Nonato Guedes
Fontes do “staff” político do prefeito de João Pessoa, Cícero Lucena, revelaram que o gestor já extraiu uma grande lição do primeiro debate de que participou, na noite de quinta-feira, na TV Arapuan/Band: os principais adversários dele na disputa eleitoral vão tentar “massacrá-lo” e à sua administração sem dó nem piedade. Esta consciência fará com que nos próximos confrontos o chefe do executivo pessoense seja mais ofensivo, não só na publicidade ampla de feitos e marcos das suas gestões, remontando, inclusive, à primeira, que ele empalmou entre 1996 e 2000, mas, também, ao fogo de artilharia contra oponentes, especialmente o ex-prefeito Luciano Cartaxo, do PT, que exerceu o cargo por dois mandatos consecutivos, e o deputado federal Ruy Carneiro, do Podemos, que participou da administração municipal, chegando a ocupar uma secretaria estratégica na Era Cícero, após a qual fez sua primeira tentativa, sem êxito, de ser prefeito. O ex-ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, do PL, também está na alça de mira, pelo tom crítico a Lucena que adotou no debate, mas o confronto com ele se dará em outro nível.
Cícero percebeu, nos movimentos ensaiados pelos concorrentes e nas falas que produziram, que a disputa na Capital paraibana começa focada no âmbito local, ou seja, na discussão dos problemas de João Pessoa e no questionamento de falhas ou omissões que tenham sido praticados nos últimos anos. Há, de forma visível, da parte do deputado Luciano Cartaxo e do deputado Ruy Carneiro um sentimento de revanche alimentando o tom de suas intervenções contra Cícero Lucena. Ruy busca um acerto de contas, até porque foi derrotado por Cícero em 2020, ficando em terceiro lugar, abaixo de Nilvan Ferreira, que então despontava como fenômeno e que concorreu inicialmente pelo MDB, só mais tarde alinhando-se e desalinhando-se do bolsonarismo. Cartaxo não perdoa Cícero por tê-lo derrotado na mesma disputa, através da sua candidata e concunhada, a professora Edilma Freire, na época apresentada pelo próprio Luciano como protagonista de uma “revolução silenciosa” na Educação – apelo que não teve impacto do ponto de vista eleitoral no sentido de alavancar a postulante. A linguagem agressiva utilizada por Luciano no debate mediado pelo jornalista Luís Tôrres foi indicativa da sede de vingança que ele carrega em 2024.
Na verdade, apesar de ter sua própria identidade, mercê da militância política em João Pessoa que passou por mandatos de vereador, prefeito, vice-governador e deputado estadual e teoricamente apresentar-se com bom perfil de administrador, Luciano Cartaxo é “monitorado” nos bastidores por um outro ex-prefeito pessoense e adversário figadal de Cícero – o também ex-governador Ricardo Coutinho. Foi Ricardo quem articulou, internamente, dentro do Partido dos Trabalhadores, toda a engenharia que possibilitou que Cartaxo fosse ungido candidato com o apoio da direção nacional da legenda, atropelando os diretórios municipal e estadual, cujos dirigentes, se não ficaram desmoralizados, saíram profundamente chamuscados do processo, sem qualquer ingerência na tomada de decisões sobre candidatura. Restou provado, no imbróglio interno do PT paraibano, que Ricardo é a grande eminência da agremiação, com linha direta junto ao presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. Luciano sofria restrições de setores petistas ortodoxos porque fugiu do partido em pleno estouro do escândalo do mensalão, alegando interesse de se resguardar e não ser contaminado com os respingos do episódio.
Ricardo apostou fichas em Cartaxo pela possibilidade de manobrar os seus passos como candidato do PT a prefeito em 2024 e, em caso de vitória, reconquistar seus próprios espaços para disputar, provavelmente, o governo do Estado, que já ocupou por duas vezes, ou, então, outro mandato que esteja no cardápio eleitoral para 2026. Esse retorno em alto estilo após o ostracismo experimentado pelo seu envolvimento em denúncias da chamada Operação Calvário, versando sobre desvios de recursos da Educação e da Saúde do Estado, é o troféu que Ricardo mais aspira, depois de ter acumulado, também, duas derrotas em eleições recentes – a prefeito de João Pessoa em 2020 e ao Senado em 2022. Ricardo e Cartaxo tiveram divergências no passado – e a alguns analistas pareceu que os horóscopos de ambos jamais iriam combinar algum dia. Mas a dinâmica política aproximou-os a tempo de dividirem o guarda-chuva do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ambos estão juntos e misturados, inclusive, pela presença da esposa de Ricardo, Amanda Rodrigues, na chapa de Cartaxo como candidata a vice. O contencioso que havia ficou mesmo no passado – e ninguém ignora a capacidade de Ricardo Coutinho como grande estrategista político, sobretudo quando não é ele que está, diretamente, na linha de frente dos embates.
Tem muita munição para vir a público na campanha eleitoral que só agora está dando as caras. Mas os primeiros passos indicam que não há perspectiva de uma polarização ideológica entre lulistas versus bolsonaristas em João Pessoa, mas, sim, a perspectiva de um plebiscito das gestões de Cícero Lucena, contra a qual investirão com força ou intensidade, principalmente, os candidatos Luciano Cartaxo e Ruy Carneiro, mas, também, o ex-ministro Marcelo Queiroga, que não tem qualquer afinidade com Cícero. Será inevitável que o governo João Azevêdo, parceiro de Cícero, entre no pacote das próximas intervenções, em nome da sobrevivência política condicionada à tática do ataque buscada incessantemente pelos anti-ciceristas. A consciência sobre o “massacre” que está desenhado levará Cícero a uma posição mais contundente, que terá que ser dosada com a publicidade dos feitos de governo. Esta é a receita que constitui seu grande desafio para manter posição de favoritismo no páreo na Capital paraibana.