Nonato Guedes
Uma reportagem do UOL revela que o PSD, fundado por Gilberto Kassab, precisou de apenas 13 anos para ocupar um espaço na política que desde o final dos anos 1980 pertence ao MDB. Partilhando o poder em governos conservadores e progressistas, o partido é visto como baliza para moderar legendas tidas como mais radicais. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (MG) é do PSD, que na Paraíba passou a ser controlado pela senadora Daniella Ribeiro, ex-PP, mãe do vice-governador Lucas Ribeiro e irmã do deputado federal Aguinaldo Ribeiro. Com a ascensão de Daniella ao comando, o PSD perdeu a prefeitura de Campina Grande, segunda cidade mais importante do Estado, tendo em vista que o prefeito Bruno Cunha Lima entrou em divergência e deixou a sigla. Atualmente, Bruno é pré-candidato à reeleição pelo União Brasil, presidido pelo senador Efraim Filho, eleito em 2022.
A reportagem assinada por Wanderley Sobrinho lembra que pela primeira vez desde os anos 1980 um partido ultrapassou o MDB em número de prefeitos. Com a troca-troca de legendas, o PSD saltou de 657 eleitos em 2020 para 1.040, enquanto o crescimento emedebista foi menor: caiu para segundo ao passar de 793 para 916 eleitos. Considerado um “animal político”, Kassab é quem cacifa o PSD para disputar espaço com o MDB. O cientista político Eduardo Grin, da Fundação Getúlio Vargas, comenta: “Ultrapassar o número de prefeitos no Brasil é histórico, especialmente para um partido com 13 anos. E nada indica que o MDB vai recuperar esse espaço na campanha deste ano”. Para Kassab, a polarização política predominante no Brasil ajuda o PSD. É que os políticos que desejam se desassociar de Lula (PT) e Jair Bolsonaro (PL) encontraram guarida no PSD. “O brasileiro tem predileção pela ponderação e entendimento, que são características do centro. Ainda que os polos tenham apoio de 20% do eleitorado, a rejeição a eles costuma ser maior”, afirmou o ex-prefeito de São Paulo ao UOL.
Kassab acrescenta: “Não disputamos espaços. O fortalecimento do centro é importante ao país”. Para ele, a comparação com o MDB chega a ser um elogio. “Queremos consolidar o PSD como uma legenda que propõe e apoia bons projetos, independentemente da origem”. Com tantos prefeitos, a expectativa do partido de Kassab é a de crescer nas eleições deste ano. “O PSD vai aumentar seus quadros este ano e em 2026. O MDB é um partido cansado, idoso e com muitas mágoas do eleitor”, analisa Maria do Socorro Braga, cientista política da UFSCar e do Núcleo de Estudos dos Partidos Políticos Latino-Americanos. Kassab deve manter os holofotes no partido e se manter discreto. Conhecido por sua habilidade política, ele diz que já ocupou quase todos os cargos possíveis. Foi vereador, deputado estadual e federal, vice-prefeito e prefeito de São Paulo. Ocupou, ainda, cargos de secretário municipal, é secretário de Estado e já foi ministro. “Sou realizado com esse currículo. Gostaria de disputar outras eleições, mas não é uma obstinação. Se houver convergência para isso, seria um prazer participar de uma disputa eleitoral. Mas não sou obstinado”, ponderou.
Ele diz que é natural que lideranças que por qualquer razão optem por mudar de legenda vejam no PSD um partido em que se privilegia os bons quadros e o respeito aos compromissos assumidos. “Se for bem este ano, o PSD pode indicar o vice em uma chapa presidencial encabeçada por Ronaldo Caiado governador de Goiás, do União Brasil, ou Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo, do Republicanos, dando verniz de moderação a uma candidatura de direita”, especula Eduardo Grin. O lugar disputado hoje por MDB e PSD na política é tradicional no Brasil. As duas legendas disputam o papel de “partido pivotal”, aquele que, segundo a ciência política, apoia ou faz oposição ao governo de turno a depender de seus interesses. O primeiro partido pivotal nasceu em 12945 e também se chamava PSD. “Como todo partido pivotal, poderia estar ou não com o governo, conforme seus interesses”, reforça o cientista político Carlos Mello, do Insper, que cita uma frase atribuída a Tancredo Neves, um dos líderes do PSD: “Entre a Bíblia e o Capital (livro de Karl Marx), o PSD fica com o Diário Oficial”, em referência à publicação de indicados políticos a cargos na administração. Extinto pela ditadura em 1965, o PSD só ganhou um substituto no período da redemocratização. “O então PMDB assumiu esse papel”, diz Mello. O partido era a vitrine da redemocratização e se transformou na maior legenda brasileira: chegou a eleger 1377 prefeitos em 1982 e 22 governadores em 1986.
Mas a sua popularidade ruiu ao chegar à Presidência da República com José Sarney em 1985. O fracasso do Plano Cruzado, criado em 1986 para debelar a inflação, foi tamanho que o principal expoente do partido, Ulysses Guimarães, terminou a corrida presidencial de 1989 com 4,7% dos votos. Depois do revés, historia a reportagem do UOL, o PMDB passou a usar sua capilaridade para ganhar influência sem manchar a imagem. Nos anos 1990, o ex-presidente tucano Fernando Henrique Cardoso atraiu a legenda para que seu governo formasse maioria no Congresso. O PT faria o mesmo. “Com Lula, o PMDB se acertou depois do mensalão (2005) e cresceu muito”, diz Mello. A sigla continuou governista com Dilma Rousseff, tendo indicado Michel Temer para a vaga de vice no seguindo mandato. “Para esses partidos, é preferível ser vice porque ajuda na eleição do Congresso e ainda leva cargos no primeiro escalão”, diz Grin. Mas o PMDB entrou novamente em crise ao assumir a Presidência da República, perdendo popularidade com Temer e enfrentando escândalos apresentados pela operação Lava Jato. O PSD passou a ganhar desenvoltura e assumir protagonismo, fazendo concessões com governos de plantão. O investimento, este ano, é na eleição de prefeitos de redutos estratégicos, na perspectiva do fortalecimento da legenda.