Nonato Guedes
Por duas vezes, em entrevistas, ontem, à rádio Arapuan, em horários diferentes, o deputado federal Wilson Santiago, do Republicanos, alertou o governador João Azevêdo (PSB) para o risco de traição ou “cristianização” de sua candidatura ao Senado em 2026, caso aceite concorrer a uma das vagas. Sem citar nomes nem mencionar partidos da base aliada, o parlamentar sugeriu que o chefe do Executivo só deve considerar a hipótese de renúncia ao governo para ser candidato se tiver absoluta “segurança” quanto a apoios políticos que sejam fundamentais para o seu projeto, independente da liderança que atualmente detém no cenário estadual como consequência das suas ações executivas e das posições de destaque alcançadas no plano nacional, como presidente do Consórcio Interestadual de Desenvolvimento do Nordeste e integrante do Conselho da Federação, que tem como expoente maior o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.
Wilson Santiago opinou que João Azevêdo deve refletir bastante antes de tomar uma decisão sobre a candidatura a senador, justificando que ele tem compromissos com a Paraíba e que tem correspondido no mister administrativo, especialmente neste segundo mandato, quando se abriram infinitas possibilidades diante do restabelecimento da relação institucional entre o governo federal e o governo do Estado, prejudicada sensivelmente na gestão de Jair Bolsonaro. O deputado do Republicanos referiu-se, também, à performance política do governador, que procura prestigiar os seus aliados e dialogar com os opositores, sempre colocando como prioridade o encaminhamento de demandas de interesse da população paraibana. Na sua opinião, o projeto exitoso que está em andamento não pode ser comprometido por desvios de atitude política lá na frente, e Santiago acredita, mesmo, que o chefe do Executivo está atento e tem se advertido para riscos inerentes ao jogo político.
A fala do deputado Wilson Santiago chamou a atenção pelo caráter incisivo de que se revestiu e, também, porque traduziu um sentimento recorrente entre políticos que se dizem fiéis ao comando do governador João Azevêdo quanto ao “fantasma” do isolamento depois que este deixar o poder e, por via de consequência, os instrumentos de persuasão que são inerentes ao ofício. Tal alerta tem sido abordado, com frequência, pelo presidente da Assembleia Legislativa, Adriano Galdino, também do Republicanos, que se esmerou em aconselhar João Azevêdo a assumir o comando de um partido que possa “chamar de seu”, no sentido de liderar um agrupamento confiável, de forma irrestrita ou incondicional, para as pretensões futuras. Na hipótese de João renunciar para concorrer ao Senado ou à Câmara Federal, a titularidade do governo passa a ser exercida pelo vice-governador Lucas Ribeiro (PP), filho da senadora Daniella Ribeiro (PSD), que, nessas circunstâncias, pode se candidatar à reeleição ao Executivo em outubro de 2026. A aproximação do “clã” Ribeiro com Azevêdo ainda é recente, tendo se estreitado, mesmo, na campanha de 2022, quando Lucas rompeu com os Cunha Lima em Campina e passou a compor a chapa de Azevêdo como vice.
Até então, apenas o deputado federal Aguinaldo Ribeiro, do PP, sinalizava canais de interlocução com o governador João Azevêdo, tendo chegado a ser cogitado para candidatar-se ao Senado na chapa encabeçada pelo socialista em 2022. Aguinaldo surpreendeu e frustrou o esquema de João quando, num evento em casa de recepções em João Pessoa, comunicou o desinteresse em concorrer ao Senado, preferindo arriscar, novamente, uma candidatura à Câmara Federal, da qual emergiu triunfante. A desistência de Aguinaldo em compor a chapa majoritária levou João Azevêdo a ensaiar, às pressas, uma solução alternativa, recaindo a escolha no nome da então deputada estadual Pollyanna Dutra, que se candidatou pelo PSB e que teve votação expressiva nas condições de temperatura e pressão em que concorreu, contra pesos-pesados como o ex-governador Ricardo Coutinho (PT) e o deputado Efraim Filho (União Brasil), este vitorioso com o apoio de deputados do Republicanos, que também votaram em João Azevêdo para o governo. Esse comportamento híbrido do Republicanos foi aceito porque o jogo estava em andamento e os compromissos da legenda presidida por Hugo Motta eram de conhecimento público, mas é evidente que quebrou a unidade do esquema no pleito e confundiu parcelas do eleitorado paraibano.
A senadora Daniella Ribeiro foi praticamente a última do “clã” Ribeiro a se compor com a liderança do governador João Azevêdo, em relação ao qual mantinha posição ostensiva de independência, e naturalmente a escolha do seu filho, Lucas, para vice, influenciou no seu alinhamento pragmático. Do resultado das urnas em 2022 até agora, o “clã” campinense tem procurado manter sintonia fina com o governador João Azevêdo, inclusive, apoiando-o nos embates que trava na Rainha da Borborema com os adversários da atual administração. Não obstante, opera nos bastidores uma formidável rede de intrigas, com ares de orquestração sistemática, a insinuar desalinhamento político futuro. É constante a lembrança do “caso Ricardo Coutinho”, referência ao então governador, que era favorito ao Senado mas enfrentou advertências sobre possível articulação do “clã” Feliciano, representado pela vice-governadora Lígia e pelo marido, deputado federal Damião, para deixá-lo no sereno caso largasse o governo. Ricardo não largou o palácio, nele ficando até o último dia do mandato. Mas é certo que, de lá para cá, não consolidou espaços influentes e perdeu eleições consecutivas. Quanto a João, a dados de hoje, desafiando as “cassandras” e os aliados fiéis, mantém-se pré-candidato a uma das vagas ao Senado, estando a outra reservada, no seu esquema, para o deputado federal Hugo Motta, do Republicanos, conforme enredo anunciado com bastante – e surpreendente – antecedência para os padrões políticos da Paraíba.