Nonato Guedes
O Partido dos Trabalhadores (PT) resolveu editar ‘cartilhas’ que servem como bússola para auxiliar seus candidatos a prefeito e a outros cargos eletivos, este ano, em temas delicados na área da segurança pública, além de procurar “facilitar o diálogo com os evangélicos”, segundo revela uma reportagem do UOL. A reportagem destaca que estes são dois pontos bastante sensíveis para os partidos de esquerda, lembrando que como candidato o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não só perdeu entre os evangélicos em 2022 como o seu governo segue sendo bastante mal avaliado por esse segmento. Já a segurança pública é a área que coleciona maior volume de críticas, diante do aumento da criminalidade e de polêmicas que agitam e dividem a sociedade sobre liberação, ou não, de drogas.
O texto elaborado pelo partido traz propostas gerais de melhoria no tema da segurança pública, tido como um dos mais relevantes para a disputa municipal, tentando dar a ele um “rosto petista” com mais foco em prevenção e estímulo a políticas públicas adjacentes do que à repressão e ao aparelhamento armado do Estado. Já a cartilha voltada aos evangélicos é uma espécie de guia contra preconceitos e estereótipos. O documento oferece uma série de dicas sobre o que fazer e o que não fazer, incluindo não tratar cristãos “como se fossem todos iguais” ou como “fundamentalistas”. Com Lula no poder, o partido ambiciona multiplicar o número de prefeituras e voltar a governar capitais, embora pesquises feitas sinalizem que são remotas as chances de candidatos petistas em algumas metrópoles. Em São Paulo, mesmo, o partido teve que abrir mão de uma candidatura própria e se compôs com a do deputado federal Guilherme Boulos, do PSOL. Os documentos fazem parte da estratégia de ampliar a ocupação de espaços e compõem uma série de cartilhas elaboradas pela Fundação Perseu Abramo, que é vinculada ao partido.
O texto foi escrito por militantes evangélicos e o principal objetivo da cartilha, de acordo com os expoentes da legenda, é fazer a ponte entre os candidatos, em especial os não protestantes, e os eleitores cristãos. Uma das principais preocupações do partido, conforme o UOL, é a falta de tato com que muitos militantes tratam religiões evangélicas. A avaliação é que, com a popularização das igrejas neopentecostais, em especial na periferia, os quadros petistas foram se afastando cada vez mais desse público e estereotipando sua imagem. As dicas constituem, então, um guia prático para evitar gafes e endossos a preconceitos. “Esse texto visa apoiar o diálogo, trazendo alguns conhecimentos sobre a nossa visão de mundo (evangélica) e sugestões de abordagem”, explica o conteúdo. No capítulo sobre o que fazer, recomenda-se valorizar a fé e a liberdade religiosa, bem como defender sempre a verdade e defender os direitos humanos. Sobre o que não fazer: exagerar em falar no nome de Deus, associar críticas a pastores e crentes à sua fé, tratar os evangélicos como se fossem todos iguais, tratar todo evangélico como fundamentalista e rejeitar as possibilidades de compreender o mundo a partir de interpretações bíblicas.
“Ainda que haja vários evangélicos conservadores, os moralistas, não convém unificá-los sobre esse tipo de classificação, muito menos de fundamentalistas”, adverte um trecho da cartilha evangélica do Partido dos Trabalhadores. Outra fragilidade associada à esquerda é na área da segurança pública, na qual o governo do presidente Lula sofre muitas críticas. Na cartilha, o partido busca estimular mais a prevenção do que a repressão e o aumento do efetivo policial. A cartilha preconiza melhoria na iluminação das ruas, aumento da segurança escolar e da guarda civil, além de apoio à Patrulha Guardiã Maria da Penha, contra violência doméstica. O documento não descarta ainda a instituição de guardas civis armados. “Quem deve estabelecer é o prefeito”, diz o texto. Sugere, ainda, que investir em outras áreas serve para a segurança. Como exemplo, cita investimento em escola em tempo integral, promoção de ações de zeladoria, fortalecimento de “redes de atenção” a crianças, adolescentes e minorias e estímulo à ocupação do espaço público. Igualmente é proposta a criação de um Fundo Municipal de Segurança, com verba definida para alimentar os programas.
– Investir e apostar na prevenção como um caminho para se evitar os mais diversos tipos de violências não significa desconsiderar as ações repressivas quando necessárias – argumenta um outro trecho da cartilha editada pelo Partido dos Trabalhadores. Esta iniciativa tomada por órgãos consultivos do Partido dos Trabalhadores é um indicativo do processo de mudança de postura resultante de debates internos que estão sendo aprofundadas entre os líderes petistas e os filiados da base, com vistas não somente a recuperar o entusiasmo da militância, que nos últimos anos foi reduzida e se afastou das campanhas petistas, mesmo as presidenciais, mas com o propósito, também, de demonstrar reciclagem do partido perante os temas que estão no radar da opinião pública na atualidade. Há uma constatação de que foram operadas transformações substanciais no interior dos movimentos civis organizados e que há uma necessidade urgente do Partido dos Trabalhadores de se informar sobre as pulsações que estão na ordem do dia e, consequentemente, adequar linguagem e propostas a serem apresentadas à discussão e ao julgamento do eleitorado. Os próprios candidatos às eleições deste ano são orientados a reformular conceitos e perfis, inserindo-se na dinâmica transformadora que foi experimentada há pelo menos uma década no país, sob pena de o PT ser considerado “envelhecido” para a atual conjuntura vigente.