Nonato Guedes
O Congresso Nacional sediará na tarde de hoje, em Brasília, uma cerimônia de repercussão para marcar um ano da invasão dos prédios dos Três Poderes da República, intitulado “Democracia Inabalada”, com a presença do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, dos presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados, Rodrigo Pacheco e Arthur Lira, bem como do presidente do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso. O objetivo do encontro, conforme a Agência Senado, é reafirmar a importância e a força da democracia brasileira e restituir ao patrimônio público, de maneira simbólica, alguns itens depredados durante a invasão, que teve adesão ampla de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, inconformados com a sua derrota na tentativa de reeleger-se no pleito de 2022 e com a ascensão de Luiz Inácio Lula da Silva ao terceiro mandato.
São esperados cerca de 500 convidados, dentre eles a ex-ministra do STF, Rosa Weber, que presidia a Corte na época dos ataques, o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, presidentes dos tribunais superiores o procurador-geral da República, Paulo Gonet, governadores, ministros de Estado, secretários executivos dos ministérios, presidentes de estatais e representantes das organizações da sociedade civil como Aline Sousa, integrante do Movimento Catadores do Distrito Federal. Ela entregou a faixa presidencial a Lula durante sua posse em 2023, já que o ex-presidente Jair Bolsonaro fugiu do Palácio do Planalto e recusou-se a cumprir a solenidade de passagem do cargo, com isto emprestando um caráter melancólico ao fim do governo desastroso que comandou e que se caracterizou pelo negacionismo na pandemia da covid-19 e pelos conflitos permanentes com segmentos da sociedade civil, a exemplo de governadores de oposição, segmentos da imprensa, sem falar nos ataques constantes ao Poder Judiciário, tendo chegado a colocar em xeque a segurança das urnas eletrônicas.
Na abertura do ato será executado o Hino Nacional pela cantora e ministra da Cultura, Margareth Menezes. Em seguida, farão uso da palavra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e os dirigentes dos demais Poderes. Encerrando as solenidades, as autoridades do dispositivo principal irão até a entrada do Salão Nobre do Senado para a reintegração simbólica ao patrimônio público de uma tapeçaria de Burle Marx e de uma réplica da Constituição Federal de 1988. A obra de Burle Marx, sem título, foi criada em 1973 e vandalizada durante a invasão dos extremistas ao Palácio do Congresso Nacional em 8 de Janeiro. Após minucioso trabalho de restauração, a tapeçaria voltou ao patrimônio do Senado. Já a réplica da Constituição foi recuperada, sem qualquer dano, após ter sido furtada da sede do Supremo Tribunal Federal também no dia 8 de janeiro. A bancada de oposição ao governo Lula anunciou um manifesto assinado por 30 senadores e encabeçado por Rogério Marinho (PL-RN), que destaca a participação deles no esforço por “uma investigação profunda e independente” dos fatos ocorridos em 8 de Janeiro do ano passado. O texto também condena os atos de violência e a depredação dos prédios públicos, ao mesmo tempo em que atribui o episódio a “falhas” por parte do governo federal para contê-los. Os senadores levantam dúvidas sobre a eficácia das medidas tomadas pelos órgãos da administração que havia tomado posse no dia primeiro e apontam uma suposta incapacidade do Executivo em “antecipar e lidar com situações de potencial desestabilização, o que compromete não apenas a segurança pública mas também a credibilidade das instituições responsáveis por garantir a ordem e a paz social”.
Autoridades do governo Lula e representantes de outros Poderes, entretanto, avaliam que ficou caracterizada uma tentativa de deflagração de um “golpe de Estado” para desalojar o presidente Lula do mandato e, ao mesmo tempo, tentar instaurar um regime autoritário com personagens ligados ao governo decaído de Jair Bolsonaro. Há indícios e há evidências de um planejamento antecipado da articulação para a tomada de assalto do Poder, com a conivência ou omissão do ex-presidente da República, o que está sendo apurado pelo próprio Supremo Tribunal Federal diante da gravidade de que se revestiu a maquinação. O governador da Paraíba, João Azevêdo (PSB), presidente do Consórcio Interestadual de Desenvolvimento Sustentável do Nordeste, que estará na manifestação em Brasília, ressalta que a manobra golpista foi debelada graças à articulação dos setores democráticos empenhados em resguardar valores que apoiadores de Jair Bolsonaro desejavam destruir. O mesmo pensamento é expresso pelo senador paraibano Veneziano Vital do Rêgo (MDB), primeiro vice-presidente do Senado, que estava no exercício da presidência da instituição e que participou das providências iniciais, em Brasília, para fazer frente ao espetáculo de destruição orquestrado pelos simpatizantes bolsonaristas. “O regime democrático saiu fortalecido, contrariando prognósticos das cassandras que apostavam no pior”, resumiu.
O vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, do PSB, estava numa missa em São Paulo quando foi avisado por meio de um bilhete de um assessor sobre a movimentação golpista em Brasília. Ao tomar conhecimento da gravidade dos fatos, antecipou a volta à Capital Federal para reforçar a reação institucional para dissipar os ataques à República. Um ano após o 8 de Janeiro que marcou a História do país, Geraldo Alckmin, em declarações ao jornal “O Globo”, destaca a importância da “resposta firme e rápida” dos Três Poderes para a defesa da democracia e avalia que a polarização política está diminuindo. O tom da necessária vigilância quanto à manutenção da democracia e aos valores básicos da cidadania vai permear os discursos de autoridades, hoje, em Brasília, em paralelo com atos de exorcismo dos fantasmas golpistas que tentam sobreviver, embora francamente isolados junto à maioria da sociedade brasileira, que, no dizer do presidente Lula, está pronta para “assimilar as lições” da intentona golpista.