Nonato Guedes
Há 30 anos em discussão no Brasil e considerado o principal desafio da agenda econômica do primeiro ano do governo Lula, a reforma tributária (PEC 45/2019) venceu mais uma etapa, ontem, com a aprovação, pelo Plenário do Senado, da proposta em dois turnos de votação, obtendo 53 votos favoráveis e 24 contrários, sem nenhuma abstenção. Eram necessários 49 votos favoráveis e a matéria segue para a Câmara dos Deputados, de onde se originou, depois de ter sofrido muitas modificações no Senado. “A reforma se impôs porque o Brasil não podia mais conviver com o atraso”, comemorou o presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG), acrescentando que a aprovação da proposta mostra que o diálogo é essencial para construir o Brasil do futuro. “O futuro do Brasil está aqui, diante de nós. Estamos abrindo as portas para que ele possa entrar”, salientou Pacheco
A proposta apresentada pelo deputado Baleia Rossi (MDB-SP) ganhou novos contornos nas mãos do relator no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), que incorporou uma série de mudanças. A essência da PEC está na simplificação de tributos e do modelo de funcionamento no país. A Agência Senado informa que o texto prevê a substituição de cinco tributos (ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins) por três: Imposto sobre Bens e Serviços, Contribuição sobre Bens e Serviços e Imposto Seletivo. A proposta igualmente prevê isenção de produtos da cesta básica e uma série de outras medidas. O relator destacou que a proposta não vai representar aumento de carga tributária e que o texto prevê uma “trava” para a cobrança dos impostos sobre o consumo, ou seja, um limite que não poderá ser ultrapassado. Eduardo Braga assinalou: “O contribuinte não pode continuar a sustentar o peso do Estado. Se o receio é que a aprovação da PEC acarrete aumento de carga tributária, temos a convicção de que o modelo garante que isso não ocorrerá”.
No total, o texto recebeu cerca de 830 emendas durante a discussão no Senado, e o senador paraibano Efraim Filho, do União Brasil, disse que foi o que apresentou o maior número de emendas, sempre focado na filosofia de que a carga de impostos deve ser atenuada para que o empreendedorismo possa florescer no país sem amarras. Durante a votação em segundo turno, os senadores rejeitaram destaques apresentados por parlamentares da oposição para limitar a soma das alíquotas dos tributos. Uma das emendas previa o teto de 20%, outra estabelecia um limite de 25%. Um acordo garantiu a aprovação de emenda prevendo a criação de um Fundo de Desenvolvimento para os Estados da Região Norte, a ser criado mediante Lei Complementar. O líder do governo no Senado, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou que a aprovação da PEC é “histórica” e que vai garantir uma redução de tributos para a população mais pobre. Ele ressaltou que o texto prevê alíquota zero para arroz, feijão e outros itens da cesta básica e rebateu críticas da oposição afirmando que governos anteriores apoiavam a reforma tributária, mas mudaram de lado. “A oposição está incomodada porque o brasileiro, depois do governo do presidente Lula, voltou a comer picanha”, alfinetou Randolfe Rodrigues.
Ao agradecer o trabalho do relator, senador Eduardo Braga e dos demais senadores, Rodrigo Pacheco afirmou que o Senado foi capaz de superar as incertezas e as dificuldades do processo e de fazer valer os princípios democráticos, dialogando com toda a sociedade. Para ele, o Senado se dedicou incansavelmente para dar a sua contribuição à reforma, aguardada há mais de três décadas. A mudança nos impostos, de acordo com o presidente do Senado, é qualitativa e não apenas quantitativa. Na opinião de Rodrigo Pacheco, a transparência do novo sistema tem o potencial de alavancar a atração de investimentos estrangeiros para impulsionar o desenvolvimento econômico e a criação de empregos no Brasil. “Além disso, nobres colegas, uma tributação mais justa e equitativa contribuirá para reduzir as desigualdades sociais e promover um ambiente econômico mais equânime para todos os cidadãos”, enfatizou. Também após a aprovação, Eduardo Braga falou sobre o caminho que a PEC percorreu nos 120 dias em que esteve no Senado, em uma discussão que envolveu integrantes do governo e vários setores ouvidos em audiências públicas sobre o tema.
– Chegou o dia de escrever uma nova página da nossa história. Não foi fácil chegar até aqui. Muitos tentaram e acabaram frustrados durante as últimas quatro décadas. Se conseguimos, agora, dar mais um passo importante para entregar ao país um novo sistema tributário, estejam certos de que essa não será uma conquista de uma só pessoa ou de um só governo, mas uma vitória da Democracia brasileira – escreveu o relator. A PEC da reforma tributária foi aprovada na Câmara em sete de julho – ali, ela teve como relator o deputado federal paraibano Aguinaldo Ribeiro, do Progressistas. No Senado, a proposta tramitou unicamente na Comissão de Constituição e Justiça. Mesmo sem fazer parte da tramitação, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) criou um grupo de trabalho, coordenado pelo senador paraibano Efraim Filho, do União Brasil, para subsidiar o relatório de Eduardo Braga na CCJ. O relatório foi apresentado no dia 25 de outubro e o texto foi votado na terça-feira, 7, na comissão. Em Plenário, a votação se deu em calendário especial, que permitiu a votação da PEC em dois turnos em um único dia e sem os sucessivos dias de discussão (cinco sessões em primeiro turno e três em segundo). A expectativa, agora, retorna à Câmara, diante da possibilidade de fatiamento. A esperança é de que o consenso prevaleça no sentido de não prejudicar o consumidor brasileiro com a “orgia tributária” que estava vigorando e que o ex-ministro Maílson da Nóbrega, paraibano, qualificou como “manicômio tributário”.