Nonato Guedes
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o mais ilustre fundador do Partido dos Trabalhadores, publicou, ontem, um texto em homenagem aos 44 anos da sigla, criada em 10 de fevereiro de 1980 no Colégio Sion, em São Paulo, como uma alternativa ao sistema partidário tradicional que vigorava no país e que era remanescente da ditadura militar instaurada em 1964 e encerrada em 1985. Na declaração, Lula pediu à militância o retorno da atuação nas ruas para conversar com as pessoas, bem como estimular o combate do “ódio, desinformação e fake news” nas redes sociais. “Aos 44 anos, temos que avançar ainda mais, mas sem esquecer de onde viemos. Retornar às nossas raízes, ao mesmo tempo em que nos renovamos para vencer novos desafios da era digital”, salientou o mandatário, ensaiando um esboço de autocrítica por parte do PT e dos seus militantes.
De acordo com Lula, “é preciso percorrer de novo o Brasil, ocupar as ruas, conversar com as pessoas nos bairros, igrejas, locais de trabalho, movimentos sociais, universidades. Jamais perder de vista a sabedoria do povo brasileiro. Mas é preciso também promover debates nas redes sociais. Combater o ódio, a desinformação e as fake news”, escreveu Lula no “X”, antigo Twitter, acrescentando: “E assim mostrar àqueles que de tempos em tempos anunciam a morte do PT, que nós estamos mais vivos do que nunca, e cada vez mais jovens. Viva o PT e viva a extraordinária militância do PT”. No texto, Lula destacou, ainda, alguns feitos atribuídos ao Partido dos Trabalhadores. “Levamos 22 anos para chegar ao governo e em apenas 13 anos no governo conseguimos o que nenhum outro partido, em qualquer momento da história, jamais foi capaz de realizar”. A presidente nacional Gleisi Hoffmann também usou as redes sociais para dar “viva ao PT” e dizer-se honrada por ocupar o comando da agremiação. “É só gratidão pelos avanços conquistados e garra para continuar. Temos muito a aprender, fazer e batalhar”, manifestou Gleisi Hoffmann.
O presidente Lula lembrou que “no começo, era só um retalho de pano vermelho com uma estrela branca por cima”, mas disse que “por trás daquela bandeira improvisada havia uma determinação muito sólida: mudar a história deste país. E nós mudamos”. Relatou que o PT nasceu enfrentando a ditadura e ajudou o Brasil a vencer a ditadura. O PT cresceu num momento em que o povo não tinha direitos e, com apenas oito anos de existência, ajudou a gravar na Constituição os direitos do povo brasileiro. Também salientou que o PT enfrentou o neoliberalismo, a ditadura do pensamento único, o fim do Estado, a crise financeira de 2008, o golpe e as mentiras, a injustiça e o ódio das elites e nunca se rendeu. “Fizemos o país crescer com inclusão social. Tiramos o Brasil do Mapa da Fome, colocamos o povo pobre no orçamento, na universidade e na vida digna. Aos 44 anos, temos que avançar ainda mais, mas sem esquecer de onde viemos”, reafirmou.
O Partido dos Trabalhadores, inegavelmente, constituiu-se numa experiência singular na América Latina e despertou o interesse de agremiações respeitadas em diferentes partes do mundo, que tentaram, sem êxito, transplantar táticas e estratégias para suas respectivas realidades. A legenda, porém, tem seus pecados e defeitos – e uma dificuldade extrema de fazer mea culpa diante dos desvios de conduta cometidos, a exemplo do mensalão e do petrolão, escândalos que renderam espaços na mídia internacional e que provocaram intervenção do Judiciário para a apuração dos fatos e a responsabilização dos culpados. Passou por tormentas desgastantes como o impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 2016, sob a acusação de prática de “pedaladas fiscais” e de outras irregularidades à frente do governo. Sobre o episódio do afastamento de Dilma, o PT construiu a narrativa de que se tratou de um “golpe”, urdido por políticos e partidos adversários da legenda que se mobilizaram no Congresso Nacional para desgastar a sua imagem. O caso mais grave na trajetória petista, porém, foi mesmo a prisão do seu líder maior, Luiz Inácio Lula da Silva, decretada pelo ex-juiz Sergio Moro, sob a acusação de envolvimento na Operação Lava Jato. Com a ajuda do Supremo Tribunal Federal, Lula conseguiu dar a volta por cima e logrou obter a anulação de provas firmadas contra ele e constantes de inquéritos abertos no âmbito da Operação. Na sequência, teve restabelecidos os seus direitos políticos, após 580 dias recolhido à Polícia Federal, e pôde candidatar-se novamente à Presidência da República em 2022, derrotando por margem apertada o então presidente Jair Messias Bolsonaro (PL).
O PT não está morto, como bem assinalou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas já enfrenta a fadiga da longevidade e, sobretudo, a falta de reciclagem dos seus quadros. Basta lembrar que Lula ainda continua sendo o líder maior, com três eleições à Presidência da República no seu currículo – afora ele, apenas Dilma Rousseff, apresentada ao país como “a mãe do PAC” conseguiu vitoriar, embora demonstrando dificuldade para governar, inclusive, devido à falta de habilidade na relação com a classe política. Em 2018, quando fez um movimento de renovação, lançando Fernando Haddad para ocupar o posto que era cativo de Lula, o PT saiu derrotado e o resultado acabou favorecendo a emergência, no poder, de um dos mais perigosos representantes da extrema-direita no país – Jair Bolsonaro. O futuro do partido passa por eleições municipais, sobretudo nas Capitais, mas o cenário ainda é uma incógnita. De concreto, é possível dizer-se que muito do radicalismo ou do sectarismo que carimbou o PT nos anos iniciais de sua existência já foi varrido do mapa. O PT tornou-se mais pragmático e menos ortodoxo, e isto resume a sua chegada aos 44 anos de atuação na conjuntura nacional.