Nonato Guedes
O Senado Federal aprovou, ontem, o projeto que garante ao produtor de cana-de-açúcar destinada à produção de biocombustível participação nas receitas obtidas com a negociação de créditos de descarbonização emitidos pelos produtores de niocombustível. Originado na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 3.149/2020 não sofreu alteração no Senado e segue para a sanção. O texto, do então deputado e atual senador Efraim Filho, do União Brasil-PB, altera a Política Nacional de Bicombustíveis (RenovaBio), que prevê mecanismo de incentivo à produção desse tipo de combustível renovável. Como o projeto foi apresentado por Efraim na condição de deputado, não houve impedimento para que ele relatasse o texto no Senado. O parecer foi favorável à aprovação.
Segundo a Agência Senado, o projeto aprovado pela Câmara Federal em outubro tinha requerimento de líderes para que fosse analisado com urgência e não passou pelas comissões. Um requerimento dos senadores Oto Alencar, do PSD-BA e Eliziane Gama, do PSD-MA, para que fosse enviado à Comissão de Assuntos Econômicos, foi retirado após a concordância da liderança do governo para que a matéria fosse votada em Plenário. O senador Jaques Wagner (PT-BA), líder do governo, enfatizou: “Realmente, não há oposição do Governo à votação da matéria, porém, a Fazenda insiste em que determinados itens do seu projeto têm impacto fiscal (…) Como ainda temos prazo até a sanção do presidente da República, então o encaminhamento será favorável, eu diria, com ressalvas que eventualmente se transformarão em veto”. Efraim Filho informou que sua assessoria técnica se reuniu com a liderança do Governo para tratar do tema. Ele disse entender que não há aumento de despesas, já que o texto, na verdade, apenas redistribui receitas.
– Com relação à adequação orçamentária, não parece haver impacto na medida em que, precipuamente, trata-se de redistribuição de receitas. Há também medida de inclusão de mecanismos de comprovação de estoques de produtos que importam para a aplicação do RenovaBio, enrijecendo as regras para a obtenção de incentivos – explicou o parlamentar paraibano. Pelo projeto, a participação dos produtores será proporcional à biomassa entregue às usinas de etanol, conforme sua nota de eficiência energético-ambiental. Inicialmente, a participação será de 60% das receitas geradas com a venda de créditos obtidos pela produção de biocombustível com a cana-de-açúcar entregue. A Renovabio determina às distribuidoras de combustíveis o cumprimento de metas anuais de compra de Crédito de Descarbonização para ajudar no alcance de metas assumidas pelo Brasil no Acordo de Paris sobre redução de gases do efeito estufa. Cada CBIO representa uma tonelada de carbono equivalente que deixou de ser emitida para a atmosfera ao substituir o combustível fóssil por um renovável.
A lógica da política é que as usinas são incentivadas a produzir biocombustíveis para o poder gerar CBIOs, títulos negociáveis no mercado secundário de valores e, assim, contar com uma fonte adicional de receita. Na outra ponta, as distribuidoras são obrigadas a comprar esses créditos de descarbonização em quantidade definida para cada uma atualmente pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, com base no volume de combustíveis fósseis vendido no ano anterior. A expectativa é que as distribuidoras repassem o preço dos créditos comprados aos combustíveis fósseis, deixando-os mais caros, e assim tornando-os menos atrativos para os consumidores. As regras permitem às usinas emitirem mais créditos na medida de sua eficiência no seu processo de produção e na condição de comprovarem a origem ambientalmente correta da matéria-prima (de área com vegetação nativa não desmatada e de imóvel constante do Cadastro Ambiental Rural, o que é aferido por meio da Nota de Eficiência Energético-Ambiental. Além dos 60% previstos para o perfil agrícola padrão, o produtor de cana-de-açúcar poderá contar com uma participação maior se fornecer dados ao produtor de biocombustível para que este preencha o perfil específico relativo à matéria-prima, etapa para obter nota de eficiência maior. Esse adicional será de 85% da diferença entre o valor dos créditos vendidos com base na nota de eficiência a partir do perfil específico e o valor que os créditos garantem com base no perfil padrão.
Ainda conforme a Agência Senado, o projeto permite o acesso do produtor de cana somente se ele atender aos critérios de elegibilidade da Renovação. Regulamento da ANP, entretanto, determina o uso do perfil padrão apenas para o etanol produzido a partir de milho e de matéria importada, devendo ser utilizado o perfil específico nas demais situações (matéria-prima brasileira vinda da cana-de-açúcar, por exemplo). Os tributos e demais custos envolvidos na venda dos CBIOs serão descontados proporcionalmente do montante a ser partilhado com os produtores de cana-de-açúcar. O texto estabelece sanções para produtores de biocombustível que não fizerem o repasse aos produtores de cana-de-açúcar. Aqueles que descumprirem o pagamento da participação podem ficar impedidos de emitir novos CBIOs relacionados à biomassa entregue pelo respectivo produtor de cana-de-açúcar. O produtor de cana, no entanto, poderá ceder contratualmente ao produtor de biocombustível sua participação nas receitas. Pelo projeto, o produtor de bicombustível que não repassar ao produtor de cana os valores da participação pode pagar multas, em valores que variam de R$ 100 mil a R$ 50 milhões. O texto aprovado considera crime ambiental o descumprimento de metas individuais de redução de emissões de gases do efeito estufa na comercialização de combustíveis.