Nonato Guedes
O incidente ocorrido na Praça dos Três Poderes em Brasília, esta semana, com ataque dirigido a membros do Supremo Tribunal Federal, atrapalha os planos do deputado federal paraibano Hugo Motta (Republicanos) de avançar na negociação para viabilizar o projeto de anistia aos golpistas de 8 de Janeiro de 2023, quando houve depredação das sedes do Judiciário, do Palácio do Planalto e do Congresso Nacional. A negociação a respeito foi ensaiada como moeda de troca para apoio da bancada do PL à candidatura de Hugo Motta à presidência da Câmara dos Deputados, já que seu alcance poderia se estender ao próprio ex-presidente Jair Bolsonaro, com a retirada da sua inelegibilidade para concorrer a cargos eletivos que foi decretada pela Justiça. O que se comenta, em Brasília, é que a tese da anistia aos golpistas enfraqueceu-se a partir do ato kamikaze que vitimou o seu autor, o chaveiro Francisco Wanderley Luiz, de 59 anos, que morreu ao ser atingido por um dos explosivos detonados contra o STF.
Falando à Globonews, o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, admitiu que o atentado em Brasília “reforça ainda mais um ambiente no Congresso Nacional para que não se pense de forma alguma em anistiar quem pratica crimes contra a democracia”. Já o ministro Luís Barroso, presidente do STF, criticou a possibilidade de anistia a quem atenta contra a democracia, afirmando que quem defende anistiar golpistas quer perdoar sem antes sequer condenar. Líderes partidários no âmbito do Congresso igualmente consideram que o projeto de anistia dos golpistas perderá força dentro do Legislativo e praticamente desaparecem as suas chances de ser aprovado. Na verdade, o PL da anistia foi uma bandeira agitada pelo atual presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), fiador da candidatura de Hugo Motta à sua sucessão, para sensibilizar a bancada de 92 deputados do PL na Casa a fechar com o deputado do Republicanos. Com a eventual retirada de apoio por parte do PL, a candidatura de Hugo Motta pode se desidratar até fevereiro do ano que vem, data-limite para a sucessão da Mesa do Legislativo.
Hugo Motta, em suas primeiras manifestações a respeito do incidente ocorrido esta semana em Brasília, procurou ser cauteloso, atendo-se ao fato em si, que repudiou, mas sem estender-se em apreciações sobre virtual conexão com o PL da anistia, até porque a Polícia Federal tem tratado o episódio como atentado terrorista. Nas redes sociais do Republicanos, Hugo Motta escreveu de forma lacônica: “Lamento e repudio os tristes e graves episódios de explosões que resultaram na morte de um cidadão, em Brasília. Atos de violência jamais devem ser tolerados. Esperamos que as investigações esclareçam o mais rápido possível o ocorrido”. O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, revelou ter determinado a instauração do inquérito policial e encaminhamento para a Suprema Corte, em razão das hipóteses iniciais de atos que atentam contra o Estado Democrático de Direito e, também, de atos terroristas. Asseverou ele: “Estamos tratando o caso sob essas duas vertentes”, lembrando que inúmeras outras ameaças foram dirigidas ao STF, versando sobre eliminação física de integrantes da Corte Suprema.
Após as explosões, deputados federais do PSOL protocolaram na Câmara dos Deputados um requerimento pedindo o arquivamento do Projeto de Lei da Anistia. Segundo os congressistas, a solicitação decorreu das explosões registradas na quarta-feira, 13 de novembro, na Praça dos Três Poderes. O requerimento fala em “perda de oportunidade” e foi subscrito pelos deputados Sâmia Bomfim, do PSOL-SP, Luíza Erundina, do PSOL-SP, Fernanda Melchionna, do PSOL-RS), Gláuber Braga, Chico Alencar e Tarcísio Motta, do PSOL-RJ. Inicialmente, o texto não concedia anistia apenas aos presos do 8 de Janeiro, “mas a todos que tenham participado de manifestações em rodovias, frente a unidades militares ou em qualquer lugar do território nacional” a partir de 30 de outubro de 2022, data em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva venceu o segundo turno das eleições presidenciais contra Jair Bolsonaro. O relator da proposta, deputado Rodrigo Valadares, do União Brasil-SE, retirou o trecho do projeto. O perdão só valerá agora de 8 de Janeiro de 2023 até a data em que a lei entrar em vigor.
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, chegou a criar, em 28 de outubro, um grupo especial para tratar do assunto, medida que foi interpretada nos meios políticos como destinada a atrasar a tramitação do projeto, que estava na Comissão de Constituição e Justiça e, ao mesmo tempo, evitar prejuízos colaterais à candidatura do deputado Hugo Motta para presidente do Parlamento.No requerimento do PSOL, lê-se que “o simples fato de ser mantido em tramitação pode, a qualquer momento, e por até três legislaturas, ensejar o seu impulsionamento à apreciação, o que pode gerar grave risco e instabilidade, tornando-se um verdadeiro passe livre para o cometimento de crimes”. Sabe-se que as articulações em Brasília desenvolvem-se em ritmo frenético diante do “fato novo”, enquanto de sua parte o deputado Hugo Motta mobiliza-se para manter o favoritismo que até então seu projeto em presidir a Câmara dos Deputados vinha alcançando junto a diferentes partidos representados na Casa.