Nonato Guedes
Com todo o respeito a outros interlocutores de menor projeção que estão se oferecendo para mediar um conflito entre o PSB e o PP em torno da eleição municipal para prefeito de João Pessoa no próximo ano, a voz autorizada para chamar o feito à ordem e promover o mínimo de entendimento ainda é o governador João Azevêdo. Não só por se tratar da principal personalidade política do Estado e do PSB mas porque sua liderança é respeitada no bloco que lhe dá respaldo político à frente do Executivo desde o primeiro mandato e porque emanam, dele, as coordenadas para manutenção de uma aliança que até aqui tem dado certo do ponto de vista administrativo e, simultaneamente, dos resultados eleitorais conquistados. Gestos como o do vice-prefeito Leo Bezerra, buscando diálogo com o deputado federal Gervásio Maia, presidente estadual do PSB, somam no contencioso mas não garantem o pacto de coexistência que favoreça a continuidade da composição. Gervásio radicalizou, ontem, dizendo que o PSB não aceita mais cargos na gestão pessoense, de tão cansado que está de esperar melhor tratamento.
É uma questão política delicada que, por isso mesmo, exige habilidade para que não restem fios desencapados pelo meio do caminho, provocando ruídos de comunicação ou estremecimentos constantes, recorrentes, que estão longe de sinalizar no rumo da pacificação. Uma ala do PSB (e nisso Gervásio Maia não está sozinho) reclama, com razão, que o partido tem feito concessões demasiadas não só ao PP como a outros partidos da base. A “Sena acumulada” remonta à campanha eleitoral de 2022, quando os socialistas ambicionavam ter uma boa bancada na Câmara dos Deputados e ficou restrita à reeleição do deputado Gervásio Maia, justamente devido ao sacrifício de outros nomes que tinham notórias aspirações em jogo. Havia uma questão mais importante em pauta – o esforço pela reeleição do governador João Azevêdo e, nesse contexto, foram acomodadas pretensões dentro das condições possíveis de temperatura e de pressão. O fato novo é que João cumpre a sina do segundo mandato, podendo, ou não, concorrer a outros cargos em 2026, e o PSB teme ficar relegado e esvaziado no seu projeto legítimo de crescimento e expansão.
Não é absurdo supor que esta seja uma preocupação compartilhada pela própria cúpula nacional do Partido Socialista Brasileiro, presidida por Carlos Siqueira (PE), a quem incumbe a missão de dar partida para um processo de oxigenação e capilaridade de uma agenda que divide o poder central com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), já por causa da presença ostensiva do vice-presidente Geraldo Alckmin, que acumula o cargo com um ministério estratégico e que não é fonte de problema para Lula – pelo contrário, tem sido um colaborador efetivo e da mais absoluta confiança do mandatário, de tal sorte que Lula percorre o mundo com a tranquilidade que não haverá sobressaltos nem solução de continuidade no funcionamento da máquina. Gervásio, pessoalmente, dá a entender que não deseja passar em brancas nuvens a sua atuação no comando do PSB paraibano, na melhor fase que o partido experimenta, com a eleição e a reeleição de João Azevêdo e com a ascensão deste à presidência do Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável do Nordeste. Os movimentos que ora empreende situam-se na lógica do seu papel de dirigente, a quem cabe fortalecer e ser elemento motivador do espírito socialista entre os correligionários com quem convive.
Todavia, não se espere uma posição de confronto aberto entre o deputado federal Gervásio Maia e o governador João Azevêdo, no sentido de contestar a autoridade legítima do chefe do Executivo perante os filiados da legenda. O que o parlamentar faz é auscultar demandas internas que ganham destaque quando vazam pela imprensa e, ao mesmo tempo, empenhar-se, em cima do mapeamento da realidade política-eleitoral dos municípios paraibanos, para equilibrar posições, de tal modo que não haja predomínio avassalador de agremiações que integram a coligação engajada no projeto chefiado por João Azevêdo. Nesse meio termo, reponta a luta de Maia para credibilizar o PSB no panorama geral das grandes decisões que serão tomadas, até para fazer jus à circunstância de que se trata da legenda do governador, que, inclusive, como é público e notório, moveu céus e terras em quedas de braço com o ex-governador Ricardo Coutinho para voltar a ter lugar de fala dentro do PSB, com quem tem afinidades. Entendimento político se faz com reciprocidade – não há registro, na crônica tradicional festejada, de composições em mão única, que muitas vezes são a porta de entrada para dissidências e, até mesmo, para traições indesejáveis.
Em relação à candidatura do prefeito de João Pessoa, Cícero Lucena, à reeleição, há que ser considerado que não é uma hipótese nova no cenário. Vem sendo agitada desde os primeiros anos da sua nova administração na Capital paraibana, à medida que se intensificaram as suas relações de entrosamento administrativo com o governador João Azevêdo. O chefe do Executivo estadual em nenhum momento aventou a hipótese de substituição do nome de Cícero ou até mesmo de exame de outras alternativas, o que dá a entender, para a opinião pública, que o pacto é para valer e, por assim dizer, irreversível. O dilema está, como se observou, em conciliar o PSB dentro da geléia geral que vi se formando como bola de neve para composições no pleito do ano vindouro. E não há como fugir de uma contestação: pela sua liderança, pelo seu papel, pelo seu prestígio, João Azevêdo é o grande fiador desse processo – para o bem ou para o mal nas urnas vindouras.