Nonato Guedes
Não chega a ser impertinente a provocação feita pelo advogado Raoni Vita ao Tribunal Regional Eleitoral da Paraíba solicitando realização de um plebiscito sobre o nome da cidade de João Pessoa, capital do Estado. Como ele mesmo pontuou, tomou como base e argumento para a iniciativa o dispositivo previsto na própria Constituição Estadual, prevendo como obrigatória a efetivação do plebiscito sobre esse tema específico. Raoni ressalta que, infelizmente, em quase 34 anos da promulgação da Constituição que está em vigor, o plebiscito nunca foi levado a efeito, configurando-se caso de notória lacuna que poderia ser corrigida, de acordo com a sua proposta, na próxima eleição geral prevista para 2024, tratando da escolha do prefeito e dos vereadores.
O assunto, evidentemente, suscita controvérsia, não faltando quem atribua pendores de promoção pessoal ao advogado-patrono da sugestão protocolada no TRE. Abstraindo eventuais ou supostos interesses subjetivos de quem quer que seja, a norma legal contempla a possibilidade que está sendo agitada e, por outro lado, o plebiscito poderá ser a grande chance de se colocar o ponto final numa polêmica que se arrasta há quase cem anos em torno de um episódio histórico de repercussão. A capital chamava-se Parahyba e no dia quatro de setembro de 1930 passou a denominar-se João Pessoa em homenagem ao então presidente do Estado, assassinado na Confeitaria Glória no Recife pelo desafeto político João Dantas, em caso que se revestiu de fortes elementos passionais.
O assassinato de João Pessoa entrou para a História, igualmente, por seus desdobramentos, ou seja, por ter desencadeado a chamada revolução de 30, um golpe militar que depôs o governo de Washington Luís e originou a ascensão de uma Junta Pacificadora que, em novembro, entregou o poder a Getúlio Vargas, o caudilho gaúcho que em 1954 abalou a Nação suicidando-se no Palácio do Catete. No que diz respeito à permanência da denominação da Capital paraibana como João Pessoa tem sido alvo, ao longo dos anos, de embates entre remanescentes de antigas correntes políticas como perrepistas e liberais, acrescidas de novos segmentos sociais desvinculados de facções ultrapassadas e dos entrechoques datados de períodos remotos. Esses novos atores, por assim dizer, sentem-se excluídos ou marginalizados do processo de tomada de decisões sobre questões relevantes.
O advogado Raoni Vita intenta apresentar-se como porta-voz de tais segmentos. Ele afirma textualmente, na justificativa da iniciativa que tomou a peito: “Esta é uma grande oportunidade para exercermos nossa cidadania e defendermos o direito de participação popular direta na tomada de decisões, mas isso somente será possível com a ajuda e o engajamento da população da nossa Capital”. O mandado de injunção que ele impetrou no Tribunal Regional Eleitoral já deflagrou o processo sobre a viabilidade ou não de mudança do nome da Capital, com a Corte expedindo o rito inerente ao encaminhamento de tais demandas, com manifestação de partes interessadas ou legalmente acostadas, como a Assembleia Legislativa da Paraíba, instituição que agrega representantes do povo, nas suas diversas esferas sociais. Ou seja, vai se tornando irreversível o corolário advindo da ideia-motriz de se dar outra denominação à Capital do Estado da Paraíba, decantada, ainda agora, no carnaval de São Paulo, como ponto extremo oriental das Américas.
Em outras ocasiões, agentes políticos tentaram inserir a mudança do nome da Capital, invocando, inclusive, pretextos de ordem econômica, como o de que a atual denominação não é eficaz para o marketing que possa atrair investimentos e turistas, com isto favorecendo uma divulgação mais ampla das potencialidades aqui existentes e, colateralmente, impulsionando o projeto de desenvolvimento local, cujo reforço seria imprescindível para fazer frente à competição com Estados supostamente mais atrativos da própria região Nordeste, sem falar nos Estados do Sul e Centro-Sul, que historicamente estão mais avançados nos níveis de progresso e bem-estar. O ex-deputado estadual Inaldo Leitão, que foi presidente da Assembleia Legislativa da Paraíba, tentou articular movimento cujo desideratum fosse a escolha de outro nome para a Capital, mas enfrentou fortes resistências partidas dos grupos anti-mudancistas.
O ex-vereador, músico e cantor Flávio Eduardo “Fuba” chegou a constituir agrupamento intitulado “Movimento Paraíba Capital Parahyba”, aglutinando historiadores, jornalistas, artistas, estudantes e educadores, e fez-se mesmo uma coleta de assinaturas para pedir à Assembleia Legislativa que adotasse o plebiscito. Raoni garante que a eventual realização do plebiscito no próximo ano será precedida por ampla campanha de esclarecimenttt e informação à população, com liberdade para a sugestão de nomes pelos integrantes da sociedade. O plebiscito tem tudo para elucidar de vez a pendenga em torno de episódios que ainda geram impacto no âmbito da sociedade paraibana.