Nonato Guedes
Ao discursar na abertura do seminário “A realidade brasileira e os desafios do Partido dos Trabalhadores”, em Brasília, a presidente nacional da legenda, deputada Gleisi Hoffmann (PR) conclamou a uma reflexão sobre o papel do petismo no presente e no futuro do país, “compreendendo para que serve o partido que fundamos, sob a liderança do presidente Lula, há 45 anos que se completam em fevereiro próximo”. Gleisi reconheceu que os petistas deveriam estar avaliando e atualizando há mais tempo as transformações no mundo do trabalho, nas comunicações, nas demandas sociais e nos eixos da disputa política. “Ocorre que o PT passou os últimos dez anos enfrentando a maior operação de cerco e destruição que já se armou contra um partido político na história deste país. Enquanto a extrema direita se organizava nas redes sociais e o neoliberalismo governava, a partir do golpe contra a presidente Dilma Rousseff, nós estávamos cuidando de sobreviver”, relatou a dirigente da sigla.
– Enquanto eles mitificavam o individualismo, demonizavam a política e reduziam o Estado ao mínimo, nós estávamos discutindo o lawfare que levou Lula à prisão e à cassação também ilegal de sua candidatura em 2018. Este era o nosso foco de debate e o centro da nossa luta – prosseguiu Gleisi, pontuando: “É preciso recordar sempre e valorizar devidamente a resistência inigualável da militância do PT na campanha Lula Livre. Foi ali, nas vigílias, protestos e festivais, nas nossas limitadas mas combativas redes e nos portais da mídia independente, na construção de uma rede de apoios nacional e internacional, na batalha judicial tenaz frente a Sérgio Moro e à Lava Jato que reunimos energia para fazer de novo Lula Presidente”. E mais: “Temos, sim, que atualizar nossas posições sobre as mudanças no Brasil e no mundo, mas sem esquecer jamais a razão de ainda estarmos aqui, um partido vivo, presente na vida nacional e novamente à frente do governo”.
Na opinião da presidente Gleisi Hoffmann, “ainda estamos aqui porque o PT serve a um projeto de transformação do país que está cada vez mais em disputa. Estamos aqui porque o Brasil ainda é um país dividido pela desigualdade histórica e, agora, dividido também entre o campo popular e democrático e a violência política da extrema direita, a serviço do aprofundamento das desigualdades”. A eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, conforme Hoffmann, não significa – “como pensam alguns” – o fim de uma etapa para o PT. “Ela é a continuidade de uma trajetória que deve nos conduzir a uma sociedade melhor, mais humana e solidária, com direitos e oportunidades para todos e todas, na construção permanente da transformação rumo à justiça que o sistema capitalista não se mostrou capaz de promover”. Gleisi Hoffmann reforçou que é para cumprir essa missão que serve o PT e explicou que o seminário convocado em Brasília teve o importante papel de iniciar o debate interno sobre a atualização dos posicionamentos petistas e organização partidária, que vai se estender durante todo o processo de eleição da nova direção do PT no início de julho do próximo ano.
Gleisi, que deverá deixar a presidência e, talvez, vir a ocupar um ministério no governo do presidente Lula, salientou que o processo de renovação partidária deve envolver a militância, os dirigentes e até mesmo os simpatizantes da agremiação e deverá resultar na ação programática clara que irá conduzir o PT pelos próximos quatro anos, sendo fundamental para preparar o processo eleitoral de 2026, para reconduzir Lula novamente à Presidência da República, numa sólida aliança com o campo popular e democrático. No âmbito do Partido dos Trabalhadores, a sucessão de Gleisi já começa a ser tratada de modo oficioso, com manifestação de cabeças coroadas que estão dentro da legenda ou, então, fazendo parte do terceiro governo de Lula – neste, dividindo espaços, inclusive, com setores de centro-direita, ligados a partidos políticos conservadores que, no entanto, contribuem para a governabilidade de Lula. O próprio presidente da República já alertou para o fato de que o PT não elegeu maioria no Congresso e que, portanto, precisa negociar suas pautas com os grupos e correntes que se disponham ao diálogo em torno das mudanças.
Vale ressaltar outros trechos do pronunciamento da presidente Gleisi Hoffmann sobre o papel que compete ao Partido dos Trabalhadores na quadra política atual: “Certamente, o PT não serve para perpetuar as estruturas sociais, políticas e econômicas injustas e excludentes que marcam a história e o presente do nosso país. O PT nasceu para transformá-las, lutando contra a ditadura, que ainda hoje inspira a extrema-direita, a exploração dos trabalhadores, que mudou de formas mas permanece na essência e a indecente concentração da renda nas mãos dos que nos impõem a cartilha do neoliberalismo. Para que serve o PT se não for para representar, dar voz e organizar politicamente a imensa maioria que sofre com essa realidade? Se não for para denunciar as injustiças, elaborar e implantar políticas de desenvolvimento econômico com inclusão social? Para que serve o PT, se não for para garantir que as crianças e jovens deste país tenham acesso a ensino público de qualidade em tempo integral? Se não for para garantir o fortalecimento do SUS, o acesso universal à saúde, aos medicamentos, ao bem-estar das famílias? Para que serve o PT se não for para garantir a soberania do Brasil, defender e resgatar o patrimônio nacional que foi roubado ao povo que o construiu, em transações criminosas nos anos recentes de governos neoliberais?”.