primeira eleição presidencial pós-regime militar”, contou Gadelha, referindo-se ao confronto ocorrido entre Lula e Fernando Collor de Mello, com vitória deste e, posteriormente, com o seu impeachment à frente do cargo. Para Marcondes, a polarização de agora é muito mais aguda por confrontar dois líderes populistas e por não possibilitar qualquer espaço para a viabilidade de um representante da “terceira via”, contaminando o cenário geral com explosões de fanatismo e até de abalo em relações interpessoais.
Marcondes Gadelha tem evitado se envolver, mesmo como espectador, na disputa entre Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva, estando empenhado, de corpo e alma, na eleição do seu filho, Leonardo, à Câmara Federal pelo PSC. Acredita que Leonardo tem chances de conquistar uma vaga juntamente com mais dois candidatos do PSC no Estado – o deputado federal Ruy Carneiro, que busca a reeleição, e o ex-prefeito de Campina Grande, Romero Rodrigues, que, inclusive, foi colega de legislatura de Blsonaro na Câmara, tal como Marcondes. Para o governo do Estado, Marcondes revela simpatia pela candidatura do deputado federal Pedro Cunha Lima (PSDB) e se declara animado com as pesquisas que apontam o filho de Cássio Cunha Lima como expoente potencial do segundo turno que, de acordo com os levantamentos de institutos especializados, acontecerá nas eleições ao Executivo estadual.
O ex-senador, que acaba de completar 79 anos e que chegou a exercer titularidade na Câmara até o começo de 2019, como suplente do deputado Rômulo Gouveia, que faleceu em pleno mandato, planeja se dedicar a livros, versando, inclusive, sobre A Felicidade, num ensaio de fôlego que pretende levar adiante com sua filha Berta. Para ele, a polarização de “populismos” na corrida presidencial deste ano não tem sido propriamente salutar para a democracia porque baseada no voto “do contra” – quer seja contra Lula, quer seja contra Bolsonaro. Considera que os dois líderes não têm conseguido apresentar propostas novas e importantes para a solução dos graves problemas nacionais, estando mais focados na guerra de acusações pessoais e de comparação sobre eles mesmos como tática de sensibilização do eleitorado e como estratégia de manutenção do clima de radicalização, que tem se refletido nas campanhas estaduais e nas disputas para mandatos legislativos, levando a todos de roldão nesse processo.
Em 1989, Marcondes Gadelha foi candidato a vice-presidente da República na chapa encabeçada pelo apresentador e dono do SBT, Sílvio Santos, que se lançou pelo PMB, mas a chapa acabou sendo impugnada pelo Tribunal Superior Eleitoral acolhendo representação movida pelo candidato Fernando Collor de Mello, que se sentiu ameaçado na sua pretensão de chegar à Presidência da República. O episódio é narrado em detalhes no livro “Sonho Sequestrado”, de Marcondes Gadelha, no qual ele faz uma revisão histórica cuidadosa, mostrando que “na verdade houve uma engenhosa e implacável conspiração para impedir a qualquer custo a candidatura do apresentador de TV, antes do primeiro turno, por uma razão muito simples: ele seria imbatível nas urnas”. A eleição presidencial de 89 registrou um número recorde de candidatos à Presidência da República, incluindo “condestáveis” da política como Ulysses Guimarães, Leonel Brizola, Mário Covas, Guilherme Afif Domingues e até mesmo o folclórico Enéas, que se lançou pelo partido “Prona” como candidato de protesto. Sílvio, na visão de Marcondes, poderia perfeitamente ter quebrado a polarização, não fosse a orquestração insidiosa armada contra ele por expoentes do sistema.
Marcondes Gadelha projetou-se como integrante do chamado “grupo autêntico” do MDB, que resistiu à ditadura militar e que empalmou bandeiras de repercussão como a da anistia, o fim da tortura a presos políticos, a convocação de eleições diretas e o pluripartidarismo. Por divergências políticas locais, com o grupo do ex-deputado Antônio Mariz, acabou migrando para o PFL e foi eleito senador em 1982. Concorreu ao governo do Estado em 1986, perdendo o confronto para Tarcísio Burity. Ele defendeu o Parlamentarismo e ingressou em vários partidos, tendo se notabilizado, também, pela defesa do projeto de transposição das águas do rio São Francisco. No dizer da escritora Ana Beatriz Nader, Marcondes foi, antes de tudo, um dos semeadores da democracia no país. Ao colunista, ele afirma que o país está ingressando num semipresidencialismo e acrescentou que teme pelas consequências, diante da hipertrofia de poderes que tal sistema de governo provoca. “Mas estes são desafios para a nova geração de quadros políticos. Considero concluída a minha contribuição nessa história”, frisou Marcondes Gadelha.