Nonato Guedes
Deu o esperado: o ministério que começou a ser anunciado pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva contempla nomes que foram expoentes da coalizão política que ele arregimentou como lastro para enfrentar Jair Bolsonaro (PL) e vencê-lo nos dois turnos da disputa presidencial este ano. Nesse contexto, é claro, o Partido dos Trabalhadores, sigla que Lula fundou no ABC paulista e que se converteu em polo do cenário político brasileiro, foi contemplado à altura, da mesma forma como Lula prestigiou, sobremaneira, o seu vice-presidente, Geraldo Alckmin, que foi um ativo político importante para entronizar o ex-candidato junto ao empresariado e para amortecer eventuais resistências da parte das classes produtoras e do agronegócio à terceira eleição de Da Silva para o Palácio do Planalto.
Há quem considere que no desenho da equipe ministerial o presidente eleito foi generoso, também, com o “Centrão”, dentro dos acenos para garantir a governabilidade que passa pelo apoio desse agrupamento fisiológico atuante no Congresso Nacional, principalmente na Câmara dos Deputados. Lula, porém, já havia demonstrado que é um político pragmático na própria montagem dos palanques eleitorais, quando lançou mão do que chamou de “concertação política” em defesa da democracia, atraindo forças de centro-direita ou grupos políticos conservadores. O resultado foi expresso com a sua vitória nas urnas – uma verdadeira odisseia. As promissórias, agora, estão sendo resgatadas, mas Lula, habilidosamente, faz concessões à esquerda, agregando figuras que têm, inclusive, projeção internacional, junto a organizações ambientalistas e defensoras dos direitos humanos.
Remanescentes de gestões petistas como as de Lula e as de Dilma Rousseff estão representados na interface dada a público, como Alexandre Padilha nas Relações Institucionais e Fernando Haddad, na pasta da Fazenda. Seis mulheres foram indicadas para comandar pastas, inclusive a estratégica Saúde, que nos últimos meses do governo Bolsonaro ficou sob controle do cardiologista paraibano Marcelo Queiroga, havendo expectativa, ainda, sobre o aproveitamento de Simone Tebet (MDB), que como candidata a presidente da República foi fundamental na campanha de Lula no segundo turno, e Marina Silva (Rede), também um ativo eleitoral respeitável que foi arrebanhado na etapa decisiva da jornada do líder petista. No geral, há nomes altamente qualificados na composição do ministério da terceira gestão lulista, como, por igual, se trata de uma equipe aguerrida treinada para o período de terra arrasada que o novo governo enfrentará como reflexo da catastrófica herança bolsonarista. Até mesmo quem não votou em Lula dá um crédito de confiança, para não torcer contra o Brasil.
Sobre a indicação do vice Geraldo Alckmin para comandar o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, foi encarada como mais uma prova da confiança que o presidente eleito deposita em seu companheiro de chapa, bem como como mais uma sinalização do novo governo ao setor produtivo. Pelo menos é o que afirmam interlocutores, tanto do mandatário como do vice. A Pasta, de imediato, terá mais peso e evidência sob o comando de Alckmin, que passa a acumular o ministério e a vice-presidência. Comandante do processo de transição que vigorou em Brasília, Alckmin ganhará ainda mais força e destaque na futura gestão, o que permite especular que não será uma peça decorativa na nova corte petista. Esse figurino agrada setores do mercado e do empresariado, temerosos de uma guinada à esquerda nos rumos do governo. Alckmin havia sido elogiado por Lula pelo trabalho na transição, considerado eficiente em meio às dificuldades criadas pelo governo Bolsonaro no repasse de informações.
Durante a campanha eleitoral, o ex-governador de São Paulo pelo PSDB, que concorreu pelo PSB para se tornar mais palatável a agrupamentos de esquerda, teve interlocução importante com empresários, inclusive os que estavam refratários a uma candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Geraldo Alckmin chegou a ser cotado para comandar o Ministério da Fazenda, mas supostamente teria sido descartado diante de resistências emanadas de setores ortodoxos do PT que ainda não o assimilaram completamente. Seja como for, com a escolha para o Ministério do Desenvolvimento, Lula também repetirá a fórmula utilizada em 2004, em seu primeiro mandato no Planalto, quando o empresário José Alencar, então vice-presidente, passou a comandar a pasta da Defesa. A escolha de Alckmin também é mais uma forma de contemplar o PSB paulista, importante peça na costura que levou o ex-governador tucano a se transformar no vice de Lula na campanha.