O ex-senador paraibano Marcondes Gadelha revelou, em depoimento, ter ficado “impactado” com a morte do apresentador Sílvio Santos. Ele foi candidato a vice-presidente da República na chapa encabeçada por Sílvio, nas eleições de 1989, que acabou sendo impugnada pelo Tribunal Superior Eleitoral a pretexto de não atender a requisitos legais. A candidatura de Sílvio provocou um abalo na disputa, ameaçando o favoritismo de Fernando Collor de Mello, que acabou eleito, e provocou movimentos de diversas frentes – empresariais, políticas e jurídicas para inviabilizá-la.
“Sílvio era, para mim, mais do que um amigo fraterno. Era um exemplo. Um modelo, um ícone, tantas e tamanhas eram as virtudes que ornavam a sua personalidade. Nos aproximamos em 1989, quando ele, entre outros nomes sugeridos, escolheu o meu como companheiro de chapa para a campanha presidencial daquele ano. Enfrentamos uma resistência obstinada e duríssima, contra o registro da candidatura, que acabou não acontecendo pela razão muito simples de que, nas urnas, ele seria imbatível. De tudo, porém, resultou uma amizade e um apreço muito especiais que nem o tempo e, creio que nem mesmo a morte, conseguirão dissipar. Conforta-me ainda saber que Sílvio era um homem de muita fé e que agora deve estar em paz, na plenitude da luz que não se apaga”, declarou, textualmente, Marcondes Gadelha.
No livro “Sonho Sequestrado – Sílvio Santos e a campanha presidencial de 1989”, editado pela Matrix, Marcondes Gadelha faz uma revisão histórica cuidadosa dos episódios que envolveram o lançamento da candidatura de Sílvio Santos pelo PMB, mostrando que, na verdade, houve uma engenhosa e implacável conspiração para impedir a qualquer custo a candidatura do apresentador de TV, antes do primeiro turno, por uma razão muito simples: ele seria imbatível nas urnas. O final da trama mostra o processo decisório com características, estilo e ritos de uma eleição indireta, com apenas um traço de originalidade: a toga substituindo a farda, conforme mencionado pela editora. Marcondes fala, na obra, da atuação de Antônio Carlos Magalhães, Roberto Marinho, Leitão de Abreu, entre outros, para barrar o que diz que seria inevitável: Sílvio esvaziar as candidaturas de Collor e Luiz Inácio Lula da Silva, os dois primeiros colocados nas pesquisas, e se consagrar nas urnas.
Gadelha também mostrou a atuação de um então pouco conhecido economista, que manejava com destreza a legislação eleitoral e que se tornou fundamental na eliminação da candidatura, acabando com o partido de Sílvio à época, o PMB. O economista era Eduardo Cunha, que, anos depois, viria a se tornar o primeiro presidente da Câmara dos Deputados a ser preso no Brasil. Eduardo Cunha foi, também, um dos mentores do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (afinal consumado em 2016). O livro “Sonho Sequestrado” revela “como a legislação foi manipulada para sequestrar o sonho de muitos brasileiros em ver o grande empresário e comunicador como presidente. Entre outras curiosidades, a obra mostra os planos de governo de Sílvio Santos, que incluiria um entendimento com Eduardo Suplicy para a adoção de um programa de renda mínima e ênfase na construção de moradias populares”.
Em carta dirigida a Marcondes Gadelha e transcrita no início do livro, Sílvio Santos afirmou: “Meu caro Gadelha: Como vários de meus órgãos, incluindo o óbvio, que não está funcionando há muito tempo, minha memória também a cada dia que se passa vai apagando vagarosamente. Este seu livro me lembra de acontecimentos que eu já tinha esquecido e que me deixa emocionado a cada página que leio. Considero que estava qualificado para exercer a Presidência da República e tenho certeza que a equipe que eu escolheria, no mínimo, melhoraria as condições das pessoas mais necessitadas deste país. Parte do povo mais humilde do Brasil infelizmente ainda vive debaixo de pontes, em casebres de papelão ou de madeira, onde, muitas vezes, só tem um prato de feijão para comer e ainda precisa se preocupar com sua saúde e com os remédios que precisa tomar. Minha atuação seria toda voltada para esses temas que tanto afligem a nossa pobre população. Os demais problemas do nosso país seriam enfrentados também pelo presidente Sílvio Santos, mas preservando sempre a prioridade dada à habitação e à saúde. Você, com seu talento de escritor e generosidade de amigo, me deixou por diversos momentos com lágrimas de saudade e emoção ao trazer de volta aqueles acontecimentos. Hoje (2020), com 90 anos, me pergunto se teria sido bom para mim, para a minha família, para a minha televisão e para as pessoas que gostam de mim ter colocado a faixa verde e amarela que estampa a capa deste excelente livro. Sei, porém, que teria sido bom para a causa. E basta. O desafio, então, estava aceito em qualquer circunstância. Afetuoso abraço, Sílvio Santos”.