Nonato Guedes
Apesar dos sinais evidentes, emitidos ontem, de que está se intensificando o “cerco” ao ex-presidente Jair Bolsonaro por parte da Polícia Federal e do Supremo Tribunal Federal, a agenda do ex-mandatário em João Pessoa continua mantida para os dias 16 e 17 próximos, a pretexto de participar do pré-lançamento da candidatura do ex-ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, a prefeito da Capital pelo PL e ao mesmo tempo receber homenagem proposta na Câmara Municipal proposta por um representante bolsonarista. A retenção do passaporte do ex-presidente e os mandados de busca e apreensão, bem como prisões que alcançaram cabeças coroadas do governo decaído provocaram nova espiral de protestos por parte de Bolsonaro e dos seus apoiadores, na linha repetitiva da ameaça às liberdades democráticas, apesar da revelação de provas sobre a articulação de um golpe de Estado que foi intentado, sem êxito, pelos derrotados nas urnas.
A colunista Carolina Brígido, do UOL, analisou que apesar de todo o conjunto probatório elencado pela Polícia Federal contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, até agora ele foi poupado de prisão porque não há, na Corte Suprema, ambiente para ordenar a prisão do líder conservador agora. Para evitar comoção, conforme as versões, o mais provável é que Bolsonaro não seja preso preventivamente antes do fim das investigações. Além de ter o passaporte confiscado, como medida destinada a garantir que não saia do território nacional, ele foi proibido de manter comunicação com outros investigados, tanto assim que o assessor paraibano Tércio Arnaud, que estava em sua companhia em Angra dos Reis, no Rio, foi aconselhado a embarcar para Brasília a fim de manter o distanciamento imposto. Em João Pessoa, partidários de Bolsonaro, não necessariamente eleitores declarados do ex-ministro Marcelo Queiroga, cogitam promover uma grande manifestação de desagravo a ele quando de sua vinda, mas a divisão na direita paraibana e a própria incerteza quanto às próximas medidas a serem tomadas deverão inibir qualquer movimentação concreta nesse sentido.
Fontes ligadas ao Partido Liberal em Brasília externaram, inclusive, ontem, diante dos novos acontecimentos, o receio de que o desgaste sofrido por Bolsonaro com investidas policiais e judiciais possa vir a prejudicar candidaturas do PL nas eleições a prefeito ao invés de beneficiá-las, sobretudo porque o contencioso contra o ex-presidente da República é cada vez mais grave e já não restam dúvidas, entre setores abalizados, de que ele foi mentor de uma orquestração golpista que tinha até minuta e previa a prisão de autoridades, como o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Ou seja, ainda há espaço para que venham a público informações comprometedoras sobre a estratégia que foi acionada pelo ex-mandatário, no exercício da Presidência da República, para incitar o caos social e perturbar o andamento da atmosfera democrática no Brasil, pondo em risco a sobrevivência das instituições. A expectativa é que, nos próximos dias, a Procuradoria Geral da República elenque as provas coligidas contra Bolsonaro e apresente uma denúncia formal contra ele perante o Supremo Tribunal Federal. O mais provável é que os ministros da Corte aceitem a denúncia e instaurem ação penal contra o antecessor de Lula no Palácio do Planalto.
Carolina Brígido revelou que a ação penal inaugura uma nova fase de apurações, com o investigado na condição de réu. Ao fim dessa fase, o caso seria levado a plenário para o julgamento final do ex-presidente da República. Caso seja condenado, aí, sim, poderá ser preso. É pouco provável que a ação penal, se for aberta, seja encerrada antes do fim do ano. Até o momento, o STF julgou apenas executores da tentativa de golpe de Estado. A nova leva de denúncias deve mirar os idealizadores dos atos antidemocráticos. As primeiras condenações culminaram em penas de até 17 anos de prisão e não se espera um tratamento mais brando para os idealizadores dos crimes. O relatório da Polícia Federal foi enfático ao ressaltar que Jair Bolsonaro convocou reunião com a cúpula do seu governo para planejar como seriam disseminadas notícias falsas para descredibilizar o sistema eleitoral brasileiro. Ele também recebeu a chamada “minuta do golpe”. Revisou o texto e manteve a ordem de prisão aos ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, do STF, da mesma forma como sabia que Moraes estava sendo monitorado pelo assessor Marcelo Câmara. A intenção era prender os ministros no dia 18 de dezembro de 2022, antes da posse de Luiz Inácio Lula da Silva como presidente do Brasil.
Os apoiadores bolsonaristas mais ferrenhos, sobretudo políticos que pretendem disputar as eleições municipais este ano tendo o ex-presidente como cabo eleitoral, a exemplo do ex-ministro paraibano Marcelo Queiroga, apostam que qualquer medida extrema que for intentada contra Jair Bolsonaro pode ocasionar reflexos diretamente no pleito, prejudicando candidatos apoiados pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou por governadores que apoiam a gestão petista. “Jair Bolsonaro é a maior liderança conservadora da América Latina e um dos principais líderes desse bloco em todo o mundo”, chegou a afirmar a este colunista o ex-ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, endossado por bolsonaristas que hoje estão “descolados” da sua candidatura a prefeito. Seja como for, caso mantida a programação agendada para João Pessoa na próxima semana, será possível ter-se um termômetro do humor da opinião pública a respeito da continuada polarização política-ideológica no país. O problema é saber se Bolsonaro, já encalacrado com tantos problemas e com a sua inelegibilidade decretada, ainda vai querer pagar caro para ver – e, em consequência, acabar sendo “rifado” do cenário político-eleitoral nacional.