Nonato Guedes
Agindo como um enxadrista habilidoso o ex-ministro da Saúde do governo Bolsonaro, Marcelo Queiroga, conseguiu ascender ao comando do Partido Liberal em João Pessoa, com isto ganhando espaço para consolidar o seu projeto de ser candidato a prefeito da Capital nas próximas eleições. A direção nacional, presidida por Valdemar da Costa Neto, oficializou nas últimas horas a destituição do deputado federal Cabo Gilberto Silva da presidência do diretório pessoense e investiu Queiroga em seu lugar, em mais um capítulo da briga interna que vem consumindo as hostes da direita bolsonarista na Paraíba. Cabo Gilberto admitiu que a destituição era esperada, já que ele não tinha mesmo ingerência no diretório da agremiação há muito tempo, deixando de ser consultado ou acatado sobre as decisões, principalmente as que se referem à disputa eleitoral do próximo ano.
Gilberto, que obteve expressiva votação em João Pessoa para a Câmara Federal no pleito de 2022, voltou a culpar diretamente a cúpula estadual do Partido Liberal, dirigida pelo deputado federal Wellington Roberto, com quem alimentou divergências na campanha por não apoiar a candidatura do seu filho, Bruno Roberto, ao Senado. Dentro do PL, o Cabo Gilberto tornou-se expoente de um autodenominado “triunvirato”, formado, ainda, pelo deputado estadual Walbber Virgolino e pelo comunicador Nilvan Ferreira, ex-candidato a governador e ex-candidato a prefeito de João Pessoa em 2020, quando obteve sua melhor performance, avançando para o segundo turno contra Cícero Lucena (PP), que foi o vitorioso. O trio passou a unir forças para contestar a imposição, de cima para baixo, da pré-candidatura do ex-ministro Marcelo Queiroga, que nunca teve militância política-partidária no Estado, mas que demonstrou prestígio ao se filiar ao PL com a presença do ex-presidente Jair Bolsonaro e com honras e deferências das direções nacional e estadual.
Tanto o deputado Cabo Gilberto quanto Walbber Virgolino e Nilvan Ferreira vinham pregando a realização de pesquisas qualitativas e quantitativas como termômetro para indicação de candidatura do PL à sucessão municipal em João Pessoa, tese que não foi abraçada concretamente por Queiroga nem pelas cúpulas, apesar das versões de que não se opunham a qualquer tipo de amostragem. O ex-ministro é respeitado pela sua competência profissional mas, ao mesmo tempo, criticado pela condição de “ilustre desconhecido” na política paraibana, pela sua própria ausência durante muito tempo do Estado e da falta de maior conhecimento sobre a realidade administrativa, especialmente em João Pessoa. Ele tem argumentado, porém, que sua experiência e qualificação para a disputa não podem ser questionadas, tendo em vista que comandou a Pasta da Saúde num dos momentos mais dramáticos da vida brasileira, com o pico da pandemia de covid-19 e que atuou para deter a expansão da calamidade, dando partida a uma maciça campanha de vacinação e a investimentos de emergência para equipar a rede hospitalar pública a fim de atender às demandas. Assegura que teve todo o apoio do então presidente Jair Bolsonaro para efetivar essa “operação de guerra” – embora o ex-mandatário tenha sido execrado pela própria comunidade científica nacional e internacional, acusado de negacionismo diante da gravidade da situação.
Após deixar o Ministério, descendo a rampa do Palácio do Planalto junto com Bolsonaro, que não foi reeleito e perdeu nas urnas para o líder petista Luiz Inácio Lula da Silva, o cardiologista Marcelo Queiroga dedicou-se a uma estratégia para ingressar na atividade política e continuar defendendo bandeiras conservadoras. O primeiro passo foi filiar-se ao PL, a quem já prestava assessoria em temas ligados à Saúde Pública, e isto se deu em Brasília sem qualquer articulação com remanescentes bolsonaristas da Paraíba que carregaram as bandeiras do ex-capitão em duas campanhas eleitorais consecutivas. Posteriormente, Queiroga logrou trazer à Grande João Pessoa a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro para um evento com as mulheres em que se abriu exceção para a sua presença. Michelle foi pródiga em referências e elogios ao ex-ministro da Saúde do governo do marido no evento realizado em Cabedelo, e chegou a se reunir com os membros do “triunvirato dissidente” do PL em João Pessoa, sem, no entanto, comprometer-se com as pretensões deles, admitindo, apenas, relatar versões para conhecimento de Jair Bolsonaro.
De lá para cá, Marcelo Queiroga ganhou desenvoltura, promoveu o lançamento do livro biográfico intitulado “O Homem, o Médio e a Pandemia” e passou a estruturar o núcleo inicial de sua pré-campanha a prefeito de João Pessoa, concedendo entrevistas à imprensa em que aborda teses gerais sobre administração pública e disserta sobre um hipotético projeto administrativo na Capital paraibana que, a seu ver, estaria carente de políticas de gestão mais rápidas e eficientes para acompanhar o próprio crescimento populacional. Essa movimentação de Queiroga ocorre sem diálogo com os remanescentes bolsonaristas, mas com o aval logístico da cúpula do partido no Estado, o que, de algum modo, sinalizou para Nilvan, Cabo Gilberto e Walbber que lhes estava sendo apontada a porta da rua. O trio decidiu pagar para ver e permanecer no PL, mas escanteado das decisões, e já combinou que até dezembro definirá um rumo partidário e a própria candidatura que o grupo vai lançar. Quanto a Queiroga, cada vez mais reforça o cacife junto às cúpulas, sem que isto se traduza, ainda, em votos suficientes para guindá-lo à condição de fenômeno político. Aguarda-se a próxima e, talvez, derradeira rodada de capítulos da autofagia que se apossou das fileiras do PL na Paraíba este ano. Sobre Queiroga, o desafio continua sendo o de demonstrar que tem votos no bestunto e que pode, realmente, protagonizar uma reviravolta no pleito de João Pessoa.