Nonato Guedes
O adiamento, mais uma vez, ontem, pela cúpula nacional do Partido dos Trabalhadores, de uma definição sobre a posição na disputa eleitoral de João Pessoa, expôs a gravidade da crise enfrentada pelo PT na Paraíba. A legenda, que no passado ensaiou mobilização constante para assegurar protagonismo no cenário local, burocratizou-se no seu comando estadual e deu adeus, irremediavelmente, à busca da unidade como instrumento de fortalecimento para os embates do calendário. Falta “oxigenação” efetiva nas hostes petistas paraibanas, ainda que o diretório municipal em João Pessoa tenha trocado de comando e esteja, hoje, sob a presidência do advogado Marcos Túlio. O PT não consegue se agrupar em torno da bandeira da candidatura própria a prefeito da Capital nem consegue se entender sobre aliança, quer com o prefeito Cícero Lucena (PP), quer com outros virtuais postulantes. Enquanto isso, salta aos olhos o embate interno, opondo parlamentares e militantes com histórico de atuação na agremiação.
Para completar a autofagia interna, a direção nacional insiste em retirar a autonomia de deliberação dos diretórios estadual e municipal, de João Pessoa, quanto ao processo de tática para as eleições deste ano. Havia espaço para um amplo debate sobre a candidatura própria, em condições de reintegrar filiados que se distanciaram das plenárias ou de outros encontros pela falta de perspectiva de poder. Os deputados estaduais Luciano Cartaxo e Cida Ramos, que se apresentaram como interessados na candidatura a prefeito, poderiam contribuir de forma valiosa com o debate, agitando questões internas e externas, ligadas à própria conjuntura nacional. Teriam condições de demonstrar o que pensam da estratégia para fortalecer o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e, por via de consequência, empolgar parcelas do eleitorado com propostas próprias do PT. Em várias Capitais, a eleição de Lula para um terceiro mandato abriu claramente essa possibilidade. Na Paraíba, mais precisamente em João Pessoa, sobreveio o impasse.
Um dos expoentes notáveis do PT paraibano, o ex-governador Ricardo Coutinho, interfere no processo na Capital por controle remoto, já que está baseado em Brasília, onde ele é inteirado das manobras de bastidores que gravitam nas fileiras partidárias. Embora, a curto prazo, não seja opção viável para o projeto político do PT paraibano, inclusive, por ter acumulado duas derrotas consecutivas – a prefeito da Capital em 2020 e ao Senado em 2022, Ricardo ainda é voz respeitada, sobretudo pela interlocução direta que mantém com dirigentes nacionais petistas e com o próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas no seu retorno ao PT, depois de ter perdido a queda-de-braço pelo comando do PSB para o governador João Azevêdo, não acrescentou nada à estrutura petista, limitando-se a dar “pitacos” e valer-se do seu prestígio para inviabilizar alternativas que não lhe agradem na legenda. Esperava-se que Ricardo viesse a João Pessoa para uma atuação proativa nesse processo de definição para o pleito 2024, mas ele optou por ficar na zona de conforto, valendo-se dos recursos tecnológicos disponíveis para se comunicar com os companheiros paraibanos e repassar suas opiniões pessoais.
A verdade é que o Partido dos Trabalhadores na Paraíba é prisioneiro do passado, de uma época em que Ricardo Coutinho eclodiu como uma liderança política emergente e em que os embates eram profundamente acirrados, coerentes com o conglomerado de tendências em que havia se transformado a agremiação fundada no Colégio Sion, em São Paulo, na década de 80, com forte ascendência no movimento sindicalista brasileiro. Em nosso Estado, o PT não investiu na atração de novos quadros e deixou de lado a prioridade de aproximação com a militância, que era quem fornecia o combustível para as batalhas que a legenda iria enfrentar ao longo de sua trajetória. Da mesma forma, não estreitou laços com partidos de esquerda, ficando praticamente isolado ou à deriva em matéria de diálogo sobre questões pontuais e sobre questões gerais que interessariam ao próprio governo do presidente Lula. Os dirigentes petistas – estaduais e municipais, vivem encastelados numa “redoma”, sem desenvolver atividades orgânicas que promovam a discussão de reivindicações que possam ser empalmadas por uma legenda que está aboletada no poder federal. O presidente Lula sente falta desse calor humano nos Estados.
O resultado é que políticos de outros partidos, que compõem a chamada base aliada de sustentação do governo federal no Congresso, mesmo aqueles que integram o Centrão, desfilam pelo Estado com ministros que são seus correligionários e tiram proveito para si de medidas positivas, não necessariamente vinculando-as ao governo do presidente petista. Já houve queixas, nesse sentido, por parte do presidente do diretório estadual, Jackson Macedo, com o argumento de que, infelizmente, esse é o preço pago pelo governo Lula por não ter construído maioria no Parlamento – e que esse preço é indispensável para a chamada governabilidade, ou seja, para evitar derrotas do governo em plenário quanto a matérias que constam de sua plataforma. Está faltando autocrítica urgente a líderes de expressão que exercem influência no Partido dos Trabalhadores. Projeções antecipadas sobre uma cotação de Lula em caso de reeleição não deixam de ser preocupantes, e sinalizam, claramente, que o Partido dos Trabalhadores está divorciado da sociedade.