Nonato Guedes
É indiscutível que o atentado contra o ex-presidente Donald Trump, nos Estados Unidos, enfraquece a democracia, como observou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Além disso, exacerba os “extremismos” políticos-ideológicos num mundo conturbado não apenas por guerras pontuais, mas também por ideologias desagregadoras e retrocessos sem precedentes na história recente em todo o mundo. “Ninguém tem o direito de atirar em uma pessoa porque não concorda com ela politicamente”, definiu o presidente Lula. Trump foi alvejado durante um comício político por um atirador de 20 anos, em episódio que o FBI está tratando como uma tentativa de assassinato. Houve vítimas fatais e as investigações estão tendo prosseguimento para identificar supostas conexões ou outros envolvimentos com o novamente candidato à presidência da República dos EUA pelo Republicanos este ano.
O atentado eclodiu numa fase particularmente dramática para o presidente Joe Biden, do partido Democrata, que está desgastado internamente, com insinuações sobre suposta senilidade e especulações sobre a sua substituição no páreo, embora ele resista a todas as tentativas feitas nessa direção. Biden perdeu pontos há poucos dias quando participou de um debate com Trump, em que demonstrou sintomas de confusão mental sobre as coisas da administração da potência, com isto desencorajando muitos de seus próprios aliados. Trump tem se apresentado na campanha com a retórica beligerante que o caracteriza e com os mandamentos conservadores que pontuaram seu governo. A campanha eleitoral tem um nítido sabor de revanche para o ex-presidente, que não conseguiu se reeleger no confronto com Biden. No Brasil, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), discípulo assumido de Trump, tem explorado o incidente nos Estados Unidos fazendo analogia com a facada que sofreu durante a disputa eleitoral de 2018 por parte de um pseudo-ativista fanático, Adélio Bispo, que se mantém preso. Bolsonaro faz insinuações aleatórias contra a esquerda, segmento que combate ostensivamente, numa estratégia focada, também, na necessidade de reverter a inelegibilidade decretada pela Justiça Eleitoral e que o ameaça retirar do páreo nas eleições de 2026.
Para além da exploração política, que deveria ser evitada mas que é inevitável nas condições de temperatura e pressão vigentes, mesmo, nos Estados Unidos, com a campanha presidencial, paira um fato condenável, que não é nenhuma narrativa parcial. Na história americana, a tentativa de assassinato de Donald Trump no último sábado foi o quadragésimo terceiro atentado do tipo no país. O candidato do Partido Republicano passou a ser o terceiro ex-presidente com maior histórico de ameaças à vida confirmadas, ficando atrás apenas de Bill Clinton e Barack Obama, ambos do Partido Democrata. Entre 1789 e 2024, os Estados Unidos, conforme levantamento da grande mídia, contabilizaram 46 presidentes, com o atual, e o interino Gerald Ford, que assumiu após a renúncia de Richard Nixon em 1974. Dentre eles, 18 foram alvo de uma ou mais tentativas de assassinato, quatro delas bem sucedidas: contra Abraham Lincoln em 1865, James Garfield, em 1881, William McKinley, em 1901, e John F. Kennedy, em 1963. Lincoln e Kennedy foram os casos mais notórios de assassinatos presidenciais nos Estados Unidos. O primeiro governou o país durante a Guerra de Secessão, período em que os Estados do Sul tentaram se separar e formar uma confederação para preservar o regime de escravidão e evitar o regime federativo.
Apesar da vitória da União em 1864, o país nunca conseguiu se livrar do revanchismo sulista, que motivou o assassinato de Lincoln, em 1885, executado pelo ator John Wilkes Booth, simpatizante confederado. Pouco menos de um século depois, John Kennedy, em 1963, foi executado durante sua campanha eleitoral em meio a um desfile em Dallas, capital do Texas. O autor dos disparos foi o militante comunista Lee Harvey Oswald, motivo pelo qual as suspeitas iniciais foram de que o crime teria sido encomendado pelo serviço secreto de Cuba, cujo governo antagonizava com a gestão de Kennedy. Entretanto, investigações posteriores demonstraram que ele agiu por conta própria, movido por ódio pessoal ao presidente e por outras lideranças do governo estadunidense. O governante recordista em lidar com tentativas de assassinato foi Barack Obama, mandatário do país entre 2009 e 2017. Ao longo do mandato, oito tentativas foram interrompidas. A maioria dos atentados era planejada por militantes da extrema-direita, envolvendo os mais diversos métodos, desde disparos de armas de fogo contra a Casa Branca ao envio de cartas contendo explosivos ou substâncias tóxicas.
O atentado sofrido, agora, por Donald Trump, pode ter reflexos no resultado da próxima eleição presidencial, até por causa do desgaste de Biden e da sua vulnerabilidade junto ao próprio eleitorado democrata. O ambiente de radicalização tem tudo para se agravar nos Estados Unidos, fazendo com que as eleições presidenciais naquele país despertem interesse em todo o mundo. Antes do atentado do último sábado, Trump já fora alvo de três tentativas de assassinato – em duas delas, as investigações atribuíram a motivação a doença mental dos autores. A terceira, em 2017, foi encomendada pelo Estado Islâmico durante uma visita à cidade de Manila, capital das Filipinas, onde o grupo terrorista contava com diversas células. Donald Trump continua sendo uma figura polêmica sob diferentes pontos de vista, mas foi confirmado candidato pela Convenção Nacional Republicana, diante da repercussão provocada pelo atentado que sofreu.