Nonato Guedes
Embora, formalmente, tenha recuperado direitos políticos que lhe garantem elegibilidade plena a mandatos eletivos, salvo fatores ou decisões supervenientes e/ou excepcionais daqui para a frente, o ex-governador Ricardo Coutinho (PT) parece definitivamente desprovido de fichas para concorrer, por exemplo, à prefeitura de João Pessoa em 2024. Seria a disputa dos seus sonhos, tendo como cabo eleitoral valioso o líder petista Luiz Inácio Lula da Silva na presidência da República, embora, em outra ocasião, o alegado poder de transferência de votos de Lula não se manifestou em prol de Coutinho. Na disputa de 2020, Lula chegou a pedir votos para Ricardo, que era filiado ao PSB, desautorizando, com isso, a candidatura própria do deputado estadual Anísio Maia pelo PT. Ambos – Ricardo e Anísio foram derrotados, este fragorosamente, nas urnas.
Em 2022, Ricardo voltou a ter o aval de Lula, desta feita no projeto de eleger-se a uma vaga ao Senado pela Paraíba, como candidato da coligação firmada com o MDB em torno da candidatura do senador Veneziano Vital do Rêgo ao governo. O vitorioso foi o então deputado Efraim Filho, do União Brasil, que derrotou uma outra candidatura “lulista”, a da ex-deputada estadual Pollyanna Dutra, do PSB, apoiada pelo governador João Azevêdo. O fato de ter protagonizado bola dividida com Pollyanna não elidiu a constatação de que Ricardo se encontrava politicamente desgastado e passara a compor a galeria dos políticos colecionadores de derrotas no Estado. Sem dúvida, um fiasco – mais do que isso, um rude golpe para o antigo líder dos “girassóis” que emergiu como fenômeno político-eleitoral na Paraíba e virou de cabeça para baixo um cenário dominado por esquemas tradicionais que se revezavam no poder.
A última proeza de Ricardo havia se dado em 2018, quando logrou contribuir para a eleição de João Azevêdo ao Executivo e, ao mesmo tempo, infligir derrota, por vias transversas, ao senador Cássio Cunha Lima, do PSDB, que pleiteava a recondução e acabou despontando na quarta posição no confronto. Ricardo investiu fichas na provável eleição do deputado federal Luiz Couto (PT), que logrou ter mais votos do que Cássio, surpreendendo os círculos políticos estaduais. Para se obstinar na estratégia de eleger ao governo João Azevêdo, com quem logo rompeu, e de atuar para defenestrar Cássio Cunha Lima, Ricardo Coutinho abriu mão de candidatar-se ao Senado, apesar da maioria dos prognósticos sinalizar que ele teria votação expressiva, podendo surgir como o mais votado entre os que entraram na raia. Coutinho chegou a alegar a este repórter, no curso da campanha, quando as candidaturas já estavam nas ruas, que não nutria ambição para conviver no ambiente do Senado Federal, o que foi entendido como uma preferência pelo Executivo, embora ele tenha sido vereador em João Pessoa e deputado estadual pela Paraíba.
A súbita vocação por ocupar cadeira no Senado eclodiu quando Ricardo, fora do poder e rompido com o esquema de poder que havia ajudado a eleger, viu-se no centro do furacão em meio às primeiras denúncias sobre a Operação Calvário, envolvendo desvio de recursos da Educação e da Saúde na sua administração, como parte de um esquema criminoso que envolvia organizações sociais de idoneidade duvidosa. Despojado de imunidade política ou parlamentar, Ricardo Coutinho passou a enfrentar processos e acusações como um cidadão comum, tendo sido favorecido até agora devido à protelação do julgamento do caso no Tribunal de Justiça do Estado, em meio a uma febre de “suspeições” para manifestação de juízes, o que ainda agora provocou protestos da parte do desembargador Ricardo Vital de Almeida, relator da Calvário. Mas Ricardo não pode dizer que escapou da punição definitiva, que não se sabe como e quando virá.
Quanto ao desenho de candidaturas a prefeito de João Pessoa em 2024, o que se nota é que Ricardo está sendo atropelado a partir do próprio PT por outros postulantes que ambicionam a indicação, casos ostensivos da deputada estadual Cida Ramos, do ex-prefeito e deputado estadual eleito Luciano Cartaxo e do vereador Marcos Henriques. Tais postulantes lançaram-se como opções diante do espaço vazio quanto à perspectiva de candidaturas próprias e, sobretudo, em face da ameaça de coligação do PT em apoio à candidatura do prefeito Cícero Lucena (PP) à reeleição, o que foi agitado pelo presidente estadual petista, Jackson Macêdo, como uma hipótese a ser examinada, em choque com o pensamento do diretório municipal, tendente ao candidato próprio. Nesse contexto, Ricardo passa a impressão de que não apita nada, senão para tumultuar as decisões internas do Partido dos Trabalhadores na Paraíba. Mas não tem sido o articulador eficiente e respeitado que se mostrou em outros pleitos e que, realmente, deu as cartas na legenda. Debaixo de indefinição partidária e política e sob o guante de iminentes demandas judiciais, Ricardo vai ficando sem fichas no jogo e, com isto, afunilando as próprias chances de sobrevivência no cenário político-sucessório da Paraíba.