Nonato Guedes
Numa entrevista ao jornal “O Globo”, publicada ontem, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, praticamente se excluiu do páreo para a disputa à Presidência da República em 2026 ao assegurar que há consenso dentro do Partido dos Trabalhadores com vistas à candidatura do mandatário Luiz Inácio Lula da Silva à reeleição. Haddad agitou o tema mesmo sabendo que Lula, durante a campanha eleitoral de 2022, repetiu por várias vezes que não concorreria a um outro mandato. Os principais argumentos invocados nesse sentido foram a idade – ele terá 81 anos ao final do pleito de 2026 e a vontade de se aposentar com a primeira-dama Rosângela da Silva (Janja). Uma reportagem do UOL mostra que desde a sua investidura no terceiro mandato, o presidente tem revisto a posição. Haddad foi candidato em 2018, substituindo Lula, que estava preso na Polícia Federal, e enfrentou Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno, mas este foi o vitorioso.
Sobre 2026, Fernando Haddad foi didático: “Acredito que existe consenso dentro do PT e da base aliada sobre a candidatura do presidente Lula. Na minha opinião, é uma coisa que está bem pacificada e, portanto, não se discute”. Depois de salientar que Lula foi três vezes presidente e, provavelmente, será uma quarta, o ministro explicou: “Porque a natureza da liderança de Lula é diferente da de outros fenômenos eleitorais. O bolsonarismo, por exemplo, tem uma dinâmica muito diferente”. Apoiadores de Jair Bolsonaro apostam fichas em que ele voltará a concorrer ao Planalto lá na frente – embora, atualmente, o ex-dirigente esteja inelegível por decisão do Tribunal Superior Eleitoral e que ele tenta reverter a todo custo. Na direita bolsonarista, fala-se ainda no nome da mulher do ex-presidente, Michelle, que promove eventos para o público feminino em diversas Capitais e Estados e na opção Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo, que, no entanto, já demonstrou que não pretende bater de frente com o ex-presidente, de quem foi ministro da Pasta da Infraestrutura. Outros pretendentes mobilizam-se nesse campo ideológico, mas sem a capilaridade eleitoral de Jair Bolsonaro.
O ministro Fernando Haddad revelou que não participa de reuniões internas do Partido dos Trabalhadores, mas assumiu não haver, ainda, um substituto para o caso de Lula não querer mais disputar mandato e que não pensa em ser ele. “Excluído 2026, o fato é que a questão de um sucessor vai se colocar. E penso que deveria haver uma certa preocupação com isso”, pontuou. Internamente, a falta de um sucessor forte é o que mais tem impulsionado Lula a quebrar a sua promessa de campanha de não tentar pleitear outro mandato nas urnas. Além disso, como indica a entrevista de Haddad, conforme análise do UOL, a visão reinante dentro do PT e do Planalto é esta: se a reeleição de Lula é tido como algo praticamente garantido, por que arriscar? Além da incógnita sobre uma candidatura de Bolsonaro, Lula deixou de ter um concorrente dentro do seu grupo – o futuro ministro do Supremo Tribunal Federal Flávio Dino, que até então vinha adquirindo visibilidade como titular da Pasta da Justiça. O vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), que seria potencialmente um rival, não dá sinais de querer assumir confronto com Lula, o mesmo se dando com a ministra Simone Tebet (MDB), que concorreu à Presidência da República em 2022.
Afirma-se que após ter assumido o Palácio do Planalto o próprio Lula alçou diversos nomes no governo a sucedê-lo, mas nenhum despontou, até então, com força ou densidade eleitoral para lhe fazer frente. Textualmente, o presidente declarou o seguinte, em 25 de outubro de 2022, em rede social: “Eu, se eleito, serei um presidente de um mandato só. Os líderes se fazem trabalhando, no seu compromisso com a população”. Quando encerrou seu segundo mandato de presidente da República em 2011, Lula havia triunfado na disputa com o nome de Dilma Rousseff, sua ex-chefe da Casa Civil, que foi apresentada à opinião pública como a “Mãe do PAC”, o Programa de Aceleração do Crescimento que deu grande repercussão à gestão petista. Versões correntes dão conta de que, nos bastidores, aliados muito próximos de Lula chegaram a se movimentar para tentar emplacar um terceiro mandato consecutivo para ele, o que implicaria em mudança na Constituição, a ser procedida através do Congresso Nacional. O próprio Lula sentiu, porém, na época, que eram grandes as chances de desgaste da sua imagem e do Partido dos Trabalhadores. Foi quando passou a admitir um outro nome e, baseado na sua intuição, lançou Dilma Rousseff, que era uma ilustre desconhecida do ponto de vista da disputa eleitoral, embora registrasse militância política na sua biografia. Desde então, Lula vem acalentando uma permanência maior no poder.
A vitória em 2022 teve, para ele, todo o significado de reabilitação política plena, porque veio juntamente com a anulação das condenações decretadas pelo próprio Supremo Tribunal Federal em processos a que o então ex-presidente respondia. Lula procurou se apresentar ao eleitorado como um candidato de união nacional, comprometido com a democracia, que estava sendo destruída diariamente pelo governo de Jair Bolsonaro – e tal mensagem sensibilizou parcelas influentes e possibilitou a ampla “concertação” de que o presidente Lula ainda hoje fala, aglutinando partidos e líderes cansados com a falta de perspectivas da Era Bolsonaro. Sobre o ministro Fernando Haddad, cabe o registro de que ele se sente desconfortável, atualmente, com críticas que lhe são formuladas por dirigentes de expressão do Partido dos Trabalhadores. A presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, tem sido uma das grandes críticas ao modelo econômico, considerado heterodoxo e pouco à esquerda, e são frequentes os desentendimentos entre ela e o ministro. Haddad se defende dizendo que seu modelo não pode ser criticado quando tiver bons resultados e criticado em outros momentos. “Ou tudo está errado ou tudo está certo”, alfinetou. O mediador dos confrontos costuma ser o próprio presidente Lula, interessado em não fragmentar sua base, muito menos o Partido dos Trabalhadores.