Nonato Guedes
É consenso, entre os analistas políticos, que poucas vezes o ex-governador da Paraíba, Ricardo Coutinho (PT) se empenhou tanto pela eleição de um outro candidato a prefeito de João Pessoa quanto agora, na caminhada do deputado estadual Luciano Cartaxo pela legenda petista. É tanto mais surpreendente essa mobilização quando se constata que Coutinho e Cartaxo foram rivais em embates históricos tendo como pano de fundo, exatamente, a prefeitura pessoense. Foi Ricardo, no papel de governador, o mentor de duas candidaturas femininas em 2012 e 2016 – de Estelizabel Bezerra e Cida Ramos, numa estratégia para derrotar Luciano, que inicialmente se compôs com o falecido ex-prefeito Luciano Agra e, depois, com outras forças políticas, logrando sair vitorioso consecutivamente. Cartaxo só perdeu em 2020 quando tirou do bolso do colete o nome da concunhada Edilma Freire, ex-secretária de Educação, para candidata, sendo que a performance dela foi pífia e não conseguiu levá-la para o segundo turno.
A dados de hoje, a tática de Ricardo Coutinho consiste em atrair partidos à esquerda, a exemplo do PSOL, para o bloco de apoio à pré-candidatura de Luciano Cartaxo, desafiando ensaio de pré-candidatura própria ali existente e se intrometendo numa legenda que, como o PT e tantas outras, enfrenta dissensões internas, talvez irremediáveis. No afã de proporcionar musculatura à pretensão de Luciano de voltar ao comando do Centro Administrativo Municipal, já que ainda há relutância da deputada Cida Ramos em apoiá-lo, bem como de dirigentes como Jackson Macedo, presidente do diretório estadual, o ex-governador Ricardo Coutinho invoca o fantasma: o bolsonarismo. Tem argumentado que somente uma candidatura viável à esquerda pode fazer frente e dar combate ao principal representante do bolsonarismo em João Pessoa, que deverá ser o ex-ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, do PL, tendo como companheiro de chapa o pastor-procurador Sérgio Queiroz, do Partido Novo. A alegação é capaz, sim, de sensibilizar segmentos do eleitorado refratários aos remanescentes bolsonaristas e, supostamente, contribuir para a formação de uma frente ampla que daria respaldo ao ex-prefeito da Capital.
Um obstáculo nesse cenário é a situação de favoritismo do atual prefeito Cícero Lucena, do Progressistas, que tem o apoio ostensivo do governador João Azevêdo (PSB), eleitor declarado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva desde o primeiro turno – aliás, um dos primeiros governadores do país a manifestar tal opção para as eleições de 2022, quando Lula ainda saboreava a liberdade que o retirou das dependências da Polícia Federal em Curitiba, onde ficou por 580 dias. Embora o perfil político-ideológico de Lucena não seja de esquerda (ele nunca fez profissão de fé nesse sentido e nunca foi filiado a um partido com tais características), o atual prefeito é perfeitamente admitido no universo de centro-esquerda, diante da sintonia que alega possuir com o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do compromisso já assumido pelo seu filho, deputado federal Mersinho Lucena (PP), de votar em Lula em 2026 se ele for candidato à reeleição à Presidência da República. Essas vantagens de Cícero impedem o plano de Ricardo Coutinho de monopolizar a tendência do movimento lulista na Paraíba ou em João Pessoa e deverão carimbar Marcelo Queiroga como o legítimo representante de Bolsonaro, até porque o ex-presidente já veio prestigiar o pré-lançamento do seu ex-auxiliar na disputa.
As primeiras pesquisas que forem realizadas por institutos especializados e de credibilidade, uma vez cessado o período de realização das convenções partidárias, servirão como termômetro para aferir a liderança inicial do prefeito Cícero Lucena na corrida que se travará na Capital, mas as seguintes poderão ou deverão registrar oscilações que darão à disputa um caráter de acirramento como poucas vezes terá se verificado no histórico dos pleitos locais. O ex-governador Ricardo Coutinho, certamente, não ignora o peso da máquina administrativa pilotada por Cícero e reforçada pela parceria bem sucedida deflagrada com o governador João Azevêdo, praticamente tornando João Pessoa um canteiro de obras nas mais variadas frentes. Como já foi dito em outras oportunidades, a gestão de Cícero na atual temporada, se chegou a enfrentar percalços na fase inicial, até em função, conforme ele, de “heranças malditas” que encontrou, demonstrou uma capacidade de reação e de agilidade que colheu de surpresa os adversários políticos e conferiu-lhe cacife para avançar no confronto que começa a desenhar em relação aos seus antagonistas na peleja de outubro.
Já no que diz respeito a Ricardo Coutinho, o ex-governador não consegue esconder de ninguém qual o seu verdadeiro objetivo por trás da orquestração que o fez se empenhar ardentemente pela unção do deputado Luciano Cartaxo, novamente, como pré-candidato a prefeito de João Pessoa. A meta de Ricardo é credenciar-se na eleição municipal deste ano para carimbar seu próprio passaporte de retorno à disputa política na Paraíba em 2026. O cargo que ele ambiciona não está definido, e é certo que Coutinho se encaixa em qualquer perfil. A desvantagem, para ele, é que o resultado deste ano da eleição poderá ser sua última cartada. Em caso de derrota, reduzirá sensivelmente seu poder de barganha e influência para outras ambições. Para ele, então, o pleito à vista é um “tudo ou nada” na sua tumultuada trajetória política na Paraíba.