Nonato Guedes
Com Humberto Lucena, já falecido, na presidência do Senado e com quadros como Antônio Mariz e Cássio Cunha Lima como deputados, a bancada federal da Paraíba foi uma das mais atuantes na Assembleia Nacional Constituinte que elaborou a Constituição Federal de 1988, cujos 35 anos foram assinalados neste começo de outubro pela mídia nacional. Foi a segunda Constituição mais longeva na história da República e a terceira na história do país. O senador Paulo Paim, do PT-RS, um dos cinco constituintes que ainda ocupam vagas no Congresso Nacional, disse ao “Congresso em Foco” que, passadas três décadas, a Constituição ainda conta com um amplo potencial dormente de inclusão social, já que muitos compromissos sociais e direitos políticos dependem de regulação para que possam ser plenamente exercidos. Daí ele sugerir que a vigilância deve ser constante, por parte da classe política e das representações da sociedade, para regulamentação de conquistas aprovadas.
Da bancada paraibana, Antônio Mariz, também falecido, obteve Nota Dez na avaliação do Departamento Intersindical de Assessoramento Parlamentar – Diap. Mariz, que morreu no exercício do cargo de governador em 1995, estava filiado ao PMDB, depois de ter tido passagens pelo PTB, Arena e PP. Era membro da Comissão de Soberania e dos Direitos e Garantias do Homem e da Mulher. Foi assim descrito pelo Diap: “Parlamentar de boa formação intelectual, foi o deputado mais bem votado em seu Estado. Na Constituinte, apoiou o parlamentarismo e votou contra o mandato de cinco anos para o presidente José Sarney. Disse sim à participação popular e ao direito de voto aos 16 anos. Nacionalista, disse sim à nacionalização do subsolo e votou a favor da proteção da empresa nacional. Votou a favor do direito de sindicalização para o servidor público e disse sim à reforma agrária e ao tabelamento de juros”.
Além dele, compunham a bancada de deputados da Paraíba Cássio Cunha Lima, que fazia sua estreia na política, Lúcia Braga, Aluízio Campos, Edvaldo Motta, João Agripino Neto, Adauto Pereira, Evaldo Gonçalves, João da Mata e José Maranhão. No Senado, Marcondes Gadelha teve nota final 2,5, Raimundo Lira 5,25 e Humberto Lucena 5,5. Além de presidente do Senado, Humberto Lucena foi o autor da emenda mantendo o presidencialismo como sistema de governo. Lúcia Braga, que foi prejudicada na nota final por ausências decorrentes de problemas de saúde na família, alinhou-se com os progressistas contra o chamado Centrão, que já dava as caras na Constituinte. Ela chegou a protagonizar sérios embates com representantes desse agrupamento fisiológico, colocando-se ao lado de parlamentares como Benedita da Silva, do PT-RJ.
Uma reportagem publicada pelo “Congresso em Foco” lembrou que a Carta-Cidadã, como Ulysses Guimarães a denominou, foi estruturada em um momento de trauma provocado por duas décadas de ditadura militar e elaborada mediante ampla participação da população, resultando em um extenso rol de liberdades individuais, compromissos sociais do Estado e direitos políticos. Paulo Paim ressalta que muitos dos efeitos das inovações constitucionais já podem ser observados e que o principal avanço foi a criação das bases para que pudessem ser instituídos mecanismos de inclusão das mulheres, negros e outras maiorias minorizadas dentro da política, mesmo que em passos mais lentos do que o ideal. Ele argumenta:
– Nossa Constituição tende a um futuro secular. Completa 35 anos, mas espero que ela consiga chegar aos seus 100 anos sem sofrer grandes mudanças. Agora, é necessário entender que simplesmente mexer na Constituição não vai resolver os problemas do país.
Em paralelo ao esforço para avançar com as regulações previstas ao longo do texto da Constituição, também foram aprovadas, até o momento, 131 emendas constitucionais, uma média de 3,7 por ano. O senador petista do Rio Grande do Sul avalia que muitas delas visam ampliar ainda mais os direitos previstos pela Constituição, mas lamenta que não é sempre esse o caso: parte dos esforços para mudar a Carta Magna inclui retrocessos e isto se aplica, por exemplo, à PEC 9/2023, anistiando os partidos que descumpriram as cotas orçamentárias de gênero e raça nas eleições de 2022, a qual enfrentou resistência no Senado. Embora seja considerada uma das mais modernas do mundo, a Constituição brasileira precisa passar por mudanças em um futuro próximo, conforme Paim. O rápido avanço da tecnologia da informação deverá, com o tempo, exigir do Parlamento a inclusão de mecanismos que possibilitem a adequação do mundo digital às garantias estabelecidas no texto. Além de Paulo Paim, também foram constituintes e seguem no Congresso Nacional o senador Renan Calheiros, do MDB-AL, e os deputados federais Aécio Neves, do PSDB-MG, Lídice da Mata, do PSB-BA e Benedita da Silva, do PT-RJ.
Paulo Paim conclui, falando ao “Congresso em Foco”: – Nós avançamos muito, mas entendo que não existe lei perfeita. Eu gostaria de ver novas emendas para ampliar ainda mais os direitos e não para retirá-los. Infelizmente, de lá para cá, em muita pouca coisa nós evoluímos. A Constituição segue com a maioria dos seus artigos sem regulamentação. Quando forem regulamentados, teremos um passo gigantesco em direção ao país que todos nós sonhamos. O texto elaborado tem de tudo que se possa imaginar: fala de combate ao racismo, preconceitos, trata do mundo do trabalho, políticas humanitárias, fortalecimento da democracia. Se ela não for mutilada, ainda vai dar muito brilho ao Brasil pelos próximos cinquenta anos no mínimo. Precisaremos trabalhar para tratar dos efeitos da inteligência artificial, que já faz parte da nossa realidade. O caminho é justamente aceitar a evolução dos tempos, a modernidade, as novas tecnologias e trabalhar em um processo, discutindo com a sociedade brasileira, de adaptação da lei ao século 21”.