Nonato Guedes
Prevê-se uma luta encarniçada, no campo da direita paraibana, pelo espólio bolsonarista na campanha a prefeito de João Pessoa, em 2024, opondo o ex-ministro da Saúde do governo decaído, Marcelo Queiroga ao comunicador Nilvan Ferreira. Ambos se enfrentaram preliminarmente pelo controle do PL na Capital e Queiroga levou a melhor, sendo praticamente oficializado pela cúpula nacional como o ungido para disputar a sucessão de Cícero Lucena, além de atrair acenos da parte do ex-presidente Jair Bolsonaro e engajamento da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro em agenda de eventos na Paraíba. Nilvan, que está em vias de anunciar o partido pelo qual aparecerá na urna eletrônica, mantém-se fiel ao legado do ex-mandatário, até como estratégia de sobrevivência, com vistas a capitalizar apoios valiosos de grupos conservadores e, mesmo, radicais de direita.
Ambos dependem, crucialmente, da vinculação com a figura de Bolsonaro e com possíveis reflexos positivos da sua gestão para alavancarem candidaturas num páreo em que o prefeito Cícero, do Progressistas, larga ancorado no apoio de duas máquinas – a que ele pilota e a que é administrada pelo governador João Azevêdo (PSB), reeleito em 2022. Lucena tem muita gordura para queimar na campanha e é beneficiário de um portfólio de obras e investimentos que estão sendo intensificados desde agora e que terão deslanche em grande estilo na fase decisiva propriamente dita do embate eleitoral. É evidente que há focos de desgaste decorrentes de omissão ou vulnerabilidade do poder público em áreas avaliadas como essenciais para a população, mas Cícero tem estado alerta no sentido de suprir essas lacunas, atendendo a pleitos emergenciais e lançando ofensivas pontuais em áreas estratégicas do perímetro urbano pessoense. Por isso mesmo é um candidato respeitado pelos adversários e prepara-se, nos bastidores, para tecer uma ampla coalizão de forças que lhe assegure tempo de televisão e espaços avassaladores para massificar seu projeto de recondução à prefeitura.
O atual prefeito beneficia-se da divisão que estourou no campo da direita conservadora da Paraíba, e da dificuldade da esquerda de avançar na construção de uma candidatura viável, apesar do empenho do Partido dos Trabalhadores em se credenciar no panorama com candidatura própria que é ambicionada pelo deputado estadual Luciano Cartaxo, ex-prefeito por duas vezes, e pela deputada estadual Cida Ramos, ex-candidata a prefeita. Esses obstáculos já ficaram refletidos em pesquisas ou levantamentos informais publicizados na mídia, que apontaram percentuais francamente decepcionantes, quer para Cartaxo, quer para Cida Ramos. Mas ambos apostam numa recuperação espetacular com a evolução do processo e cortejam, em paralelo, o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cuja capacidade de transferência de votos em João Pessoa é sempre problemática, não obstante a popularidade que ele consegue deter à custa do seu prestígio inequívoco. Seja como for, o PT é quem ocupa a margem esquerda, vez que Cícero situa-se numa posição de centro, com penetração em bolsões conservadores, minando, por via de consequência, as chances almejadas tanto por Nilvan como por Marcelo Queiroga.
Em relação ao ex-ministro da Saúde, já tornou público o perfil da sua campanha, que será focado na experiência administrativa adquirida à frente daquela Pasta em momento grave da conjuntura nacional de saúde pública, quando da emergência da pandemia de covid-19, o que o levou a dar partida a uma maciça campanha de vacinação em todo o país, mesmo debatendo-se com a postura negacionista do governo Bolsonaro, a que servia, e que descambou, em determinados momentos, para a leniência ou omissão, sem falar no conflito permanente com governadores de Estados e prefeitos de cidades importantes. Queiroga quer se valer desse currículo para se cacifar na seara da gestão pública e vai focar em propostas que antecipadamente revela serem inovadoras para a evolução de João Pessoa no contexto do Nordeste e da própria realidade do país. Tanto ele quanto Nilvan centrarão fogo na administração de Cícero Lucena e, por tabela, na gestão do governador João Azevêdo, o que vai conferir picos de alta voltagem ao duelo pelo voto capaz de decidir, por exemplo, um segundo turno que venha a despontar no horizonte.
Nilvan Ferreira, em 2024, já não terá o mesmo “élan” de 2020, quando eclodiu como fenômeno disparado nas urnas, tratorando condestáveis da política paraibana como o ex-governador Ricardo Coutinho e o deputado federal Ruy Carneiro e avançando para o segundo turno na peleja contra Cícero Lucena, em que perdeu por causa do rolo compressor adversário e das próprias fragilidades expostas diante de um eleitorado exigente e sequioso por mudanças mais claras e urgentes. Legalmente, o comunicador não terá como massificar imagem de Bolsonaro ao seu lado no Guia Eleitoral, já que o engajamento do ex-presidente será no palanque do ex-ministro Marcelo Queiroga. Mas Nilvan não estará impedido de “bolsonarizar” mais uma vez a sua campanha, contando com reforços como os dos deputados Cabo Gilberto Silva (federal) e Walbber Virgolino (estadual), adeptos de carteirinha do ex-presidente. Teremos uma disputa emocionante – podendo vir a ter, mesmo, lances de dramaticidade, o que é um combustível perfeito para promover engajamentos de eleitores e quebrar a apatia eventual de segmentos refratários. Com as alterações de praxe, o desenho do cenário à vista é o que está aí, representando grandes testes tanto para Cícero quanto para Nilvan, Queiroga e o deputado Ruy Carneiro.