Nonato Guedes
O terceiro governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) enfrenta notórias dificuldades para ter maioria, sobretudo na Câmara dos Deputados, a fim de aprovar matérias e projetos do seu interesse. Além do mais, tem sido pressionado pelo Centrão, o agrupamento político fisiológico cujo expoente maior é o deputado Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara. Uma reportagem da revista “Veja” destaca que Arthur Lira está mais poderoso do que nunca e acrescenta que a tática de endurecer com o Centrão, pelo menos nas legislaturas mais recentes, não tem sido um bom negócio, bastando ver o histórico do PT com o bloco. No embate mais grave, o ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, deflagrou o impeachment da então presidente Dilma Rousseff, que ainda provoca sequelas e traumas dentro do petismo.
Numa declaração em São Paulo, Arthur Lira foi enfático ao decretar que o governo Lula ainda não tem força suficiente no Congresso para aprovar as reformas que o país necessita, entre elas, a tributária. Lira afirmou que a reforma administrativa já está pronta para a votação em plenário, mas falta uma base governista ampla para aprovar, por exemplo, a reforma tributária. O parlamentar chamou a atenção para o fato de que a gestão de Lula ainda precisa se estabilizar internamente para assegurar de fato a governabilidade, explicando que, hoje, ela não tem votos, sequer, para enfrentar matérias de maioria simples, quanto mais de quorum constitucional. As afirmações de Lira soaram como uma espécie de alerta urgente ao Palácio do Planalto, mobilizando o próprio presidente Lula a procurá-lo para trocar impressões a respeito das concessões que podem ser feitas para cobrir a retaguarda oficial.
As versões procedentes de Brasília indicam que a decisão do governo de dar prioridade à relação com o Senado estaria ampliando obstáculos na Câmara, comandada por Arthur Lira, onde são decididas matérias prioritárias como Medidas Provisórias e a reforma tributária. Ao se preparar para assumir o Planalto, Lula evidenciou que não pretendia interferir nas eleições para as Mesas da Câmara e do Senado, onde os presidentes Arthur Lira e Rodrigo Pacheco (PSD) externaram desejo de recondução. Calcula-se que com Pacheco a relação seja mais fácil ou mais proveitosa, diante do próprio estilo moderado do presidente do Senado, mas no plenário o governo Lula enfrenta fogo cruzado de senadores alinhados na força-tarefa do bolsonarismo e que se credenciaram nas eleições de 2022, quando o ex-presidente tentou a reeleição contra o petista e logrou ir para o segundo turno, apesar de todo o desgaste, agravado pelo negacionismo em relação à pandemia de covid-19.
“Veja” informa que, ao retornar ao poder, Lula prometeu promover um diálogo republicano com o Congresso e parecia realmente imbuído de não repetir os erros do passado. Depois de pouco mais de dois meses de governo, porém, a tarefa se mostra mais difícil do que parecia, sobretudo no entendimento com o Centrão. Na formação do governo, Lula procurou solidificar alianças dando ministérios a partidos de centro como o PSD, MDB e União Brasil. “mas é tarefa complicada negociar com a bancada dessa última sigla”, diz a revista, exemplificando que nos últimos dias, para evitar esgarçar ainda mais a relação com o União, Lula decidiu manter o ministro Juscelino Filho, das Comunicações, desgastado por irregularidades no recebimento de diárias e no uso de jato da FAB para ir a um leilão de cavalos. O poder de barganha pode até aumentar caso seja formalizada uma federação negociada entre União Brasil e PP. A aliança pode gerar uma bancada de 108 deputados federais, a maior da Câmara, e quinze senadores.
Independente do sucesso da empreitada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já tem pela frente um Super-Centrão, fortalecido durante os anos do governo de Jair Bolsonaro. O orçamento secreto foi barrado no Supremo Tribunal Federal no final de 2022, antes da investidura de Lula na presidência da República, mas o mandatário continua refém da estrutura que foi herdada e tem de se sentar à mesa com um presidente da Câmara mais poderoso do que nunca. Aliados do presidente admitem que é desgastante e constrangedor para ele submeter-se a “chantagens” que estariam implícitas nas pressões sobre ameaça de derrota de matérias importantes para o governo no plenário do Parlamento. Não se pode prever até quando vai durar a instabilidade política do governo Lula III no Congresso Nacional, mas interlocutores da confiança do presidente da República estão atuando intensamente nos bastidores, contando com o apoio de governadores de Estados que são seus aliados, a fim de reverter focos de hostilidade ou de oposição que comprometem a estabilidade política-institucional do país, na opinião dessas fontes.