Nonato Guedes
Uma reportagem publicada por UOL e assinada por Leonardo Martins mostrou que o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, omitiu informações sobre privilégios na alocação de recursos obtidos por seu Estado e por outros Estados da região ao defender no último fim de semana a criação do Consórcio Sul-Sudeste para fazer frente ao Norte e Nordeste. O levantamento divulgado revela que o Sul e o Sudeste concentram milionárias emendas parlamentares individuais e de bancadas, o que atesta que Zema gritou de ‘barriga cheia’ ao fazer a reclamação e insinuar, mesmo, uma onda separatista que ainda hoje repercute negativamente no país. Quatro dos cinco Estados que mais tiveram emendas empenhadas em 2023 são, exatamente, do Sul e do Sudeste.
Entre janeiro e agosto deste ano, conforme o UOL, Estados das duas regiões receberam 40% do valor total de dois tipos de emendas parlamentares: individuais e RP7 (bancadas). Os dados foram capturados e tabulados pelo jornalista Luiz Fernando Toledo a partir do Siga Brasil, do Senado. Os valores correspondem às emendas individuais e de bancadas estaduais porque permitem localizar o Estado de destino. Aproximadamente, São Paulo recebeu R$ 1,6 bilhão de emendas individuais e R$ 204 milhões de RP7; Minas Gerais, o Estado de Zema, foi contemplado com R$ 1,3 bi de individual e R$ 184 milhões de RP7. A Bahia, em terceiro lugar, recebeu R$ 1,1 bi de emendas individuais e R$ 97 milhões de RP7. Essas modalidades de liberação de recursos são diferentes do modelo revelado pelo orçamento secreto, instrumento derrubado pelo Supremo Tribunal Federal.
O governador Romeu Zema, que é opositor do presidente Lula (PT) e identificado com o bolsonarismo, afirmou que o Cossud (Consórcio Sul-Sudeste) deve atuar em conjunto para frear prejuízos a esses Estados no Congresso. Na entrevista a “O Estado de São Paulo”, Zema praguejou: “Outras regiões do Brasil, com Estados muito menores em termos de economia e população, se unem e conseguem votar e aprovar uma série de projetos em Brasília. E nós, que representamos 56% dos brasileiros, mas que sempre ficamos cada um por si, olhando só o seu quintal, perdemos. Ficou claro, nessa reforma tributária que já começamos a mostrar nosso peso”. O exemplo de atuação do grupo e o foco das atividades será a reforma tributária, que foi aprovada pela Câmara, mas ainda vai ser analisada no Senado. Para Zema, os Estados do Sudeste sempre vão estar em desvantagem. “Temos feito o mesmo trabalho com senadores de nossos Estados e o que nós queremos é que o Brasil pare de avançar no sentido que avançou nos últimos anos – que e necessário, mas em um limite, de só julgar que o Sul e o Sudeste são ricos e só eles têm que contribuir sem poder receber nada”, enfatizou Romeu Zema, acirrando os ânimos, já que houve resposta veemente do Consórcio Nordeste, liderado pelo governador da Paraíba, João Azevêdo (PSB).
Por razões óbvias, Romeu Zema não quis dar visibilidade ao fato de que Minas Gerais tem 209 municípios que fazem parte do semiárido brasileiro e que, por isso mesmo, têm acesso a uma série de benefícios na obtenção de recursos e financiamentos com juros mais baixos. Municípios e agricultores têm ainda acesso a uma série de políticas públicas como o acesso ao Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste. Para este ano, por exemplo, o orçamento previsto é de R$ 34,6 bilhões. Por lei, o Fundo destina pelo menos metade dos recursos para o semiárido. Os indícios são de que o governador de Minas Gerais agiu de má-fé ao dar partida a uma controvérsia que se pautou pelo lado passional, deixando de encarar com racionalidade a verdadeira situação de configuração dos recursos públicos federais que são destinados para as várias regiões. A suspeita é de que Zema agiu inspirado por motivações políticas, diante do seu interesse em abocanhar o suposto espólio eleitor do inelegível ex-presidente Jair Bolsonaro e credenciar-se para uma disputa ao Planalto em 2026. Só que a sua ofensiva foi considerada uma espécie de “tiro no pé” pelo ataque aos Estados do Norte e do Nordeste.
Em todo caso, vai se firmando o consenso de que a “prova dos noves” deve ser tirada mesmo, no que concerne à distribuição de recursos aos Estados, nas discussões que agitam o Senado envolvendo a reforma tributária. Um ponto desfavorável para Romeu Zema é a mobilização de senadores da bancada nordestina e, também, da bancada da região do Norte, para conter, dentro do Congresso, qualquer orquestração que venha a ser empreendida para favorecer o Sul e Sudeste, nos termos do que tem pleiteado o governador Romeu Zema. Nesse sentido, senadores paraibanos que não são alinhados com o governador João Azevêdo, como Veneziano Vital do Rêgo (MDB) e Efraim Filho, do União Brasil, começam a ser cobrados por segmentos da opinião pública para reforçarem a cruzada encetada pelo presidente do Consórcio Interestadual de Desenvolvimento do Nordeste. O que se diz é que os dois senadores paraibanos foram tímidos na contestação às investidas de Romeu Zema e precisam ser mais afirmativos em defesa da região, colocando de lado divergências políticas e partidárias.