Nonato Guedes
Centenas de economistas de vários Estados brasileiros, que participaram em João Pessoa, no início deste mês, do XXVII Simpósio Nacional dos Conselhos de Economia, prepararam um documento, já dirigido ao presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), pleiteando a restauração de instituições e políticas públicas que possibilitem a governabilidade do país focada na promoção de elevado crescimento econômico inclusivo, sustentável, com estabilidade de preços e aumento do bem-estar. Intitulado “Carta de João Pessoa”, o documento reforça a reivindicação da reforma tributária, no bojo de medidas consideradas importantes como novas regras fiscais e revogação do teto de gastos, além do controle da inflação com taxas de juros menores. O evento teve a participação, inclusive, de um filho do economista paraibano Celso Furtado, fundador da Sudene.
A “Carta de João Pessoa” é subscrita por Cofecon e Corecons e faz análise sobre a conjuntura internacional instável, com efeitos adversos de crises geopolíticas e sanitárias e perda do protagonismo brasileiro num quadro em que o país está de volta ao mapa da fome, com milhões de trabalhadores sem emprego ou em subemprego e o endividamento insustentável das famílias e empresas. No capítulo da reforma tributária, os economistas propuseram que ela promova a simplificação, reduza a insegurança jurídica e institua a progressividade prevista na chamada Constituição Cidadã de 1988, particularmente com impostos sobre grandes patrimônios, atualizando-se e melhorando a fiscalização do Imposto Territorial Rural, movimentações financeiras e lucros e dividendos distribuídos, este último com grande potencial arrecadatório como uma das formas de financiamento das políticas sociais urgentes.
Os economistas defendem a promoção do crescimento da renda e do pleno emprego mediante investimentos em infraestrutura, investimentos públicos e por concessão ou PPP, retomada do Programa Minha Casa, Minha Vida, em grande escala, e concessão de crédito pelos bancos públicos com taxas significativamente mais baixas. O crédito deve ser direcionado preferencialmente a projetos de investimentos de grande potencial de encadeamento e geração de emprego, a consumidores e pequenas empresas. Tais políticas devem ser mais intensas em locais de renda per capita e mercado de trabalho mais frágeis, com o propósito de reduzir as desigualdades regionais. O documento postula que haja revisão da legislação trabalhista e previdenciária, com revogação dos itens que facilitam a disseminação do trabalho precário, garantindo os direitos aos milhões de trabalhadores que estão nestas condições.
Urge, de acordo com os economistas, propiciar o crescimento da produtividade com persistente aumento da qualidade do ensino em todos os níveis, maiores investimentos públicos e incentivos a privados, em ciência, tecnologia e inovação, com maior articulação entre empresas e centros de pesquisa, condicionados a avaliações e cumprimento de metas. É essencial identificar setores estratégicos, como economia digital, de baixo carbono e níveis de grande conteúdo tecnológico nas cadeias globais de valor. Ainda: implementar políticas públicas que reduzam a desigualdade social, começando pelo combate à fome que atinge 33 milhões de brasileiros. Importa fortalecer os programas assistenciais, compensatórios das carências dos segmentos mais vulneráveis, retomando o Bolsa Família que é vinculado à frequência escolar e vacinação e pode ser melhorado com sua manutenção temporária após ingresso no mercado de trabalho, o Farmácia Popular, o Programa Nacional de Alimentação Escolar e o contínuo aprimoramento e abrangência do SUS, explorando todas as potencialidades de desenvolvimento tecnológico e social, no âmbito do complexo econômico industrial da saúde.
A “Carta de João Pessoa” propõe que seja incentivada a participação da mulher economista na sociedade. Isto implicaria em desenvolver e estimular a capacitação das mulheres e jovens economistas com vistas a reduzir os entraves, tais como a redução salarial e a baixa absorção da mão de obra feminina no mercado, desenvolvendo-se uma agenda pela igualdade de gênero, de acordo com as recomendações do Quinto Objetivo da Agenda 2030 de desenvolvimento sustentável da ONU. Também é sugerida implantação de política de desenvolvimento da agricultura familiar, com democratização do acesso à terra por meio de uma reforma agrária agroecológica, e, por outro lado, a colocação da questão ambiental no centro da agenda econômica, “de forma a garantir o desenvolvimento sustentável, combatendo o desmatamento e queimadas e enfrentando os desafios colocados pela emergência climática”. Nesse sentido, especial atenção deve ser dispensada à região Amazônica, “que deve ser explorada economicamente com projetos que não degradam os seus biomas”, concluem os economistas que se reuniram na Paraíba.