Nonato Guedes
A Paraíba inteira acompanhou a luta titânica do governador João Azevêdo contra o antecessor, Ricardo Coutinho, para assegurar o controle da legenda do PSB. Azevêdo chegou a ficar afastado temporariamente do comando e da própria filiação, buscando refúgio nos quadros do Cidadania, até que protagonizou uma reviravolta na queda de braço com o ex-governador e foi reentronizado em alto estilo com as bênçãos da cúpula nacional, presidida por Carlos Siqueira, coincidindo com o movimento de retorno de Coutinho às hostes do Partido dos Trabalhadores, seu berço político. Nota-se, porém, que Joao Azevêdo não vive uma situação confortável na sigla do vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, sendo abertamente contestado na sua liderança por expoentes com broche de deputado, como o federal Gervásio Maia, que, não por acaso, preside o diretório estadual socialista.
Já são inúmeras as desinteligências – para não falar desentendimentos que a história recente assinalou entre o chefe do Executivo e figuras que, teoricamente, devem obediência à sua voz de comando. Ainda nos últimos dias, Gervásio Maia voltou a botar lenha na fogueira usando como pretexto a disputa pela prefeitura municipal de João Pessoa nas eleições do próximo ano, agitando a bandeira da candidatura própria e renegando a hipótese de apoio incondicional à reeleição do prefeito atual, Cícero Lucena, que é do Progressistas (PP). João reagiu denotando impaciência com o samba de uma nota só em que o tema se transformou e enfatizando, com todas as letras, que Gervásio expressou uma opinião isolada que, nem de longe, traduz o pensamento do colegiado, referindo-se à Executiva. No calor do passionalismo suscitado pelo assunto, em meio à abordagem da imprensa, Azevêdo deixou, inclusive, de mencionar diretamente o nome de Gervásio ou se referir à posição de destaque exercida por ele no seio da agremiação a nível estadual.
Na prática, há um cabo-de-guerra desgastante, que confunde a própria opinião pública. Afinal, quem dá a palavra final no PSB da Paraíba? Qual o verdadeiro grau de influência do deputado Gervásio Maia e, mais ainda, qual o seu nível de articulação com expoentes da cúpula nacional socialista em Brasília, onde muitas decisões são tomadas, ou impostas, à revelia de lideranças regionais e estaduais? Para fontes que são, realmente, próximas de João Azevêdo e lhe demonstram lealdade nos posicionamentos administrativos e político-administrativos, essas questões precisam ser esclarecidas com certa urgência – e cabe ao próprio governador dirimi-las, como estratégia para evitar desagregação nas hostes sob sua chefia. É certo que, por algum tempo, já este ano, outros socialistas paraibanos, que são ligados ao governador, abraçaram o movimento pró-candidatura própria, a exemplo do secretário Tibério Limeira, que preside o diretório municipal em João Pessoa ou a ex-deputada Pollyanna Dutra, que foi candidata ao Senado. Mas suas falas não passaram ideia de radicalização, muito menos de confronto com o reconhecimento da liderança natural de Azevêdo, que se fortaleceu no segundo mandato ao presidir o Consórcio Interestadual do Nordeste e integrar o Conselho da Federação, dividindo mesa com o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.
Já faz algum tempo que o deputado estadual Adriano Galdino, presidente da Assembleia Legislativa do Estado e um dos líderes de destaque do Republicanos, tem alertado João Azevêdo para fazer valer sua posição como um dos maiores líderes da Paraíba na conjuntura atual e impor voz de comando perante liderados, sob pena de vir a ser traído lá na frente, mais precisamente em 2026, quando cogita disputar uma cadeira no Senado Federal, ao lado do deputado federal Hugo Motta. “O governador precisa ter um partido para chamar de seu”, tem repetido Adriano Galdino, dando a entender que o PSB é uma espécie de miríade de interesses onde muitos se julgam donos de espaço e não combinam nem dialogam diretamente com o chefe do Executivo sobre suas ambições pessoais. Azevêdo, que tem Adriano na conta de um colaborador inestimável, atuando, mesmo, como sócio da governabilidade desenvolvida, e que foi capaz de gestos de renúncia na campanha de 2022, quando abriu mão da candidatura a vice-governador para facilitar composições, tem dito que não pretende agir como um “coronel político” e liderar na base da imposição, enfiando goela abaixo de seus aliados esboços e projetos de alternativas para chapas majoritárias – quer em 2024 nos grandes centros, quer em 2026 a nível de disputa estadual.
Para alguns aliados fiéis do governador, o problema não se trata de vestir a camisa do coronel moderno nem ditar regras como se os partidos fossem um comboio de políticos sem consciência crítica e sem direito de participação legítima nas decisões. Mas está em jogo a capacidade do próprio governador construir, em ambiente democrático, compartilhado, o peso da sua liderança política, fazendo-se reconhecido e admirado por um séquito de aliados que ora pontificam no Partido Socialista Brasileiro ora cerram fileiras em partidos considerados “da base de sustentação”, a exemplo do Republicanos e do Progressistas. Se optar pela inação ou pela complacência absoluta, o chefe do Executivo corre seriamente o risco de ser tragado pela voragem dos acontecimentos e de perder espaços valiosos num cenário em que tem emergido como líder triunfante. A escolha final, naturalmente, cabe a João Azevêdo. Mas esta, também, é a hora da verdade para ele definir se cogita, ou não, perseverar na atividade política, onde, até aqui, tem sido bem sucedido. Fora daí, resta-lhe abreviar uma carreira que poderia reservar-lhe, ainda, surpresas extraordinárias no seu currículo.