Nonato Guedes
Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para ocupar a vaga de Rosa Weber no Supremo Tribunal Federal, o ministro da Justiça, Flávio Dino (PSB), iniciou o périplo de conversas com senadores para a sabatina na Comissão de Constituição e Justiça no dia 13 de dezembro. Ex-juiz federal e senador licenciado, sendo um dos mais polêmicos ministros do atual governo, que colecionou inúmeros embates com bolsonaristas, Flávio Dino procura quebrar arestas e fazer acenos a parlamentares de oposição. Numa visita, ontem, ao Senado, onde foi recebido, entre outros, pelo paraibano Veneziano Vital do Rêgo (MDB), ele afirmou que ministro do Supremo não tem lado político e ao mesmo tempo defendeu a harmonia entre os três Poderes, acentuando que “não podemos viver em um país em que haja dissensões ou divergências tais que impeçam o andamento das políticas públicas, das medidas legislativas que o país precisa”.
– E o Supremo Tribunal Federal, como uma instância de segurança jurídica, guardião das regras do jogo, deve ser também esse vetor de harmonia no Brasil. Este é o sentido principal dessa interlocução que eu busco fazer nesse momento entre a política, que eu tenho a honra de integrar, com essa trajetória profissional do Direito e, quem sabe, tendo a honra da aprovação do Senado – prosseguiu Flávio Dino, que foi governador do Maranhão e se elegeu senador em 2022, não descartou a possibilidade de retornar ao cargo no Congresso antes da sabatina e disse que tem “muita tranquilidade, muita serenidade nesse diálogo” com os senadores. “Porque apresento sempre dados objetivos, que são conhecidos de todos, relativos à trajetória profissional no campo jurídico, e tenho uma relação muito próxima do mundo político, porque faço parte dele. Então, estar aqui no Senado é uma alegria, é uma honra e é estar em casa”, salientou. Quanto à oposição ao seu nome, Dino considera que em matérias como essa, de escolha de ministro do STF, “não existe governo, oposição”. Perguntado sobre seu “jeito incisivo”, lembrou que já foi deputado, governador, magistrado e explicou que cada função tem uma característica e tem um estilo.
Ainda: “Esse é um tema do país e quem vai ao Supremo ou pretende ir ao Supremo, evidentemente ao vestir uma toga, deixa de ter lado político. O ministro do Supremo não tem partido, não tem ideologia. Então, no momento que o presidente da República faz a indicação, é evidente que eu mudo a roupa e essa roupa hoje é, em busca desse apoio do Senado, a roupa que se eu mereça essa aprovação é a roupa que eu vestirei sempre”. O relator Weverton (PDT-MA) manifestou apoio à indicação de Flávio Dino e revelou que o ministro da Justiça deve ser aprovado pelo Senado, estimando que ele receba mais de 50 votos no Plenário – são necessários 41 apoiamentos para garantir a aprovação. Dino é o segundo candidato a ministro do Supremo Tribunal Federal indicado por Lula em seu terceiro mandato presidencial. O primeiro foi Cristiano Zanin, aprovado pelo Senado por 58 votos a 18 em junho. Zanin foi advogado de Lula no período em que ele esteve preso na Polícia Federal em Curitiba, respondendo a processos que haviam sido instaurados pelo então juiz Sergio Moro, atualmente senador pelo União Brasil do Paraná. Apesar da ligação de Zanin com Lula, afirma-se nos bastidores que Dino é mais influente junto ao presidente da República, por ter atuado na linha de frente da defesa do governo em episódios como os atos terroristas de 8 de Janeiro em Brasília.
Em 215 anos de existência do Supremo Tribunal Federal, o Senado Federal rejeitou apenas cinco indicados à Corte, entre mais de trezentos. O caso mais emblemático foi o de Cândido Barata Ribeiro, indicado por Floriano Peixoto em 1894, ou seja, ainda no século 19. Se a indicação do ministro para o Supremo for aprovada pelo Senado, Flávio Dino vai herdar a relatoria de ações de interesse do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Entre eles, processos envolvendo o ministro Juscelino Filho, das Comunicações, e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Rosa Weber deixou a Corte em 30 de setembro e seu gabinete tem um acervo de mais de 200 processos. Ela já firmou voto em alguns casos cuja relatoria ficará com o próximo a assumir seu lugar. Neles, seu sucessor não pode alterar o entendimento da ex-ministra. Um dos casos trata da descriminalização do aborto. Rosa Weber votou por permitir a prática durante as doze primeiras semanas de gestação. Nos processos em que a ex-ministra não votou, caberá ao sucessor analisar a matéria e proferir seu voto. Isto se dá, por exemplo, com a responsabilidade de analisar o trecho do último indulto natalino de Jair Bolsonaro que beneficiou pessoas condenadas a penas menores de cinco anos.
A indicação de Flávio Dino para uma vaga no Supremo Tribunal Federal encerrou um período de dois meses de espera pela decisão do presidente – foram 58 dias desde a aposentadoria da ministra Rosa Weber. Embora circule abaixo-assinado contra Dino no STF, que já ultrapassaria 120 mil assinaturas, e haja muito barulho por parte de integrantes do “clã” Bolsonaro e apoiadores do ex-presidente da República, a indicação não deverá ter grandes dificuldades no Senado, de acordo com prognósticos. Um dos filhos de Bolsonaro chegou a desabafar que Flávio Dino irá para o Supremo apenas para “se vingar” do ex-presidente da República. A verdade é que há apreensão entre bolsonaristas quanto às posturas que Dino venha a tomar, consequentemente influenciando outros membros da Corte Suprema. Quanto ao debate sobre as qualidades de Flávio Dino para o posto está superado pela sua própria trajetória nos três Poderes da República. O governador da Paraíba, João Azevêdo, que foi colega de Dino quando este exerceu o governo do Maranhão, exultou com a sua indicação e disse que ela qualifica a Suprema Corte de Justiça.