Nonato Guedes
Em meio à polêmica detonada pelo governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo) sobre possível privilégio a Estados do Norte e Nordeste na liberação de recursos públicos federais, discute-se na mídia a representatividade em instituições como o Supremo Tribunal Federal, a mais alta Corte de Justiça do país. Uma reportagem do “Poder360” lembra que está no radar o debate sobre qual deve ser o perfil do próximo ministro a ser indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o STF, com o Planalto sendo pressionado para indicar uma mulher ou um negro, grupos historicamente minoritários no Tribunal. A reportagem alerta, porém, que uma das maiores assimetrias no STF é, também, a origem geográfica dos ministros que o compõem.
Verificou-se, em levantamento feito, que há uma grande dominação do Sudeste e do Sul na composição do colegiado, bem como que essa divisão geográfica aparece, também, no resultado dos julgamentos. A análise de todos os 826 processos propostos por governadores de 26 Estados e do Distrito Federal desde o ano 2000 aponta que os nordestinos tiveram uma taxa de sucesso integral de 59% no Supremo, enquanto governadores do Sudeste foram muito mais bem sucedidos, com 66% de vitórias totais. Em São Paulo, a taxa sobe para 68%, enquanto Pernambuco tem apenas 43% de vitórias em causas que foram demandadas naquela instância. Além do Supremo, o Superior Tribunal de Justiça é igualmente dominado por juízes do Sudeste e do Sul.
“Não se pode dizer que os magistrados estejam julgando levando em conta as suas origens geográficas, mas o fato é que o resultado dos processos mostra que o Nordeste e o Norte têm menos chances de vitória em processos na Corte”, acrescenta a reportagem. A Justiça brasileira nas Cortes Superiores não tem só um déficit de minorias, como mulheres e negros, pois falta também a equidade geográfica. No Supremo, foram feitas 30 indicações desde o retorno do Brasil à redemocratização, sendo 18 ministros do Sudeste (o décimo oitavo é Cristiano Zanin, recentemente nomeado pelo presidente Lula). No Supeprior Tribunal de Justiça, desde 1989, ano de sua implantação, foram 100 indicações: 43 naturais do Sudeste. Quando se observa nos quadros o desfecho de ações propostas por governadores, nota-se que Estados como Pernambuco e Ceará só tiveram taxas de sucesso total no Supremo de 43% e 44% respectivamente.
Na outra ponta, o Estado mais bem-sucedido é o do Mato Grosso, com 79% das ações que propõe ao STF sendo atendidas de maneira integral. Mas o Mato Grosso teve só 24 casos analisados desde o ano 2000 e não é o melhor exemplo. No Rio Grande do Sul, dos 80 processos apresentados, 73% foram vitoriosos por completo no Supremo. Apenas um Estado não teve nenhuma vitória na Corte: o Acre, que propôs somente duas ações nos últimos 23 anos. Na análise da origem do relator das ações dos processos apresentados por governadores nordestinos, constata-se que a taxa de sucesso integral foi maior quando o ministro do STF relator do caso também era do Nordeste – 75%. Quando considerados todos os relatores, essa taxa foi de 58,9%. Ressalte-se, porém, que foram só quatro ações com relatores nordestinos, o que pode dar margem à distorção do resultado na interpretação geral ou mais ampla. Dos 380 indicados ao Supremo desde a redemocratização, 18 nasceram na região mais populosa do país, 60% são sudestinos. Na composição atual da Corte, a representatividade do Sudeste é ainda maior: 7 dos 11 ministros são da região (63,3%).
Os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, ambos do PT, que governaram o Brasil por 14 anos, indicaram, nesse período, 14 ministros para o Supremo Tribunal Federal. O que mais nomeou ministros no Supremo foi o presidente Lula, com nove indicações. Desses, só um (Ayres Britto) era do Nordeste, região na qual o petista tem seu maior eleitorado, como se comprovou ainda nas eleições presidenciais de 2022. Até o final deste ano, Lula irá indicar mais um, no lugar da ministra Rosa Weber, que deixa a Corte no final de setembro. A representatividade do Norte e Centro-Oeste é ainda menor na Corte. Em toda a sua composição, somente dois ministros vieram da região: Gilmar Mendes, que nasceu em Mato Grosso, e Menezes Direito, do Pará.
Atualmente, Nunes Marques é o único nordestino na Corte. O piauiense foi indicado por Jair Bolsonaro (PL) em novembro de 2020, para substituir o assento deixado pelo paulista Celso de Mello e pode ficar até maio de 2047. Os outros nordestinos que passaram pelo STF desde 1985 foram Carlos Madeira, maranhense, indicado por José Sarney, e Ilmar Galvão, baiano, mas que fez carreira no Acre, que foi indicado pelo presidente Fernando Collor de Mello. No caso do STJ repete-se, ainda que um pouco atenuado, o padrão verificado no Supremo em governos petistas. Lula e Dilma indicaram 35 ministros para o STJ, sendo 10 com origem no Nordeste. Quando são considerados os 100 ministros que passaram pelo STJ desde a sua criação em 1989, nota-se que 43 eram naturais do Sudeste. Proporcionalmente, quase metade dos nomeados da Corte tem origem na região mais populosa do país, sendo 19 só do Estado de São Paulo. O Nordeste e o Sul vêm em seguida, com 34 e 16 magistrados respectivamente. O Centro-Oeste e o Norte são as regiões menos representadas no Tribunal, com 2 e 4 ministros, conclui a reportagem do “Poder360”.