Nonato Guedes
Alçada a uma posição de protagonismo no governo do marido, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), embora não exerça nenhum cargo formal, a socióloga Janja da Silva, que rejeita o rótulo de primeira-dama, tem se apresentado na mídia como feminista mas adota posturas que refletem uma visão eminentemente machista, segundo analisa a escritora, jornalista e youtuber Madeleine Lacsko, em comentário publicado no site “O Antagonista”. Intitulado “O triplo twist carpado de machismo de Janja”, o artigo insinua que Janja pratica o marketing do “todes” (linguagem neutra que entrou em voga no terceiro governo de Lula): muito bom em cancelar os outros, mas na hora de defender quem realmente precisa, nem mexem um dedo. Cita que em um único vídeo, Janja conseguiu o triplo twist carpado do machismo: primeiro, ao endossar um regime onde a mulher não tem direitos e o homem pode ter várias esposas, depois, ao se calar sobre o financiamento de um grupo terrorista que usa o estupro como arma de guerra e, finalmente, ao ignorar o “caso Sílvio Almeida”. Nenhuma palavra sobre isso, nenhum posicionamento, silêncio eloquente.
Madeleine começa analisando o que chama de antissemitismo infantil da ala de esquerda que se diz progressista, o pessoal do “todes”, do qual Janja faz parte. E acrescenta: “Essa é a turma do woke, do identitarismo, onde, quando entram por uma porta, os direitos das minorias saem pela janela. A visita de Janja ao Catar, um país onde as mulheres não têm direitos, exemplifica isso. Ela foi para lá convidada pela terceira esposa de um líder que só fala quando e porque ele permite, enquanto veste as roupas que é obrigada a usar. E nossa primeira-dama? Achou tudo tranquilo, beleza, porque o antissemitismo está ali, mascarado de anti-imperialismo. Para eles, o verdadeiro vilão do mundo é sempre o imperialista americano ou o homem branco opressor. O Irã, a China? Esses são “gente boa”. E aí vem o segundo ponto: como uma primeira-dama que se diz feminista cala diante do uso de estupro como arma de guerra pelo Hamas? Sim, o mesmo grupo que sequestrou e violentou mulheres e crianças, usando o corpo delas como um campo de batalha. As perícias mostraram corpos de mulheres sequestradas, com DNA de dezenas de homens. E Janja? Calou. Estava no Catar, país que abriga os líderes do Hamas, e nenhuma palavra sobre as vítimas. O silêncio ensurdecedor da nossa primeira-dama diz muito sobre as prioridades dela”.
A jornalista comenta, por fim, o silêncio de Janja sobre o caso de Anielle Franco, a ministra da Igualdade Racial do governo petista. Diz Madeleine: “Não é ela (Janja) a feminista empoderada que vai defender todas as mulheres? Pois bem, Anielle Franco relatou um caso de importunação sexual de um ministro do governo e, apesar disso, o orçamento da sua pasta continuou subordinado ao mesmo ministro. Nem Janja, nem Lula fizeram nada. Nenhuma ação, nenhuma palavra. Para quem se diz defensora das mulheres, é no mínimo revoltante”. Madeleine explica que não é só sobre política, é pessoal, observando que viveu algo semelhante quando denunciou assédio sexual em uma empresa e o assediador foi colocado para cuidar dos detalhes da sua rescisão contratual. Avalia que é o cúmulo do desrespeito e é exatamente isso que está acontecendo agora. O governo que defende as mulheres, que se posiciona como o bastião do feminismo, não fez nada quando foi necessário. A jornalista enfatiza: “Esse triplo twist carpado de machismo disfarçado de feminismo já deu. É o marketing do “todes” em ação: muito bom em cancelar os outros, mas na hora de defender quem realmente precisa, não mexe um dedo”.
De acordo com Madeleine, o silêncio de Janja é mais do que uma omissão: é um reflexo de uma postura que se diz feminista mas, na prática, deixa muito a desejar. E arremata: “Já chega de todEs. É hora de expor o que realmente está acontecendo: a defesa seletiva de direitos, onde quem precisa de apoio fica abandonado, até mesmo quando são amigos. O problema não é o que fala, é quem fala. O problema não é o que se faz, é quem faz”. Na quarta-feira, Janja publicou um vídeo em suas redes sociais para relatar a viagem que fez ao Catar no fim de semana passado. A mulher do presidente Lula se encontrou com a sheika Moza bint Nasser, uma das três mulheres do sheik Hamad bin Khalifa e também participou de um painel sobre educação em Doha. No vídeo, conforme relato da imprensa, Janja pareceu emocionada ao falar da visita a uma escola que abriga crianças de países em conflito, como Sudão, Síria e Afeganistão. Ela disse que precisou ir ao Catar para que pudesse ter vivenciado o sofrimento das pessoas afetadas. “Até agora, a gente só tinha acessado as informações da Palestina pelas redes sociais, através de vídeos que nos chegam e, mesmo sabendo dos horrores que estão acontecendo na Faixa de Gaza, com o extermínio de crianças e mulheres, (eu) não tinha vivenciado essa experiência ali, com os meus próprios olhos”, disse a primeira-dama.
Na sequência, a mulher do presidente Lula afirmou ser preciso “repensar a humanidade” e em qual mundo será deixado para as crianças. O “Poder360” relatou que Janja fez um discurso aparentemente improvisado e um pouco confuso e traçou uma comparação sem uma lógica muito clara com as queimadas no Brasil (foram registrados mais de 40.000 focos de incêndio só no mês de setembro). “Se você for pensar nas crianças palestinas, elas não têm o futuro. Elas têm aquele momento. E a gente precisa pensar em todas as crianças do mundo. Que mundo é esse que a gente vai deixar? A gente tá vivendo um momento horrível no Brasil de queimadas, né? E que mundo é esse que a gente tá deixando, que a gente tá mostrando e tá deixando para as nossas crianças e jovens”, questionou a primeira-dama em seu perfil no Instagram. Janja é considerada uma ativista, que influencia, e muito, na tomada de decisões pelo marido, inclusive, quanto à demissão ou nomeação de ministros. Mas precisa dosar melhor o seu perfil como “influencer feminista”, diante das contradições que acaba vivenciando e sobre as quais, também, acaba silenciando.