Nonato Guedes
Uma reportagem do “Congresso em Foco” revela que Estados controlados por governadores ligados ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), como Mato Grosso, Santa Catarina e Rondônia, reúnem as bancadas que mais votam contra as orientações do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na Câmara Federal. Na outra ponta, liderados por aliados do atual presidente da República, Estados como Piauí, Maranhão e Bahia são os que tem deputados mais fiéis ao Palácio do Planalto nas votações desde o começo da legislatura em fevereiro, incluindo matérias polêmicas como a do arcabouço fiscal e da reforma tributária, que interessavam ao governo. Os dados são de um levantamento do “Radar do Congresso”, ferramenta de monitoramento do “Congresso em Foco”.
Um dos diferenciais do Radar, o “Índice de Governismo” calcula o percentual de vezes em que cada parlamentar votou de acordo com a orientação do líder do governo na respectiva Casa. Ou seja, quanto maior é a convergência, mais alto é o índice de governismo. Deputados de Mato Grosso (45%) e Santa Catarina (48%) votaram em menos da metade das vezes conforme a orientação do governo Lula na Câmara. Terceira bancada mais oposicionista, Rondônia votou em desacordo com o Planalto em 54% das vezes. Os governadores Mauro Mendes (MT) e Marcos Rocha (RO) são da ala oposicionista do União Brasil. Jorginho Mello, de Santa Catarina, é do PL de Jair Bolsonaro. Para o cientista político Humberto Dantas, os dados evidenciam o desafio do sistema eleitoral brasileiro. Ele é diretor do Movimento Voto Consciente e aponta que, muitas vezes, o voto para governador e para o Legislativo convergem em relação ao espectro político. O desafio é a representatividade, uma vez que o voto para presidente, por ser nacional, torna-se “independente” das questões estaduais.
Disse o cientista político Humberto Dantas: “Os dados obedecem a uma lógica do sistema representativo. Estados que elegem governadores desse ou daquele lugar, direita ou esquerda, tendem a representar também no Congresso. Provavelmente votam em parlamentares alinhados com a eleição para governador, o que se verifica, sobretudo, pela forma como os partidos se associam nos Estados”. Ele ainda reforça que cada partido pode apresentar características diferentes em cada Estado, o que não necessariamente quer dizer que ele seja oposicionista. O cientista menciona como caso emblemático o PSD, que, segundo ele, “tem características governistas independente do posicionamento ideológico dos governadores”. O PSD é contabilizado com 85% de “Índice de Governismo” na Câmara dos Deputados e tem, dentre os seus expoentes, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, representante de Minas Gerais, que mantém bom diálogo com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e que tem sido receptivo na colaboração com vistas a manter a governabilidade no Parlamento, evitando-se impasses desnecessários.
A mesma lógica vale para os Estados comandados por aliados do governo. Os três Estados mais governistas são do Nordeste e têm como governadores políticos de partidos que estão na base oficial. O Estado com maior índice de governismo foi o Piauí (93%), cujo governador é Rafael Fonteneles. Logo em seguida vem o Maranhão, administrado por Carlos Brandão, do PSB, com 88%. Em terceiro lugar aparece a Bahia (87%), de Jerônimo Rodrigues, que é filiado ao Partido dos Trabalhadores. São também os Estados de três importantes ministros do governo Lula: Flávio Dino, da Justiça e Segurança Pública, Wellington Dias, do Desenvolvimento Social, e Rui Costa, da Casa Civil. Flávio Dino foi indicado pelo presidente Lula para a vaga da ministra Rosa Weber no Supremo Tribunal Federal e deverá ser sabatinado no próximo dia 13 deste mês. Quanto a Wellington Dias, a sua Pasta esteve ameaçada por causa do fogo cruzado de expoentes do Centrão, que a reivindicavam, mas o presidente Lula foi intransigente e não só prestigiou o titular como manteve intactos os principais projetos que o ministério desenvolve, coordenando, por exemplo, o cobiçado programa Bolsa Família.
A análise pode se estender pelas regiões do país e o resultado no segundo turno das eleições presidenciais de 2022. A região Sul, por exemplo, onde Bolsonaro venceu com folga, possui dois Estados entre os cinco menos governistas – Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A média do governismo na região é de 61%, a menor do país. Em contrapartida, o Nordeste – onde Lula venceu em todos os Estados – é a região mais governista. Além de concentrar os três Estados mais pró-Planalto, teve média de 81,5% de governismo. O Centro-Oeste, outra região onde Bolsonaro venceu em todos os Estados e no Distrito Federal, registrou média de governismo ligeiramente superior à região Sul – 62,75%, sendo a segunda região menos governista. Na região Norte, o governismo foi de 71,1% – apenas Rondônia teve valor inferior a 70% na região. No Estado, Bolsonaro teve mais de 70% dos votos válidos no segundo turno da disputa presidencial. Por fim, no Sudeste, a média de governismo registrada foi de 72,2%, tornando-se a segunda região mais governista na Câmara dos Deputados. Ressalte-se a importância desse levantamento para revelar as tendências políticas dominantes na atualidade no país, como reflexo, ainda, da eleição presidencial de 2022.