Nonato Guedes
O deputado federal paraibano Hugo Motta, do Republicanos, do qual é presidente estadual, seguramente escapou de uma ‘armadilha’ ao decidir, na semana passada, retirar de pauta na Câmara dos Deputados o projeto de lei complementar PLC 40/24, que autorizava bancos a usar automaticamente o saldo de clientes em caso de inadimplência no prazo de até 30 dias após o vencimento e, pior ainda, previa a hipótese de um confisco de até 10% dos valores deputados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) do devedor. Antipática sob todos os pontos de vista, a proposta deu a impressão de atender a lobby das instituições bancárias, entre as quais a Febraban, com evidente prejuízo para trabalhadores que já estão sacrificados na conjuntura brasileira. Motta tentou alegar que o texto foi desvirtuado em postagens da imprensa e nas redes sociais, mas por via das dúvidas preferiu recuar, temendo que a sua própria carreira política ficasse comprometida.
O parlamentar, que já está há quatro legislaturas na Câmara e tem raízes políticas em Patos e no Vale dos Espinharas, tem sido cogitado para concorrer a cargos majoritários em 2026, como, por exemplo, uma vaga de senador ou até mesmo o governo do Estado. Sua trajetória tem sido ascendente em Brasília, tendo alçado do chamado “baixo clero” para o grupo intermediário de parlamentares influentes nas decisões da Casa. Guindado à liderança do Republicanos na Câmara, é lembrado, vez por outra, para disputar a própria presidência do Poder na sucessão do deputado Arthur Lira (PP-AL), embora o seu partido tenha um postulante mais forte, o deputado Marcos Pereira (SP), que é interlocutor privilegiado junto ao Planalto. No passado, Hugo Motta integrou a “tropa de choque” do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ), patrocinador do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT). Chegou a ser socorrido por Cunha quando presidia uma reunião de Comissão estratégica da Casa e sofreu duro bombardeio de adversários do então dirigente do Poder. Baseia sua atuação no encaminhamento e liberação de pleitos de interesse da Paraíba – e mantém postura de independência em relação ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, votando favoravelmente a matérias de acordo com sua consciência.
O projeto de lei complementar 40/24 que Hugo Motta apresentou desencadeou uma onda de protestos de eleitores seus e de outros segmentos, tanto da Paraíba como de outros Estados, com manifestações em emissoras de rádio e redes sociais, numa pressão que alcançou outros parlamentares infensos à proposta. O deputado Mauro Benevides Filho, do PDT-CE, gravou um vídeo alertando para o perigo iminente de apropriação de dinheiro em conta corrente e, sobretudo, prevenindo para o confisco de 10% de valores depositados no FGTS do dono da dívida. O parlamentar questionou o fato de a medida atingir apenas pessoas físicas, incluindo MEIs (microempreendedores individuais) e as chamadas MEs (microempresas), enquanto, no reverso da medalha, as grandes empresas seriam poupadas. Houve requerimento de votação da matéria em caráter de urgência no plenário da Câmara, o que aguçou as desconfianças de outros líderes políticos, como o ex-presidenciável Ciro Gomes, também do PDT do Ceará. A insinuação transmitida foi a de que o dinheiro do cliente poderia ser sacado pelos bancos sem expresso consentimento dele, além do que a dívida do cartão de crédito também poderia ser utilizada para quitação de débitos.
Acossado pela repercussão negativa, que se espalhou, principalmente, na Paraíba, o deputado federal Hugo Motta gravou um vídeo queixando-se da “deturpação” do teor do seu projeto de lei complementar e anunciando, formalmente, a retirada de pauta da matéria, diante da controvérsia que foi provocada e do ambiente de terrorismo psicológico que passou a vigorar entre os pequenos empreendedores. Originalmente, na justificativa do seu texto, o deputado assinalou que o projeto tinha o objetivo de estabelecer medidas visando promover uma “maior competitividade entre instituições financeiras do Brasil” e, em paralelo, facilitar o acesso ao crédito para pessoas físicas. “Além disso – acrescentou o parlamentar do Republicanos – busca mitigar os riscos de inadimplemento e reduzir as taxas de juros, o que é de grande importância para a economia do país e para o bem-estar dos cidadãos brasileiros”. Por fim, aduziu que a matéria passaria, ainda, pelo crivo de outras Comissões importantes da Câmara dos Deputados.
A iniciativa de retirar o projeto de pauta, conforme analistas políticos, indicaria insegurança do próprio deputado federal Hugo Motta quanto aos verdadeiros benefícios da proposta – nesse caso, ele não teria sido assessorado o bastante para fundamentar as razões da sua iniciativa e defendê-la com convicção perante o eleitorado que corteja. O episódio, em todo caso, serviu de lição não apenas para Hugo Motta mas outros parlamentares, em diferentes fóruns, que se apressam a agitar teses e bandeiras na suposição de que elas constituem “achados valiosos” para a promoção política dos seus mandatos, quando constituem verdadeiras bombas de efeito retardado. Parlamentares paraibanos destacaram-se ultimamente por ações proveitosas como Aguinaldo Ribeiro (PP) na relatoria da reforma tributária e o senador Efraim Filho (União Brasil) na luta pela prorrogação da desoneração da folha de pagamento de empresas. Quanto a Hugo Motta, derrapou, e fica devendo ao eleitorado uma contribuição melhor que ateste o seu compromisso com os interesses dos paraibanos e brasileiros.