Nonato Guedes
A agenda que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) irá cumprir hoje e amanhã em João Pessoa, de caráter político-partidário, está sendo encarada entre apoiadores ou liderados do ex-mandatário como um “termômetro” da sua popularidade em terras nordestinas. Como se sabe, nas últimas eleições presidenciais em 2022, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) saiu amplamente vitorioso em Estados do Nordeste, entre os quais a Paraíba, o que reforçou a polarização entre segmentos de esquerda, concentrados nesta região, e de direita, situados no Sul e Centro-Sul do país. Bolsonaro manteve atritos, abertamente, com governadores nordestinos, como o da Paraíba, João Azevêdo, sobretudo na fase de vigência da pandemia de covid-19 quando os gestores tomaram medidas restritivas que desagradaram o grupo da direita encastelado, na época, no Palácio do Planalto. Bolsonaro estava de olho na retração da economia – e é certo que o descontrole econômico desgastou seu único governo, não lhe dando cacife para o segundo mandato.
Oficialmente, Bolsonaro vem a João Pessoa prestigiar o lançamento da pré-candidatura do seu ex-ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, a prefeito de João Pessoa pelo PL, e também receber homenagens na Assembleia Legislativa e na Câmara Municipal, nesta última em clima de tumulto já que, em paralelo com a outorga de um título de Cidadania Pessoense, vereadores de oposição ameaçam lhe entregar o diploma de “persona non grata”, moção que foi proposta e aprovada na Casa, como retaliação por hostilidades supostamente disparadas pelo ex-presidente contra os nordestinos. Na opinião do deputado estadual Walbber Virgolino, a vinda de Jair Bolsonaro “será a cereja do bolo” para a união de todos os conservadores paraibanos com vistas às próximas eleições municipais. A expectativa dos analistas políticos é avaliar se o ex-presidente dará uma efetiva demonstração de força na Paraíba, com a ajuda dos seus apoiadores e simpatizantes, ou se as manifestações constituirão um fiasco, atraindo apenas a “bolha” da direita propriamente dita.
Ressalte-se que os próprios líderes políticos da direita, na Paraíba e no Brasil, estão com uma certa sensação de orfandade em termos de liderança ou de chefia, diante do vasto contencioso que o ex-presidente Jair Bolsonaro enfrenta na Justiça, com acusações graves, envolvendo mais recentemente as que dizem respeito à orquestração de um fracassado golpe de Estado para destituir o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e implantar um regime de exceção, nos moldes do período militar remanescente do famigerado Ato Institucional Número Cinco. Por honra da firma, Bolsonaro ainda é tido na direita como grande referência, mas a verdade é que perdeu muito do seu carisma, da imagem de “mito” que tentou disseminar. Não somente tem sido atropelado por denúncias de irregularidades que estão vindo à tona após sua saída do poder como está disputando territórios, na faixa da direita, com nomes mais articulados, como o do seu ex-ministro da Infraestrutura e atual governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. Faz-lhe concorrência, também, a própria mulher, Michelle, com sua pregação assistencialista e que, de forma recorrente, é lembrada ou citada para concorrer à Presidência da República em 2026.
O fato é que o futuro político e pessoal do ex-presidente Jair Bolsonaro é uma incógnita, para ele mesmo, diante da consequência do volume de acusações levantadas contra ela – a mais grave delas a da inelegibilidade para concorrer a mandatos eletivos em período razoavelmente curto. Essa jurisprudência está praticamente firmada no âmbito do Poder Judiciário, mormente o da esfera eleitoral, mediante a juntada aos autos de uma série de atitudes anti-republicanas cometidas por ele no exercício da suprema magistratura da Nação. No que se refere ao discurso, Bolsonaro adota, hoje, um tom que pretende ser assertivo e contundente mas que já não empolga como antigamente, dado que o próprio ex-presidente foi flagrado em situações embaraçosas ligadas à corrupção e ao abuso de poder, dogmas com cujo combate havia se comprometido, mas que não o foram. A alegada “desconstrução” da imagem de Jair Bolsonaro não pode ser atribuída apenas ao trabalho de desgaste e de combate que lhe é movido, de forma incessante, pelos adversários, como revanchismo pelas suas práticas autoritárias e supostamente deletérias. Em última análise, por palavras, gestos e ações o próprio Bolsonaro terá contribuído decididamente para fazer desabar seu perfil pseudo-moralista, apresentado aos incautos na campanha eleitoral de 2018.
Por todos esses fatores conjugados é que se torna aguardado com expectativa o desfecho da passagem do ex-presidente da República pelo território paraibano, um pedaço do semi-árido nordestino, com o qual ele não criou relação maior de empatia, incorrendo no monumental erro de cálculo de subestimar as inteligências da região e, mais ainda, o potencial de recuperação econômica do Nordeste, que hoje investe com resultados promissores em energias renováveis, deixando de ser um problema para o país para se constituir em parte da solução dos problemas nacionais, tal como advertido, apropriadamente, por especialistas debruçados na análise da realidade nordestina. Bolsonaro, é claro, vai apelar para truques de demagogia a fim de evitar maiores hostilidades nesta região, principalmente, na Paraíba. Mas chega num momento difícil da sua trajetória, desacreditado até mesmo por liderados e sem perspectiva a oferecer em termos de futuro para a própria direita que ele tanto alega cortejar.