Nonato Guedes
Prioridade para o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) diante da necessidade de apoios no Congresso Nacional a projetos oriundos do Executivo, a reforma ministerial empacou nas negociações com partidos do chamado “Centrão” que cobiçam pastas consideradas estratégicas e, teoricamente, imexíveis. Uma reportagem assinada por Lucas Borges Teixeira no UOL revela que as pressões partem de diferentes lados e que o líder petista tem quebrado a cabeça para desagradar menos aos aliados e, com isso, não perder votos. Havia a expectativa de que Lula completasse nesta semana o ingresso do PP e do Republicanos no governo, anunciado em junho. Os deputados André Fufuca, do PP-MA e Sílvio Costa Filho, do Republicanos-PE, foram indicados pelas respectivas bancadas. Mas o presidente não decidiu em que ministérios poderá encaixá-los.
De acordo com a reportagem, Lula não tenciona tirar aliados de primeira hora e, por causa disso, o quebra-cabeça se arrasta há mais de um mês, já tendo o “Centrão” emitido sinais de irritação com a protelação. De um lado, os partidos da ex-base bolsonarista pedem pastas robustas, com acesso a obras e emendas e, também, com visibilidade eleitoral. De outro, os aliados não querem perder espaço e têm resistido às mudanças. Na Câmara, além do arcabouço fiscal, o governo tem Medidas Provisórias importantes a serem votadas, como a do salário mínimo, que caduca no final do mês, e ter essa situação resolvida era o primeiro passo para não haver surpresas indesejadas. Lula tem articulado diretamente com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) e auscultado os partidos, mas o apetite dos novos apoiadores é tido como insaciável e avança, inclusive, por ministérios qualificados como vitrines da gestão petista.
Um exemplo concreto é o Ministério do Desenvolvimento Social, responsável pelo Bolsa Família e o mais cobiçado pelo Progressistas, com ou sem o programa. Além de concentrar todas as ações sociais relevantes do governo, com ótima entrada em prefeituras (situação-chave para 2024, devido às eleições municipais que constam no calendário), o ministério é ocupado por Wellington Dias (PT), ex-governador do Piauí, rival político do presidente nacional do PP, senador Ciro Nogueira, naquele Estado. A saída de Wellington Dias chegou a ser dada como certa no meio da semana, considerando a transferência do Bolsa Família para a Casa Civil ou Gestão e Inovação, mas voltou a subir no telhado por ordem do próprio Lula. Embora a atuação do ministro seja avaliada como “tímida”, o presidente insiste em que os programas sociais fiquem unidos e sob o guarda-chuva do PT. Na quinta-feira, o ministro Rui Costa transmitiu esse recado publicamente, em mensagem dirigida aos novos aliados. Sem nomes a tirar, já está consolidado no Planalto que haverá criação de uma trigésima oitava pasta: o Ministério de Micro e Pequenas Empresas, que acomodaria o Sebrae.
O UOL relata que, aparentemente, nenhum dos dois partidos demonstrou interesse na iniciativa e muito menos os atuais ministros parecem dispostos a trocar de ministério para “tirar um do zero”. Outra hipótese ventilada no Planalto seria a de entregar Portos e Aeroportos, de Márcio França, do PSB, ao Republicanos, depois de ter negado Esportes. Com isso, França poderia assumir o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, ocupado cumulativamente pelo vice-presidente da República, Geraldo Alckmin (PSB) ou fatiá-lo. Por força do vice, ambas as ideias foram abandonadas. Geraldo Alckmin demonstrou insatisfação se tiver que deixar o ministério e o PSB, através do presidente nacional Carlos Siqueira, passou a fazer pressão publicamente. Do lado de França, também há uma razão regional para querer se manter no cargo e rejeitar ir a um novo ministério: no de Portos, ele segue influente em seu reduto eleitoral, a Baixada Santista. Há, ainda, um cálculo político por trás da demora: não parecer que o governo Lula está refém do Congresso Nacional. Como Lula já prometeu as pastas aos dois partidos, ele argumenta não ver pressa para as indicações.
De acordo com o repórter Lucas Borges Teixeira, o cenário de impasse mostra uma intenção do governo em não se mostrar fragilizado tanto em relação à oposição quanto à opinião pública. Conforme interlocutores, é mais uma questão de imagem do que política: segurar as mudanças, mas executá-las, tenta passar a mensagem de que Lula cumpre acordos, só que no seu devido tempo, não no tempo pretendido pelos outros. Com a negativa inicial da Saúde e, agora, do MDS, o PP passou a vislumbrar Ciência e Tecnologia, de Luciana Santos, do PCdoB. Para não perder a aliada, o governo poderia transferi-la para o Ministério das Mulheres, de Cida Gonçalves, mas essa ideia perdeu força pela influência da primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja. Lula tem insistido em manter um corpo ministerial com mulheres e Cida é tida como a ministra mais próxima de Janja. Seja como for, o presidente Lula sabe que terá que pagar faturas políticas em nome da governabilidade. O problema de origem, vale repetir, está numa evidência cristalina: o PT elegeu o presidente da República mas não conseguiu fazer a maioria no Congresso Nacional.