Nonato Guedes
O ex-ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, mantém seu cacife em alta em Brasília junto ao ex-presidente Jair Bolsonaro e à cúpula nacional do Partido Liberal, mas continua enfrentando forte queimação na Paraíba, seu Estado de origem, onde pretende lançar-se candidato a prefeito de João Pessoa em 2024. O que se nota é que ele não une o partido nem as forças de direita e nem consegue empolgar fatias expressivas do eleitorado. É que, apesar da visibilidade conquistada no enfrentamento à pandemia de covid-19, em meio a negacionismos e teorias anticientíficas do governo a que servia, o cardiologista não criou, até então, raízes políticas com o seu Estado, do qual se manteve distante, cumprindo outras missões como a de presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia. A rejeição a ele tem muito a ver com a ideia de que Queiroga tenta saltar na política de paraquedas.
Não há críticas ou questionamento à formação profissional de Queiroga, respeitado na sua área, e há reconhecimento de que, apesar de acender velas e incensar o ex-presidente Bolsonaro mesmo quando este cometia heresias, em falas desconexas e propositadamente mistificadoras, como as que recomendaram o uso da cloroquina (sem comprovação científica) para combater a covid-1), o ex-ministro deu partida à campanha de vacinação, sem discriminar Estados ou municípios, fazendo-se operoso, ainda, na aquisição de imunizantes quando a calamidade ameaçou sair de controle. Isto não elidiu o fato de que o governo, quando derrapava para o negacionismo, perdia tempo e foco no desafio maior que lhe cabia, que era exatamente o de conter o alastramento da epidemia e neutralizar suas consequências nefastas. Assim é que a estatística das mortes e dos casos de contaminação tornou-se alarmante no cenário brasileiro, embora seguramente pudesse ter sido evitada.
Do ponto de vista político, Queiroga “corteja” esse território desde que estava no governo, quando foi aconselhado por Bolsonaro a vir se candidatar a um mandato na Paraíba, como parte da estratégia do ex-presidente de espalhar aliados que pudessem defendê-lo, quando estivesse fora do Poder, das críticas, anátemas e processos que sabidamente tinha consciência de estarem reservados para sua nova agenda, como está se sucedendo, inclusive, com o risco de decretação da sua inelegibilidade por oito anos pelo Tribunal Superior Eleitoral. Queiroga submeteu-se à quarentena de ex-ministro sem deixar de articular-se politicamente, tendo se infiltrado junto à cúpula nacional do partido a pretexto de assessorar a ex-primeira-dama Michelle, que preside o PL Mulher. Foi nos gabinetes influentes do Distrito Federal que ele garantiu passaporte para filiar-se ao partido e ter vaga previamente assegurada para disputar cargos à vista, como o de prefeito da Capital paraibana
A sua entrada em cena na conjuntura local é que foi desastrada, provocando reações em cadeia de expoentes do PL e da direita, alguns com broche de deputado, como o federal Cabo Gilberto Silva e o estadual Walbber Virgolino, outros com saldo eleitoral respeitável como o comunicador Nilvan Ferreira, que disputou em segundo turno a prefeitura pessoense em 2020 e foi candidato a governador em 2022. Queiroga foi praticamente imposto pela cúpula nacional, dirigida por Valdemar Costa Neto e com o aval explícito de Bolsonaro, sem consulta aos verdadeiros militantes da direita na Paraíba – aquela turma que pega no pesado e capricha no grito para tentar ganhar espaços num cenário multifacetado, com profusão de pretendentes de toda espécie. Ultimamente, a filiação de Queiroga passou a ser usada como chamariz para atrair novas filiações em todo o país e o ex-ministro aceitou mesmo fazer o papel de garoto-propaganda do PL, ensinando o passo a passo para se converter à sigla valdemaro-bolsonarista. Na Paraíba, as resistências a ele persistem, apesar dos pesares.
O que se diz é que tem faltado a Marcelo Queiroga jogo de cintura para abrir diálogo com as forças de direita e os remanescentes bolsonaristas paraibanos, que surfaram na onda de popularidade do governo decaído em pleitos passados e que ainda dependem dessa “mística” para sobreviverem nas urnas. Logo depois de se filiar ao PL, o ex-ministro da Saúde assegurou que viria à Paraíba empreender um esforço de união das forças políticas insatisfeitas com sua estreia em posição de destaque, na linha de frente da galeria conservadora que luta renhidamente por espaços de poder para compensar a orfandade de que se ressente, tanto no governo federal como no governo estadual e municipal. Não há garantia de cessar-fogo, o que não impede que a cúpula nacional venha a ungir uma candidatura de Queiroga por cima de pau e pedra, desafiando os arreganhos emitidos por bolsonaristas-raiz da Paraíba. Mas é quase certo que essa imposição desencadeará defecções em processo de sangria desatada, enfraquecendo as chances de Queiroga de antagonizar no páreo eleitoral do próximo ano. O preço de vaidades e ambições que estão vindo à tona pode ser muito alto para o futuro do PL, a despeito da propaganda do partido de que deseja crescer na política nacional.