Nonato Guedes
O apoio sinalizado pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva e pelo PT à reeleição de Arthur Lira (PP-AL) é, mesmo, um movimento pragmático para evitar a repetição do “fantasma Eduardo Cunha”, deputado do MDB que se elegeu contra Arlindo Chinaglia (PT-SP) e deflagrou o processo de impeachment que resultou no afastamento de Dilma Rousseff do Palácio do Planalto. Em declaração ao jornal O Globo, o presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, avaliou como positivo o apoio de Lula a Arthur Lira, mesmo com as restrições que são feitas a este, acusado de ser um dos expoentes do chamado Centrão, agrupamento fisiológico que barganha favores com governos em troca da aprovação de matérias de seu interesse.
“O presidente Lula está em busca de uma tranquilidade que o PT não teve no governo de Dilma Rousseff. A derrota na eleição da Câmara para Eduardo Cunha em 2015 custou muito caro. Não faria sentido o PT gastar energia contra Lira”, disse Kassab ao jornal. Com a relação estremecida com o Palácio do Planalto em dezembro de 2015, Cunha autorizaria o início do rito do processo de afastamento de Dilma, que seria referendado pela Câmara e posteriormente pelo Senado e que ainda hoje é considerado como “golpe” para favorecer o então vice-presidente da República, Michel Temer, que foi alçado ao posto. Na opinião de Kassab, o petista Lula já articula uma base de apoio antes de começar o seu terceiro mandato, movimento que tem a ver com o comando do Legislativo e que ele considera correto.
Em certa medida, houve estranheza com a sinalização de Lula na direção do Centrão, uma vez que, como candidato nas eleições deste ano ele chegou a criticar a concentração de poder nas mãos do dirigente da Câmara dos Deputados. Kassab avalia, porém, que esses são os ossos do ofício de fazer uma campanha eleitoral. “Campanha é campanha. É preciso ter inteligência emocional na vida pública”, declarou ao O Globo, descartando desde já, porém, os rumores sobre consolidação de um possível Centrão do Lula, em contraponto ao Centrão do presidente Jair Bolsonaro, composto por partidos como PP, PL e Republicanos. “PSD e MDB jamais estiveram nesse bloco e o União Brasil é uma sigla nova. Agora, é evidente que vamos ajudaro governo a indicar cargos, o que é a essência da democracia”, sintetizou Kassab.
O colunista do UOL Leonardo Sakamoto comenta que a aproximação do presidente eleito com o presidente da Câmara, Arthur Lira, visa a garantir uma boa relação com o Legislativo para que o mandatário tenha a governabilidade assegurada. Sakamoto também mencionou a relação não muito amistosa entre Dilma Rousseff e Eduardo Cunha, que acabou com o impeachment da petista em 2016. Ele destacou que apesar de ter feito muitas críticas ao orçamento secreto e ao próprio Arthur Lira, Lula acabou se rendendo ao pragmatismo por ter medo que a situação Dilma-Cunha se repita. “Lula não quer passar pelo mesmo rolo compressor que Dilma enfrentou e, de forma bastante assertiva, assume que vai apoiar a manutenção de Lira no comando da Câmara”, reforça. A saga vivida por Dilma foi descrita por Cunha no livro “Tchau, Querida – O Diário do Impeachment”.
Sakamoto entende que o apoio agora manifestado a Arthur Lira pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva significa também apoiar os métodos do político alagoano, incluindo o orçamento secreto. A respeito deste caso polêmico, o colunista acha que Lula irá torcer por uma decisão favorável do Supremo Tribunal Federal para acabar com o orçamento, tão criticado durante sua campanha para o terceiro mandato na Presidência da República. “Em relação à manutenção do orçamento secreto, Lula fica dependendo de uma decisão do STF, já que provavelmente o governo futuro não vai bater de frente e nem sua base vai bater de frente com isso. O Lula, para ver cumprida sua crítica ao orçamento secreto, vai cruzar os dedos esperando que o STF dê um posicionamento contrário a isso”, finalizou Leonardo Sakamoto. A verdade é que o ex-presidente da República e líder petista curtiu bastante o aprendizado sobre a natureza do jogo político-institucional brasileiro que é travado nos subterrâneos de poderes ou instituições como o Senado Federal e a Câmara dos Deputados, e não lhe move nenhum propósito de radicalizar nesse terreno, com isto alimentando bolsões de tensão que poderiam ser desfavoráveis à tranquilidade do próprio mandato que espera empalmar a partir de janeiro.